Se Miro fosse mú-sico, seria, talvez, um virtuoso. Mas como escolheu ser fotógrafo, muitas vezes essa característica não é reconhecida por quem domina tal forma de comunicação. Mesmo assim, Miro se destaca entre seus pares, por seu preciosismo, pelo seu estilo low profile, por nunca ter aceitado ser menos do que Miro. Azemiro de Souza Filho, ano 1949, nascido em Botucatu (SP), talvez fosse apenas mais um brasileiro Miro, como tantos que existem por aí, com força, raça e trabalho. Mas a fotografia, por menos que ele queira, acabou por colocá-lo sob os holofotes, tornando-o um dos mais influentes fotógrafos do Brasil. Há mais de 40 anos no mercado de moda e publicidade – embora essas etiquetas possam restringir a criatividade de um fotógrafo –, a marca Miro se sobressai em suas imagens. Personalidade e genialidade se mesclam. Pesquisa, linguagem e apuro técnico também.
Esse seu conhecimento imagético poder ser visto na exposição Miro – Um Fotógrafo no Século 17, que a galeria FASS (especializada em fotografias latino-americanas do século 20 e integrante da SP-Arte/Foto desde sua primeira edição) apresenta nas 11 imagens em que o artista dialoga com grandes pintores da época renascentista espanhola, flamenga e francesa – uma conversa que nasceu, mais uma vez, da vontade de testar a ideia da perfeição.
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O ensaio recebeu o nome de Vanités (Vaidades). O curioso é que esse trabalho nasceu do medo. Foi na década de 1990, quando o mundo fotográfico começava a se transformar com a chegada do digital – e surgiram as incertezas e as transformações do significado da palavra imagem. Ao mesmo tempo, a sociedade do espetáculo se tornava cada vez mais presente na mídia, no mundo. “Ser” seria substituído por “aparecer”. Nesse cenário, a angústia tomou conta do fotógrafo. Um processo que, anos depois, seria diagnosticado como síndrome do pânico. Novamente, a fotografia lhe daria o chão. O trabalho árduo: reconstruir, por meio da fotografia analógica, 33 quadros escolhidos a dedo por ele, de pintores como El Greco, Caravaggio e Rembrandt. Se o primeiro já nos apresenta distorções de formas, os dois últimos são, sem dúvida, aulas “de” e “sobre” a luz. Dos 33 quadros, 17 imagens foram produzidas e a FASS agora exibe 11. O desconcerto do olhar é assombroso. Assim, encontramos revistos por Miro São Jerônimo, de Caravaggio, e Santa Madalena, de Luca Giordado, renunciando às vaidades do mundo ou, só para citar alguns exemplos, a própria ideia de Vanitas. Engana-se, porém, pensar que esse trabalho é uma ode à própria vaidade do artista. Miro nunca quis ser protagonista, deixou esse papel para suas fotografias, que continua criando com delicadeza e sensibilidade. Também pode ser visto como uma crítica a uma sociedade hedonista que preanunciava sua vinda. Na discussão da busca da verossimilhança, Miro coloca em cheque o próprio fazer fotográfico ao recriar novas paisagens, possibilidades de ver uma obra. O pânico se foi, mas o que fica é o olhar atento, suas luzes e criatividade. Suas referências pictóricas e cinematográficas. O que fica é a impossibilidade de não mergulhar em suas imagens e, quem sabe, ser tragado por elas.
POR DENTRO DA SP-ARTE/FOTO O destaque foi a estreia das galerias Celma Albuquerque, de Minas Gerais, e SIM, do Paraná. Foi a primeira edição da feira no JK – as anteriores aconteceram no Shopping Iguatemi. A Livraria da Vila participou da feira com lançamento de livros de Maureen Bisilliat, Loren McIntyre, Edu Simões, Claudia Jaguaribe e Roberto Linsker. |
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