Realizada na Sala São Paulo, na noite de ontem, 13 de novembro, a cerimônia de entrega da 55ª edição do Prêmio Jabuti foi marcada pela previsibilidade usual – afinal, com cerca de um mês de antecedência, são anunciados os três vencedores das 27 categorias. Mas, como também é tradição, a grande expectativa do prêmio promovido pela CBL – Câmara Brasileira do Livro, o mais abrangente do mercado editorial brasileiro, ficou para os dois anúncios finais, quando foram revelados os Livros do Ano nas categorias Ficção e Não Ficção. Com Diálogos Impossíveis (Editora Objetiva), Luís Fernando Veríssimo foi o grande vencedor da categoria Conto. Conquistou também o prêmio de Livro do Ano, de ficção. Veríssimo não pôde comparecer à cerimônia e foi representado por seu editor, Mauro Ventura.
Ovacionado, de pé, o veterano jornalista Audálio Dantas foi o grande destaque da noite. Venceu a categoria Reportagem, com As Duas Guerras de Vlado Herzog – Da Perseguição Nazista na Europa à Morte Sob Tortura no Brasil (Civilização Brasileira), e também conquistou o prêmio Livro do Ano, na categoria Não Ficção. Escrito ao longo de um ano e meio, após quase três décadas de pesquisas, As Duas Guerras de Vlado Herzog é um trabalho de imersão e um acerto de contas com o passado recente do País e da própria vida de Audálio. Em 25 de outubro de 1975, ele presidia o Sindicato dos Jornalistas de São Paulo quando foi anunciada a grotesca versão de suicídio para a morte do jornalista Vladmir Herzog, então diretor de Jornalismo na TV Cultura, nos porões do DOI-CODI. “Antes do Vlado foram presos e torturados 11 jornalistas de São Paulo. Como presidente do Sindicato dos Jornalistas, acompanhei essa tragédia desde o começo, denunciando prisões ilegais e torturas que estavam sendo praticadas, não só contra os jornalistas, mas também contra os presos políticos que estavam no DOI-CODI. Naquele momento tive os dias mais angustiantes da minha vida, mas acho que cumpri o dever que me cabia”, revelou Audálio, logo após a entrega do Troféu Jabuti, que rendeu a ele uma premiação de R$ 35 mil. O gesto corajoso, deste que é um dos maiores repórteres do País, e está em plena atividade, aos 81 anos, foi um marco para o processo de redemocratização. O Caso Herzog teve repercussão internacional e mobilizou sindicatos de outros Estados do Brasil, que também recrudesceram a oposição ao regime militar.
Emocionado com o reconhecimento da importância de sua obra para elucidar um passado dos mais nebulosos na história recente do País, Audálio revelou que, enquanto desenvolvia a pesquisa, demorou cerca de 30 anos para decidir se faria ou não o livro. Revisitar episódio de tamanha tragicidade não era o maior problema para o experiente repórter. A maior dificuldade, segundo ele, seria justamente não impregnar as páginas com um relato passional, visto que Herzog, mais do que um colega de profissão, era um de seus amigos mais próximos. “A emoção, em alguns momentos, pode atrapalhar um trabalho que deve ser um retrato da história e da verdade. Essa era minha maior preocupação. Felizmente, consegui.”
Feliz com o Jabuti de Reportagem, Audálio se disse surpreso com a conquista do Livro do Ano: “Há um número enorme de pessoas competentes que concorrem ao prêmio e ficava me perguntando: será que mereço? Mereci. Mas acho que isso se deveu muito mais a um trabalho que está, inclusive, fora desse livro: a luta de resistência contra a ditadura militar, que assassinou um dos brasileiros mais dignos que conheci, chamado Vlado Herzog. Ofereço esse livro a memória do Vlado. Essa história faz parte da minha vida e dei o melhor de mim para escrevê-la”.
Na edição 61, publicamos resenha de outro livro essencial de Audálio Dantas a coletânea Tempo de Reportagem, que compila trabalhos históricos Leia. Saiba quem foram os vencedores das demais categorias.
Confira o discurso de agradecimento de Audálio Dantas
“Primeiro, eu agradeço os amigos que aqui estão. Muitos deles acompanham minha história durante esses anos todos. Quero falar da alegria de receber esse prêmio. Esse trabalho, que agora vejo premiado, tem um sentido profundo na minha vida. Ao mesmo tempo em que sou o autor desse livro, sou também personagem, porque vi de perto, senti o medo e o horror daqueles dias de outubro de 1975, quando foi assassinado Vladmir Herzog. Quero encerrar essas palavras apenas dizendo: Vlado vive!”
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