Uma mancha na imagem do Brasil

Para Milani, o impeachment de Dilma poderia provocar repercussões sérias em matéria de investimentos no País. Foto: Arquivo Pessoal
Para Milani, o impeachment de Dilma poderia provocar repercussões sérias em matéria de investimentos no País.          Foto: Arquivo Pessoal


A quem interessa a instabilidade política no Brasil? A muitas potências mundiais, diz Carlos Milani, pesquisador do Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Uerj, que pondera, no entanto, não ser possível afirmar que haja uma intervenção estrangeira na crise que abala o País. “Em 1964, a mesma mídia e os mesmos atores políticos diziam que se tratava de um problema exclusivamente doméstico e chamavam o golpe de revolução. Anos mais tarde, comprovou-se que houve sim interferência externa. Daqui a alguns anos talvez tenhamos acesso a documentos que possam desvendar a lógica dos interesses por trás da tentativa de afastar Dilma”, diz o cientista político. Para ele, o que ocorre no Brasil é uma tentativa de golpe de Estado, já que não há comprovação de crime de responsabilidade cometido pela presidenta Dilma Rousseff, nos termos do artigo 52 da Constituição.

Milani alerta para o fato de que a soberania do Estado brasileiro já está em jogo – ainda que o cenário de impeachment não se concretize. Exemplo disso seria o projeto de lei do senador José Serra (PSDB-SP), aprovado no Senado em fevereiro deste ano, que pretende mudar o marco regulatório da exploração do pré-sal. A proposta retira da Petrobras a exclusividade das atividades na camada e acaba com a obrigação de a estatal participar com pelo menos 30% dos investimentos em todos os consórcios de exploração do pré-sal. “A mudança das regras do jogo interessa às empresas estrangeiras. E não tem nada de revolucionário ou comunista na nossa legislação. São regras que existem em vários outros países do mundo. É uma política de conteúdo nacional para desenvolver a própria indústria, para que a gente tenha um segmento com valor agregado e inovação tecnológica que possa competir internacionalmente. Isso já está em xeque”, diz Milani.

Segundo ele, a política é internacio­na­lizada e por isso movimentos sociais, ONGS ou fundações recebem financiamento de órgãos estrangeiros. “Isso acontece tanto na esquerda quanto na direita. Instituições de fora apóiam movimentos com os quais se identificam ideologicamente. O MST recebe apoio de ONGs europeias. E muito provavelmente o Movimento Brasil Livre e o Revoltados Online também. A política do Brasil desperta interesses pelo fato de ser um país muito importante, entre as dez principais economias do mundo, com muita riqueza natural, mineral, petróleo. O apoio a redes e organizações da sociedade civil é uma estratégia política usada por atores internacionais.”

Sobre a repercussão internacional de um possível afastamento de Dilma, Milani diz que os parceiros latino-americanos e do Brics, grupo que reúne Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, devem estar receosos. “Num eventual governo Temer, se você ler o projeto “Uma Ponte para o Futuro” (programa de governo do PMDB), vai perceber que tem uma série de diretrizes que vão implicar severas mudanças na política externa, em matéria de política comercial exterior, integração regional, de adesão a acordos plurilaterais de comércio, de manutenção ou não de alianças estratégicas, a exemplo do Brics.”

Para ele, a reação da China, em particular, é algo que deve ser levado em conta, em caso de ruptura democrática. “Geralmente perguntam dos Estados Unidos, mas e a China, que é a segunda maior potência do planeta? Ela tem inúmeros investimentos no Brasil, que é o país mais importante da América Latina para o governo chinês. O Brasil é considerado a sua porta de entrada. Se o País altera suas diretrizes diante de uma mudança de política externa na sua aliança com o Brics e nas relações estratégicas bilaterais com a China, isso pode ter repercussões sérias em matéria de investimento no País.”

Milani acha difícil que órgãos como o Unasul ou o Mercosul decidam de forma consensual impor sanções ao Brasil após um possível afastamento de Dilma, mas defende que a imagem do País ficará manchada diante da comunidade internacional. “Vai ter comprovada uma grande fragilidade de nossas instituições democráticas. O Judiciário fazendo política, um impeachment sem um crime de responsabilidade comprovado, o não afastamento de Eduardo Cunha, presidente da Câmara dos Deputados, apesar dos inúmeros processos contra ele, vários deputados investigados por corrupção na comissão especial de impeachment. É tudo tão escandaloso, é claro que isso vai ter uma repercussão muito forte do ponto de vista da imagem do Brasil.” 


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