Por ser algo muito novo no Brasil, o conceito de inovação como uma prioridade para qualquer empresa que queira se manter competitiva e crescer no mercado ainda não conseguiu aproximar o setor industrial privado da produção científica que se faz nas Universidades públicas brasileiras. Num país em que faltam cientistas na área de saúde e especialistas em tecnologia de todo tipo – principalmente digital –, essa necessidade de diálogo se torna urgente. Esse foi um dos pontos concordantes entre os seis palestrantes do último debate do dia que encerrou nesta sexta-feira o Seminário Inovação: Investimentos em Pesquisa e Desenvolvimento, promovido por Brasileiros no Hotel Intercontinental, em São Paulo, e que reuniu importantes profissionais tanto do meio acadêmico quanto de empresas preocupadas em buscar o novo como diferencial.
[nggallery id=16220]
Dante Alário Júnior, diretor científico da Biolab Farmacêutica, observou que esse tipo de parceria é importantíssimo na busca de novos produtos, para resolver problemas técnicos e, claro, melhorar a qualidade do que já é fabricado. Ele também listou uma série de razões para que a Universidade também se aproxime das empresas. Como, por exemplo, a possibilidade de buscar investimentos para pesquisas e compras de equipamentos. Ao mesmo tempo, mestres e doutores podem testar na prática o que desenvolvem em seus laboratórios ou na teoria. “Eles terão mais abertura ao saber das carências da indústria e, desse modo, ampliar sua atuação na preparação de mão de obra qualificada, de produção científica ou, se for o caso, reposicionar seu foco”, acrescentou. Mas o que dificulta tudo isso, em sua opinião, são a burocracia, as pesquisas em longo prazo com resultados previsíveis e o “purismo” do meio acadêmico, que gera inflexibilidades.
Nos últimos cinco anos, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) montou uma agenda prioritária para saber da importância de se buscar o novo nas fábricas brasileiras. Rodrigo Teixeira, gerente de promoção de inovação da entidade, explica que, a partir de 2008, a CNI tem colocado para seus associados a importância de se tratar a política de inovar como algo estratégico em seu negócio. Antes dessa data, contou ele, o termo sequer aparecia entre os dez mais importantes pontos a serem priorizados no setor. Hoje, está em terceiro lugar, atrás da burocracia como algo a ser revisto e a formação de recursos humanos. “Nosso desafio é aumentar a cultura de se buscar o diferencial com investimento em departamentos de inovação”, ressaltou. A Universidade, concordou ele, tem sido uma grande dificuldade para se aproveitar a produção de pesquisadores e cientistas. Há, inclusive, barreiras burocráticas no caminho de uma aproximação. “É preciso transformar ideias em valores”, completou.
Com longa passagem de mais de duas décadas na Universidade, inclusive à frente da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), Luís Mello, diretor do Instituto Tecnológico da Vale, disse ficar à vontade para falar da relação entre as faculdades que geram produção científica e tecnológica e as empresas do setor privado. “Essa questão no Brasil pode ser abordada sob diversos pontos de vista”, lembrou. Claramente, prosseguiu ele, são muitos os problemas que mantêm os dois setores tão distantes. “Fale-se dos dois, mas pouco se lembra do governo como um elemento necessário na base”, afirmou ele, que destacou o esforço do poder público em tentar acertar, embora erre algumas vezes. Mas é preciso insistir para se fazer coisas darem certo. “Durante muito tempo, a universidade teve um viés de esquerda que dizia que produção científica e dinheiro não se misturavam. Isso durou até a década de 1980 e ainda precisa avançar”. Para Mello, o desafio continua de mudar a mentalidade de que o privado quer tomar a propriedade de um bem público. “É um sistema muito recente, começamos em inovação muito tarde em todos os setores da indústria”.
Dois exemplos brasileiros de sucesso foram apresentados por Elbia Melo, presidente executiva da Associação Brasileira de Energia Eólica; e pelo professor Guido Lemos de Sousa Filho, da Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Elbia falou com entusiasmo do crescimento rápido da energia retirada dos ventos, que deve elevar o Brasil do 20º para o terceiro lugar em apenas quatro anos, quando esse tipo de energia deverá crescer 200%. Ou seja, triplicará de 2,2% para 6% da produção nacional de todos os tipos, inclusive a elétrica. Para aproximar o segmento dos doutores da academia, a associação está criando a Rede Brasileira de Energia Eólica, voltada para desenvolver equipamentos que tratem das peculiaridades do tipo de exploração que se faz no país. “Não há muito diálogo e nem otimização dos recursos”, disse a executiva, que destacou a estabilidade e maior potência dos ventos brasileiros para atrair novos investimentos, com maior segurança.
Sousa Filho falou da experiência internacional do Laboratório de Aplicações de Vídeo Digital (LAVID), criado em 2003 e integrado ao Departamento de Informática (DI) da Universidade Federal da Paraíba. O laboratório surgiu da proposta de desenvolver projetos de pesquisa em hardware e software voltados às áreas de Vídeo Digital, Redes de Computadores, TV Digital e Interativa e Middleware. Atualmente, é referência em desenvolvimento de tecnologia para TV Digital. O LAVID conta com a colaboração de mais de 40 jovens pesquisadores, entre doutores, mestres e graduandos, que estão interconectados com pesquisadores de todo o Brasil e do mundo, e traz as atuais tendências tecnológicas mundiais nas áreas de vídeo e TV Digital. “O que ocorre na Universidade é que o ranço de esquerda influiu inclusive na legislação e hoje não se sabe se transfere de forma legal ou não o que é desenvolvido em nossos laboratórios”, afirmou o cientista. Sua equipe criou o middleware ginga, considerado o melhor programa para televisão digital do mundo.
Coube a Luciana Capanema, responsável pela área de apoio à inovação e desenvolvimento de empresas do BNDES fechar o debate com uma exposição sobre a política da instituição para conceder financiamentos. “A gente acredita na transposição do que está nas prateleiras das universidades para virar produtos que gerem riqueza para o país”, destacou ela. Em sua opinião, não basta gerar produção científica, é preciso implementar no mercado. E o BNDES apoia essa noção como parte do Programa Brasil Maior, com atuação em todos os segmentos da economia. Outro projeto é o Inove Empresa, parceria com o FINEP, com o objetivo de centralizar a entrada de projetos para avaliação de financiamento.
Deixe um comentário