Uma revista para o livro

Livro, revista idealizada e edificada por dois cultivadores de bibliotecas, apresentou seu primeiro número em lançamento na livraria João Alexandre Barbosa, na Cidade Universitária, em São Paulo. Os editores são Plinio Martins Filho e Marisa Midori Deaecto, professores da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA-USP). Dias antes, porém, outro grande amador de livrarias fez uma leitura de sua crônica publicada na revista. Era Alfredo Bosi, professor da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP, emérito autor da obra que acompanha gerações: a História Concisa da Literatura Brasileira.

Bosi, em sua leitura em voz calma, recordava o sentido da palavra livraria. Até o século XVIII (talvez, mesmo, até meados do XIX), o termo remetia à ideia de biblioteca.

Enquanto o ouvia, pensava que esta segunda palavra, por seu turno, nos conduzia ao pseudo Apolodoro, autor de uma Biblioteca, cujo significado não era o de um lugar físico de livros, mas de uma obra erudita sobre os mitos e histórias gregos. Phocius foi o primeiro a atribuir a Biblioteca a Apolodoro, o que mais tarde foi questionado. Uma primeira edição impressa da obra foi feita em Roma (1550), por Aegius Spoletinus, com tradução latina e notas; a segunda saiu em Heidelberg (1599). Isto, de acordo com Chaudon (Dictionnaire Universel, Historique, Critique et Bibliographique, ou Histoire Abrégée et Impartiale des Hommes de Toutes les Nations etc., Paris, De L´Imprimerie de Maue Frères, 1810), consultado em uma Biblioteca, a da Faculdade de Direito de São Paulo.

Quando Bosi pensou em livraria, ele nos conduziu em suas lembranças à Biblioteca Mario de Andrade, em São Paulo, locus de suas frequências primaveris. A mim, a palavra livraria sempre conduz a outras duas: alfarrábio e (mais brasileira) sebo. Mas, agora, aprendi em artigo de Cláudio Giordano nesta revista Livro, que existe também a expressão Livraria de Antigos, uma alusão à expressão espanhola libreria de viejos

Essa revista Livro, todavia, não tem somente o dom de suscitar em seu leitor o gosto pelas velhas recordações, traz, também, o prazer do incerto amanhã. Os seus artigos discutem o futuro do suporte em papel, os caminhos do mercado editorial, o livro a serviço da história e tantas outras coisas que só aos amantes do impresso toca conhecer…

É de se notar também a sua natureza. A revista seria improvável no formato digital. O leitor que a preferisse assim perderia a experiência de um papel pólen envolto por uma capa em cotelê. Certamente, lhe sobraria o impacto visual da capa de Hélio Cabral e os impulsos intelectuais dos artigos de Walnice Nogueira Galvão e Jean-Yves Mollier e das memórias de J. Guinsburg e de Ruy Coelho, entre outros. Mas a arte de amar os livros pede mais, sempre mais, porque o livro é o mais exigente dos amantes.

*Professor de História Contemporânea na USP.

» Livro, Revista do Núcleo de Estudos do Livro e da Edição, Ateliê Editorial, 208 páginas


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