Do anonimato para a internet, a estudante de Arquitetura e militante feminista negra Stephanie Ribeiro, de 22 anos, ganhou visibilidade, voz e seguidores. Agora é uma referência no feminismo brasileiro. A seguir, ela conta sobre sua trajetória, a questão da mulher negra no País e os passos do movimento negro de mulheres.
Brasileiros – Você acumula mais de 12 mil seguidores no Facebook e vem se tornando uma referência no feminismo brasileiro.
Stephanie Ribeiro – Estudo Arquitetura na PUC de Campinas. No Brasil, a presença de negros na universidade é rara e, em particular com mensalidade alta, é mais rara ainda. Sou uma das únicas negras da PUC. Quando estava no primeiro ano, entrei em grupos do Facebook em que se discutem questões como feminismo, racismo e política. Expus minha opinião e isso causou um incômodo grande nas pessoas. Elas me achavam arrogante, barraqueira, insegura, diziam que eu só queria aparecer. Infelizmente, a situação evoluiu e chegou a um ponto em que outras pessoas não queriam fazer grupo comigo. Comecei a receber bilhetes anônimos, uns queriam saber meu endereço, outros eram ofensivos e carregavam tom ameaçador: me chamavam de pobre, diziam que eu não sabia o meu lugar. Muitos apareceram no meu armário da faculdade. No meu Facebook, escrevi um texto, grande, explicando a situação e como era angustiante viver aquilo. E o texto viralizou. Eu tinha, então, vários seguidores e passei a me posicionar mais. Enquanto mulher, enquanto negra. O Brasil tem muita dificuldade de discutir o racismo e essa discussão é fundamental ainda mais por quem mais sofre com ele, como as mulheres negras.
As negras sofrem mais com o machismo?
A maior parte das mulheres estupradas são negras. As vítimas de aborto clandestino também. Além do fardo do machismo, carregamos o do racismo. Daí a necessidade do feminismo negro.
O feminismo negro vem crescendo ou ainda é um fenômeno restrito à universidade?
Não é nem de longe um fenômeno universitário. As pessoas tendem a achar que a favela, que os pobres não têm consciência política. Não é verdade. Existem coletivos de feministas negras na periferia. Com a internet, a informação flui rapidamente e o feminismo já não é mais um conjunto de grupos de pesquisa fechados dentro da universidade. O próprio feminismo dentro da universidade já não é exclusivamente branco. Todo o processo de inclusão promovido pelo governo na última década, por meio de ações como as cotas para negros e o Prouni, fez com que o número de negros em universidades aumentasse. Ainda que esse número continue pequeno, foi um impacto grande.
Há obstáculos para os negros, homens e mulheres, se manterem na universidade?
Infelizmente sim. A maioria da população negra no Brasil é também pobre. Entrar na universidade é difícil. Manter-se nela também. Mesmo nas públicas, onde os deslocamentos até o campus são complicados. Também é comum ter de conciliar estudo com trabalho. Tudo isso pode inviabilizar os estudos. O número de negros que conseguem concluir seus cursos é menor do que os que entram.
Como os estudantes enxergam o feminismo negro?
Praticamente não lidam. Alguns ignoram o feminismo como um todo. Outros acreditam que isso é uma segregação. É difícil encontrar pessoas que estejam abertas para o debate e a desconstrução de seus privilégios, isso até entre as feministas brancas. A esquerda brasileira tem cunho humanista e social, mas as pessoas aqui no Brasil não gostam de discutir racismo. Mas estamos quebrando barreiras, mesmo com coletivos feministas sem mulheres negras ou que não debatem raça.
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