Em meados de setembro, a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO, de seu nome em inglês) divulgou relatório sobre a fome no mundo. O estudo traz boas novas: no mundo, o número de pessoas subnutridas caiu pela primeira vez em 15 anos, passando de 1,023 bilhão para 925 milhões no último ano. A melhora se deu, fundamentalmente, pela retomada do crescimento econômico nos países menos desenvolvidos e a uma queda nos preços dos alimentos desde 2008.
Mesmo com a redução de 98 milhões de pessoas, o que equivale a 9,6% do total de subnutridos, ainda é um número alto demais. Entre as metas do milênio estabelecidas pelas Nações Unidas na virada do século, está a diminuição à metade no número de vítimas da fome no mundo até 2015. Para caminhar em direção a essas metas, a FAO considera imperativo que países adotem políticas que apoiem a agricultura familiar, atividade que atende parte substantiva da demanda por alimentos no mundo. Além disso, a organização sublinha a importância de políticas assistenciais, sociais e de proteção das populações mais carentes perante as crises econômicas.
Quando se estuda a distribuição geográfica da subnutrição encontra-se o esperado. Algo como 98% dos subnutridos vivem em países menos desenvolvidos. Dois terços dessa população concentram-se em apenas sete países: Bangladesh, China, República Democrática do Congo, Etiópia, Índia, Indonésia e Paquistão. As estimativas da FAO dão conta de que na América Latina e Caribe vivem cerca de 53 milhões em estado de subnutrição.
Simultaneamente, a Action Aid, uma organização não-governamental presente em mais de 40 países e com atuação de suporte às políticas de inclusão econômica, divulgou a segunda edição do Placar da Fome, um ranking dos países que mais atuam contra a fome no mundo. Pelo segundo ano, o Brasil aparece em primeiro entre os países em desenvolvimento, principalmente, por ter conseguido atingir a meta de reduzir à metade a proporção de pessoas desnutridas e de crianças abaixo do peso em pouco mais de 10 anos.
Hoje, já está comprovado no Brasil o resultado das políticas sociais adotadas na última década. Mas vale qualificá-las um pouco. O Brasil sempre foi conhecido no mundo todo como um país que convive com grandes desigualdades e com um elevado contingente da população em situação de pobreza. A urgência em fazer frente a essa situação inspirou a elaboração de programas de apoio social de transferência direta de renda. Essas são iniciativas mais recentes e assumiram importância crescente desde os anos 1990. A execução desse tipo de política tem ampliado o debate acerca das formas de intervenção para aliviar a pobreza e reduzir as desigualdades de renda e de oportunidades, especialmente quando condicionam a concessão do benefício a comportamentos, por parte dos receptores, que visem a estimular alguma forma de acumulação de capital humano. O fato é que essas políticas tiveram efeitos inegáveis na redução da pobreza absoluta. Tomando o caso mais emblemático, o Programa Bolsa Família prevê a transferência de recursos a famílias de baixa renda, condicionando o benefício a comportamentos dos receptores em relação à educação e à saúde. O programa foi instituído pelo governo federal em 2004 e faz parte de um conjunto de programas sociais preexistentes e do Programa Fome Zero. Desde a origem, o programa visou atender a dois grandes objetivos: a redução da pobreza e da desigualdade e a provisão de ativos e incentivos, por meio da ampliação do acesso à educação e de medidas básicas de saúde, para que futuras gerações sejam menos atingidas pela pobreza.
O relatório da Action Aid destaca os resultados dos programas sociais no Brasil, citando a redução do número de pessoas vivendo em extrema pobreza, que passou de 21 milhões em 2003 para 8,9 milhões em 2008, e a perspectiva de que a miséria seja erradicada até 2014.
Parcela importante desses resultados no Brasil se deve, também, a uma melhora nas condições macroeconômicas. Inflação mais baixa vem corroendo menos os rendimentos. O crescimento econômico e o aumento do emprego formal vêm “trazendo” grandes contingentes de trabalhadores para uma vida econômica mais ativa e para o consumo.
Assim, o caminho para a erradicação da miséria é mais seguro na medida em que se combina políticas sociais de emergência, com políticas mais estruturais que possam inserir essas pessoas no mundo do trabalho e atendê-las na rede de educação e saúde.
É um resultado a se comemorar!
*Economista, professora do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de São Paulo.
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