Zuenir Ventura no divã do cinema

Um dos mais talentosos e respeitados jornalistas brasileiros, que escreveu o clássico 1968 – O Ano que não Terminou (1988), cujo tema foi revisitado em um segundo livro (1968 – O Que Fizemos de Nós, de 2008), esteve no Festival de Paulínia e falou de suas experiências com moradores de favelas para profissionais da área de educação. Já em 1977, Zuenir Ventura cunharia a expressão “guerra civil” para descrever a crescente violência no Rio de Janeiro. Mais de 30 anos depois, o escritor tem uma visão mais apurada e qualificada sobre o assunto. Essa nova perspectiva foi fruto de suas experiências e pesquisas nos morros e favelas cariocas. “Eu já tinha viajado muitas vezes para o Rio de Janeiro, mas não conhecia a favela que ficava próxima a minha casa. Fui conhecer essa favela e essas várias visitas que fiz transformariam minha visão sobre o problema. A minha visão de exclusão social mudou meus estereótipos sobre a violência e sobre o povo de favela”, disse, em entrevista recente. Como tínhamos pouco tempo para conversar, e dada a importância do assunto nas pesquisas e no jornalismo de Zuenir Ventura hoje, deixamos para uma próxima oportunidade. Preferimos falar sobre cinema, o assunto da última semana em Paulínia.

Brasileiros – Você gosta muito de cinema, não é?
Zuenir Ventura –
Gosto muito de cinema. É uma paixão bem antiga, tanto quando me envolvo, profissionalmente e, principalmente, como cinéfilo. Cinema é entretenimento, informação, reflexão, aprendizado…

Brasileiros – Como o cinema entrou na sua vida?
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Z.V. – Eu sempre tive muitos amigos ligados ao cinema. Toda minha juventude, quer dizer, o porre da juventude, foi ligado ao cinema, por causa dos amigos. Fui amigo do Leon Hirszman (diretor de clássicos como São Bernardo, com base em obra homônima de Graciliano Ramos), Glauber (Rocha), Cacá Diegues. Então, tive toda essa influência dos amigos de cinema, esses maravilhosos cineastas.

Brasileiros – Você fez alguns trabalhos para o cinema. Gostaria que você comentasse um pouco a respeito.
Z.V. –
Eu participei de algumas coisas para o cinema. Fiz, por exemplo, um roteiro para o Leon Hirszman, que ele filmou, mas que infelizmente (a cópia da película) queimou. Era um filme encomendado para o canal RAI, da TV italiana. Mas, como eu falei, infelizmente a cópia se queimou, não sobrou nada do filme, nenhum trecho, para se ver hoje.

Brasileiros – Como se chamava e sobre o que era o documentário?
Z.V. –
Chamava-se Que país é esse?. Era um documentário que tinha a participação de várias personalidades, como Fernando Henrique Cardoso. Eu nunca mais soube nada a respeito do filme. Trabalhei com Geraldo Sá, em outro documentário. Recentemente, trabalhei com a cineasta Izabel (Jaguaribe), em dois documentários.

Brasileiros – Um desses foi sobre o Paulinho da ViolaPaulinho da Viola – Meu Tempo é Hoje, em comemoração aos 60 anos de vida do cantor. O filme foi lançado nos cinemas em 2003…
Z.V. –
Exatamente. Foi muito gratificante pesquisar sobre o grande sambista Paulinho da Viola, pois gosto muito de suas músicas e da pessoa dele. Fiz o roteiro com a ajuda da Joana Ventura e Izabel Jaguaribe.

Brasileiros – De que forma o cinema entra na tua literatura?
Z.V. –
Acho que de maneira nenhuma. Melhor dizendo, entra como personagem. Eu tenho um livro em que um dos personagens principais é o cineasta Glauber (Rocha). Eu, na verdade, como jornalista, escrevi sobre cinema. Acho que alguns dos meus textos têm pretensões, às vezes, de fazer uma narrativa cinematográfica.

Brasileiros – Isso faz parte do jornalismo moderno?
Z.V. –
O jornalismo moderno tem sempre influência, na narrativa, muito de cinema, da narrativa do cinema. Tem essa ligação de gostar como cinéfilo e de ter muitos amigos, como eu lhe falei, ligados ao cinema, de alguma forma.

Brasileiros – Já conhecia o Polo de Cinema de Paulínia e o festival? (o jornalista e escritor foi convidado para ministrar uma palestra sobre literatura e cidadania durante o Festival de Paulínia deste ano).
Z.V. –
No ano passado, eu fiz parte do júri do festival. Isso aqui é impressionante. Virou um shopping cultural. Minha experiência, como jurado, foi ótima. Nem sempre é assim.

Brasileiros – Só para encerrar: em ano de eleições para presidente da República, o que você espera dos dois principais candidatos, José Serra e Dilma Rousseff?
Z.V. –
O que eu espero? (Fica por alguns segundos pensando no que vai falar). A campanha está começando agora, porque antes teve a Copa do Mundo, e sabe como é isso no Brasil. Só agora é que começa de fato a campanha dos candidatos para as eleições deste ano. Acho que vai ser, para usar uma linguagem futebolística, uma disputa renhida, de dois candidatos. Na verdade, depois da ditadura o país teve a sorte de ter dois candidatos, dois presidentes, como Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva. Os dois, que tiveram trajetórias, no início, comuns, e depois divergentes, sedimentaram a democracia que hoje estamos vivendo. A gente teve essa sorte de manter a democracia consolidada. Olhando à distância, parece que foi muito fácil. Mas na época havia muita tensão, muita incerteza, do que seria desse País depois de anos e anos na ditadura.

Brasileiros – E em relação aos candidatos Dilma e Serra?
Z.V. –
Acho que não vai mudar muito qualquer que seja o resultado. De um lado, o José Serra e do outro, a Dilma Rousseff. Acho que não vai haver muita mudança, qualquer que venha a ganhar. Algumas coisas serão mantidas. Evidentemente, que a economia será mantida. Os projetos de inclusão social serão preservados e aperfeiçoados. Então, acho que não vai haver muitas mudanças. Pelo menos, essencialmente.

Maio de 1968


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