Como o Big Data ajudará a encontrar a cura para o câncer e de outras doenças

“Eu digo que no futuro todo paciente atuará como uma espécie de CEO da sua própria saúde”, disse o professor Carlos Bustamante em coletiva a jornalistas durante o Simpósio de Medicina Personalizada promovido pela empresa de tecnologia SAP e realizado na quarta-feira (14), em Palo Alto, nos Estados Unidos. 

Bustamante é co-fundador e diretor do Center for Computational, Evolutionary and Human Genomics (CEHG) da Universidade da Stanford. Ele endossa o time de pesquisadores e empreendedores que, nos últimos anos, vê na mineração de dados a resposta para incontáveis perguntas da medicina, incluindo aí uma das mais valiosas: podemos achar a cura para o câncer e tantas outras doenças? Apesar de não se ter uma data para isso, a resposta é otimista. 

Uma das maiores preocupações de Bustamante diz respeito ao compartilhamento de dados genéticos. Isolados, eles não têm nenhum valor. Para o professor, a ideia de compartilhar dados médicos é uma questão que precisa ser incentivada, uma mudança na mentalidade que deve começar com médicos até atingir o paciente. 

Algo que Bill McDermott, CEO da SAP e presente no evento, também defende: “Só abrindo essas bases de dados que permitiremos que aquele garoto, o próximo gênio, consiga escrever um código que proporcionará uma nova grande invenção que impactará milhões de pessoas”.

 

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“Muitos se preocupam sobre quem vai ter acesso a tais dados, o que se fará com eles. Mas podemos resolver isso como hoje fazemos com nossos dados no Facebook. Resolvemos compartilhar certas publicações com nossos amigos e não deixar nossas mães vê-las”, brinca Bustamante. “Podemos fazer o mesmo com nossos dados genéticos”.

Segundo o professor, a escola de medicina de Stanford trabalha com as soluções da SAP há três anos, uma colaboração que resultou no ano passado na entrada da companhia no Global Alliance for Genomics and Health, um conselho de líderes da indústria que visa acelerar esforços globais no compartilhamento e análise de dados clínicos e genômicos. 

A SAP Hana, por exemplo, visa acelerar o processamento desses dados. Ao dispor milhares de genomas em uma mesma base, pesquisadores conseguem criar padrões em tempo real. Antes da solução em nuvem, era preciso recorrer a hard drives, uma limitação física que também barra a colaboração com pesquisadores de outras universidades. 

Outra questão para a qual Bustamante chama atenção é como testes clínicos de medicamentos e estudos tendem a se concentrar sobre populações de descendência europeia em comparação a outras, como na China, Africa, India e América do Sul. 

“Você acaba pegando uma pequena representatividade  da população mundial. E isso é um problema por que você deixa de lado um grande volume de dados biológicos que podem contribuir para milhões. Não gostaríamos de saber que uma mulher asiática tem menos chances de sobreviver a um câncer de mama porque simplesmente não sabemos muito sobre o genoma da população que reside no sul da China”, diz ele.

A ideia é que ao tornar tais dados compartilháveis e buscáveis – como hoje facilmente buscamos por uma receita no Google – a mineração dos mesmos têm o potencial de não só reduzir os custos com a saúde de países desenvolvidos e emergentes, como dar melhores condições para entender as raízes de doenças crônicas e não só tratá-las.  E de quebra ser uma ótima oportunidade para o surgimento de novos negócios.


Medicina personalizada e em rede

A empresa de tecnologia alemã SAP, mais conhecida por suas aplicações no varejo, também tem focado seus esforços no setor de saúde. Por meio da plataforma in-memory Hana, pesquisadores e instituições conseguem avaliar dados de pacientes em tempo real e encontrar padrões em doenças e mutações genéticas. Uma espécie de microscópio digital do nosso século. 

“Nossa visão é criar uma rede de saúde e de medicina personalizada”,  disse Dinesh Vandayar, vice presidente de medicina personalizada da SAP em entrevista a Computerworld Brasil. Para ele, um dos grandes desafios ao se abordar as possibilidades do Big Data e suas aplicações na área médica diz respeito ao compartilhamento de dados, ou melhor, à falta dele.

“Não existe fluxo livre de informações, seja entre universidades, clínicas, empresas farmacêuticas, companhias de seguro e entidades governamentais que suportam a saúde pública. Todos esses personagens têm bases de dados valiosíssimas, mas a troca de informações não acontece. E por que esses caras não têm acesso livre às informações, isso afeta definitivamente os resultados que poderiam beneficiar pacientes”, ressalta o executivo. A SAP Hana for Health tem como objetivo, diz Vandayar, facilitar a troca de informações entre todos os elos da cadeia de saúde e “impactar de forma direta e positiva os resultados para pacientes”. 

A ASCO (American Society of Clinical Oncology) é uma das instituições que têm trabalhado com a solução da SAP. Em janeiro deste ano, a entidade começou a desenvolver por meio da SAP Hana, a plataforma CancerLinQ, que quando concluída conseguirá “destravar” milhões de dados de dispositivos eletrônicos de saúde, processá-los e analisá-los. Com a análise deles, a máxima de que cada paciente é único ganha um espectro mais granular.

Peter Paul Yu, oncologista e presidente da ASCO e um dos convidados do Simpósio, indica que a CancerLinQ permitirá feedbacks imediatos e de alta qualidade para profissionais da saúde e pacientes. 

Em resumo, a tecnologia ajudará médicos a tomarem decisões mais assertivas em relação a tratamentos. Dados coletados via Raio X, ressonâncias magnéticas, sensores e wearables, compõem um perfil de cada paciente e da mesma forma serão responsáveis por dar uma paisagem geral e específica sobre como cada um responde a determinados tratamentos. 

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Segundo o oncologista Yu, a primeira versão da CancerLinQ será lançada no início de 2016 e conta com uma base atual de dados de cerca de 500 mil pacientes.


A Internet das Coisas e a medicina

Para o cardiologista Euan A. Ashley, professor associado de Medicina e Genética na Stanford School of Medicine, quando se fala sobre medicina personalizada é impossível deixar de lado a contribuição e o impacto que terá a Internet das Coisas. 

Wearables, como smartwatches e pulseiras fitness inteligentes, permitirão uma espécie de onipresença médica. “Antes o paciente chegava no consultório com pressão alta e se queixava que andava muito estressado. A gente então anotava ‘estressado’ num papel”, ironiza Ashley durante o simpósio ao dizer que médicos ainda dependem muito da visão de seus pacientes para compor um diagnóstico.

“Hoje, esses aparelhos estão ficando cada vez mais sofisticados, permitindo uma coleta mais precisa de batimentos cardíacos, por exemplo. Com isso, conseguimos analisar e comparar o que aconteceu em determinado momento da vida de um paciente quando este teve um pico incomum de seus batimentos”, explica mostrando os dois smartwatches que carrega nos pulsos.

Ashley prevê que é uma questão de tempo para o que o preço dos dispositivos vestíveis comece a diminuir no mercado, democratizando seu acesso. 

A relação entre médicos e pacientes também muda, destaca o professor.

“Estamos colocando mais poder nas mãos dos pacientes. Até então, o sistema de saúde sempre esteve focado nos médicos, nos hospitais. Agora, novos sistemas ficam muito mais focados no paciente. E mais que isso, não é só uma pessoa que se encontra doente, mas alguém que simplesmente está interessado em sua saúde”, destaca. 

Uma nova relação que, segundo Ashley, permitirá a análise preditiva de dados de milhões de pessoas e que, consequentemente, impactará o sistema mundial de saúde. 

“Devemos pensar em como o sistema de saúde pode se transformar em um sistema de prevenção de doenças e promoção de saúde. Acredito que essas novas tecnologias nos colocam a frente da doença, prevenindo que você as tenha em primeiro lugar”, analisa.

Ao prevenir doenças, a expectativa é que haja uma redução nos orçamentos destinados à saúde. Ao se ter condições, por meio da análise preditiva de dados de uma pessoa e sua predisposição genética a desenvolver certas doenças, a ideia é que será possível controlar comportamentos de risco com maior “inteligência” e, da mesma forma, controlar a evolução inicial de uma doença que poderá ser tratada de forma personalizada. As chances de controlá-la ao saber qual tratamento realmente funciona diminuirão diretamente as tentativas de tratamentos dispendiosos e pouco efetivos.  

“Imagine a economia que isso pode gerar ao se prevenir câncer de mama, ataques do coração e poupar custos em tratamentos longos e exaustivos nos hospitais”, ressalta Ashley.

* A jornalista Carla Matsu viajou a Palo Alto à convite da SAP


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