O exercício da medicina tem pela frente o desafio de equilibrar-se entre dominar o conhecimento científico e, ao mesmo tempo, ser capaz de dar acolhimento humano aos seres humanos que necessitam de atenção médica.
A questão é clara: os médicos, ao ganharem em ciência, perdem em coração? Decidi explorar o tema a partir de como a prática médica é compreendida pelo olhar das artes visuais e do cinema.
Parto da hipótese de que as artes expressam com mais precisão a atuação dos médicos do que os próprios médicos, imersos na intensidade da própria profissão. Comecei com as ilustrações de Norman Rockwell, o genial desenhista das capas do Saturday Evening Post, que retratava um médico paternal e amigo, e com os filmes da década de 1930 do Dr. Kildare, que tiveram como protagonista Lew Ayres, personagem revivido na série de TV dos anos 1960 por Richard Chamberlain.
Rockwell ou Kildare representavam médicos humanos, desprovidos de ambição, com total comprometimento aos seus pacientes. Segui com o Dr. Frankenstein, de James Whale, que em 1931 retratou o temor do poder da medicina (coincidindo com as primeiras cirurgias torácicas e cardíacas), onde o médico era punido pela sua própria criatura, ao tentar ousar interferir com a vida e a morte.
Nos anos 1970 e 1980, os médicos descem mais um degrau. Ou fazem parte de corporações inescrupulosas que, ao lançar substâncias tóxicas no esgoto, fazem surgir um jacaré gigante a aterrorizar New York (imprudência) ou médicos cínicos, como os que Roger Altman descreveu em MASH, incapazes de se compadecer dos pacientes mesmo em meio a uma guerra pavorosa.
Terminei finalmente com o Dr. House, exemplo de médico tecnicamente brilhante, mas incapaz de enxergar o doente que sofre e sim valoriza apenas a doença. Hoje, como professor de medicina, sinto que estamos mais preparados a formar Houses do que Kildares. Nossos pacientes anseiam por uma combinação virtuosa de ambos. Este é o desafio que se apresenta a todos nós, professores de medicina.
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