É sabido que as gestantes devem receber boas quantidades de ácido fólico ou B9, como é conhecida a substância. Em geral, a vitamina é dada a elas na forma de suplemento. Essencial ao desenvolvimento do embrião, sua carência pode levar a malformações do tubo neural (estrutura da qual se originam o eixo central do sistema nervoso e a coluna vertebral), anencefalia e diferentes graus de deficiência mental. No entanto, apesar de sua reconhecida importância, faltava ainda investigar os mecanismos pelos quais o ácido fólico atua sobre o DNA do feto.
Em busca de respostas, a equipe do Setor de Nutrologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), campus de Ribeirão Preto, decidiu investigar a ação do ácido fólico em alguns genes associados a doenças cardiovasculares e ao diabetes mellitus tipo 2 (adquirida). O resultado do estudo, feito em ratas grávidas, revelou que alterações no fornecimento do ácido fólico interferiu na expressão desses genes selecionados nos filhotes.
Depois dessa constatação, os dados obtidos foram comparados com o material genético de filhotes cujas mães receberam diferentes concentrações de ácido fólico durante a gestação e a lactação. Os pesquisadores verificaram que os filhotes de gestações em que houve carência de ácido fólico apresentaram uma expressão maior dos genes associados aos males cardiovasculares e diabetes. Já as mães que receberam a devida suplementação tiveram ninhadas em que se verificou uma expressão menor desses genes.
“Esses resultados revelam mecanismos moleculares envolvidos na reprogramação epigenética fetal dos genes ligados a doenças cardiovasculares e diabetes mellitus tipo 2. Mostram também a importância do fornecimento adequado de ácido fólico às mães durante o desenvolvimento embrionário”, diz a geneticista Paula Lumy Takeuchi, responsável pelo estudo.
O que significa reprogramação epigenética? A geneticista esclarece que o termo corresponde às mudanças observadas nas expressões dos genes que foram estudados. Neste trabalho, o que se viu foi que a alteração nas quantidades de ácido fólico fornecida pela alimentação das gestantes afetou o ciclo de um aminoácido chamado metionina, que participa de mecanismos pelos quais os genes são “ligados e desligados”, tornando-se ativos ou inativos no organismo.
Outros fatores em estudo
O artigo publicado pela Agência USP de notícias para divulgar a descoberta acentua que não se pode fazer uma correlação direta entre esses achados experimentais, em ratos de laboratório, com o organismo humano. Isso quer dizer que mais pesquisas são necessárias para documentar os efeitos em humanos.
A cientista Paula Takeuchi lembra que a diminuição ou aumento da expressão de um ou mais genes pode levar a mais de uma mudança. Isso depende, obviamente, das funções que cada gene desempenha. No caso do tratamento com ácido fólico, por exemplo, a produção do colesterol bom (HDL) e do colesterol ruim (LDL) pode ser afetada. Segundo a pesquisadora, a diminuição da expressão dos genes que estudou pode levar a “uma menor síntese do LDL, mas também haverá redução da síntese do HDL”. De todo modo, é fundamental lembrar que o desenvolvimento de doenças cardiovasculares e diabetes mellitus tipo 2 é resultado da ação de diversos fatores e não pode ser atribuído exclusivamente à desregulação da expressão de genes. “Fatores externos também contribuem de forma preponderante”, diz a cientista. Por isso, o próximo passo da pesquisa será estudar essas variantes.
Com este estudo, a pesquisadora e pós-doutoranda Takeuchi e o professor Hélio Vannucchi receberam o prêmio internacional 2017 Malaspina International Scholar Travel Award do International Life Sciences Institute (ILSI), fundação mundial sem fins lucrativos que procura colaboração científica entre nutrição, segurança alimentar, toxicologia, avaliação de risco e meio ambiente.
Quando e quanto tomar B9
A recomendação do Conselho Federal de Medicina é de que as mulheres usem ácido fólico antes da concepção e nos três primeiros meses de gravidez. A ingestão diária de 400 microgramas dessa vitamina pode reduzir em até 75% o risco de má formação no tubo neural do feto, o que previne casos de anencefalia, paralisia de membros inferiores, incontinência urinária e intestinal nos bebês. Isso, além de diferentes graus de deficiência mental e de dificuldades de aprendizagem escolar.
* Com informações da Agência USP, de Ribeirão Preto
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