Eduardo Cunha impede acesso de profissionais da saúde a debate sobre zika no Congresso

A polícia legislativa impediu na quinta-feira (7), Dia Mundial da Saúde, que um grupo de mais de cem profissionais da saúde, estudantes, docentes e pesquisadores de entrar no plenário Ulysses Guimarães, na Câmara Federal, em Brasília. O grupo iria participar do debate sobre a epidemia de zika, dengue e chikungunya promovido por uma comissão presidida pela deputada Luiza Erundina (PSOL-SP). Até mesmo palestrantes convidados não puderam participar do evento. 

Entre os que ficaram do lado de fora estavam Valcler Rangel Fernandes, vice-presidente da Fundação Oswaldo Cruz para Ambiente, Atenção e Promoção da Saúde e representantes da Organização Panamericana da Saúde, do Conass (Conselho Nacional de Secretários de Saúde, Conassems (Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde) e da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura. 

A justificativa dada pelos membros da polícia legislativa (Depol) aos manifestantes foi de que o acesso estava impedido por uma ordem dada pelo deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), presidente da Câmara.

A Depol é responsável pela preservação da ordem e do patrimônio no Congresso Nacional e tem a incumbência de efetuar a segurança do Presidente da Câmara dos Deputados. No caso, de Cunha, que lançou mão desse recurso para impedir o direito de reunião e manifestação de diversos militantes da saúde dentro do Congresso. 

A proibição da entrada dos ativistas foi denunciada pela deputada Erundina na abertura da sessão. No plenário, havia pouco mais de dez pessoas, enquanto lá fora a multidão protestava contra o gesto antidemocrático de Cunha.  Para a deputada do Psol, a liberdade de participação foi tolhida pela Presidência da Câmara e pela polícia legislativa. “Uma questão de tanta relevância social e a sessão está praticamente vazia. Falta de interesse do povo? Não. Falta de liberdade”, disse Erundina. 

Menos de dez pessoas no plenário acompanharam comissão sobre zika. Do lado de fora, mais de cem queriam entrar. Foto: Imagem cedida por ativistas
Menos de dez pessoas no plenário acompanharam comissão sobre zika. Do lado de fora, mais de cem queriam entrar. Foto: Imagem cedida por ativistas

Revoltado com o cerceamento, Vanderlei Macedo, assessor parlamentar do Conselho Nacional de Saúde, denunciou a situação nas redes sociais. “Nunca esse tipo de atividade foi vetado ao público. É uma audiência pública no plenário Ulysses Guimarães, que sempre foi aberto ao público. Ainda mais para a comunidade científica, do SUS e do controle social”, divulgou Macedo por volta das 10h45. 

Depois de muita insistência, Macedo conseguiu acesso ao plenário. “Mas fui avisado pela polícia legislativa de que teria de me comportar porque aqui é proibido se manifestar.”

Com a ajuda de deputados, mais alguns ativistas conseguiram entrar nas galerias para acompanhar o debate. “Porém, tomaram os nossos celulares e os pertences de todos que puderam entrar”, conta Juliana Acosta, representante da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag) no Conselho Nacional de Saúde.

Um dia antes, na quarta-feira (6), Juliana teve a preocupação de ir aos setores responsáveis para cadastrar os nomes das cem pessoas que viriam ao debate sobre a epidemia de zika. Foi informada de que não era necessário e de que as pessoas poderiam entrar no plenário. 

Na avaliação da ativista Juliana Acosta, Cunha busca meios para manter as manifestações políticas suspensas. “Hoje, dentro do Congresso Nacional, há uma ditadura. Não podemos mais nos manifestar”, diz ela.

Bolsonaro ataca de novo   

Uma cena lastimável protagonizada pelo deputado Jair Bolsonaro (PP) chocou os poucos ativistas que a presenciaram. “Ele [Bolsonaro] subiu às galerias e agrediu verbalmente pessoas”, descreveu o assessor Vanderlei Macedo nas redes sociais. Famoso por agredir manifestantes (basta teclar no Google para conferir), neste episódio Jair Bolsonaro parou a gravação de um vídeo para perseguir uma ativista aos gritos de “essa imbecil, essa energúmina, me xingou”. Testemunhas relataram à Saúde!Brasileiros que Bolsonaro repetia seguidamente a frase “eu quero a identidade dela”. 

O que teria motivado a reação tão passional? Ao passar pelo deputado, a mulher teria murmurado algo sobre a entrevista que ele concedia. Inaudível e restrita a pouco mais de duas palavras, a provocação poderia ter sido ignorada ou entendida como algo normal por um político acostumado a lidar com opiniões contrárias. Ou seja, apenas mais um episódio do cotidiano de um parlamentar. Porém a história relatada por quem viu acontecer é que o deputado ficou transtornado. Para refrescar a memória, Bolsonaro é um militar da reserva que cumpre seu sexto mandato. Defende a ditadura militar e considera a  tortura como uma prática legítima.

Valcler Rangel, vice- presidente da Fiocruz, e Socorro Souza,  pesquisadora da instituição, também tiveram dificuldade de entrar no debate sobre Zika. Foto: Enviada por celular
Valcler Rangel, vice- presidente da Fiocruz, e Socorro Souza, pesquisadora da instituição, também tiveram dificuldade de entrar no debate sobre zika por ordem de Cunha. Foto: Imagem cedida por ativistas

Vacina de democracia

Junto com os militantes do Comitê Pró-Democracia na Câmara e da Frente Democracia e Saúde, os “excluídos” realizaram um ato pelo Dia Mundial da Saúde e em protesto contra o cerceamento das liberdades democráticas. “Fizemos uma vacinação contra o golpe e distribuímos pílulas de democracia. Eram de chocolate, bem docinhas”, diz Juliana Costa, do CNS. 

Em ato no Dia Mundial da Saúde, ativistas vacinam "contra o golpe". Foto. Por celular
Em ato no Dia Mundial da Saúde, ativistas vacinam “contra o golpe”. Foto: Imagem cedida por ativistas

Durante o ato, um dos organizadores foi abordado por funcionários do Congresso que queriam relatar o clima repressivo que enfrentam. Ele contou à Saúde!Brasileiros que os funcionários públicos mantiveram os crachás escondidos durante a conversa.  “Disseram que estão absolutamente proibidos de fazer qualquer manifestação sobre temas políticos e que nem deveriam falar comigo porque corriam risco de sofrer perseguições”, disse o ativista. 

 


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