O metrô da cidade de São Paulo está entre os poucos locais onde as chances de sobreviver sem sequelas a uma parada cardíaca são maiores.
O mérito é de um programa de treinamento de ressuscitação cardiopulmonar iniciado em 2006 que já ensinou mais de 3.000 funcionários e agentes de segurança a prestarem o primeiro atendimento às pessoas que desmaiam nas estações.
Junto com o treinamento, foram instalados desfibriladores em todas as estações (58, à época). Trata-se de aparelhos que liberam descargas elétricas controladas para regularizar batimentos cardíacos ou impulsionar o coração a voltar a bater. No treinamento, agentes e funcionários aprendem a manejar o aparelho.
A combinação do treinamento e do acesso ao desfibrilador fez do metrô de São Paulo o lugar mais seguro para ter um infarto fora do hospital.
De acordo com os especialistas que implantaram o programa, hoje a chance de uma pessoa sobreviver sem sequelas a uma parada cardíaca no metrô é de 37%. Nas ruas, é de aproximadamente 2%.
Na semana passada, a equipe de médicos responsável pelo treinamento e monitoramento publicou um estudo comentando os resultados obtidos entre 2006 e 2012. O trabalho pode ser lido no jornal da American Heart Association. Antes desse programa, não havia protocolo para atendimento de emergências médicas no local.
Como foi o estudo
Durante os 75 meses de duração da pesquisa, os médicos verificaram a ocorrência de 102 casos de colapsos repentinos em 58 estações do metrô paulistano. Dentre todos, 62 indivíduos atenderam os critérios para participar do estudo: são pacientes que ficaram inconscientes e sem respirar por alguns momentos, mas recuperaram a consciência e seguiram para o hospital.
Liderados pelo cardiologista Sérgio Timerman, os pesquisadores acompanharam esses indivíduos por um ano. Timerman é diretor do Laboratório de Treinamento, Simulação e Pesquisa em Emergências Cardiovasculares do Instituto do Coração (InCor/USP) e um dos fundadores da Aliança Internacional dos Comitês de Ressuscitação. O objetivo do trabalho foi avaliar a relação entre o tempo de início do primeiro atendimento, a sobrevivência e o aparecimento de sequelas.
Como não havia dados anteriores, os pesquisadores compararam os resultados finais com o que ocorreu nos primeiros 16 meses do programa de emergência.
Rapidez do socorro diminui sequelas
O monitoramento constatou que o fator mais importante para proteger a integridade neurológica dos pacientes (que pode ser afetada pela falta de circulação e oxigenação) foi o intervalo de tempo entre o colapso e o primeiro choque dado pelo desfibrilador.
Na pesquisa feita no metrô de São Paulo, o tempo de atendimento entre o desmaio e o início da ressuscitação foi de 2,7 ± 1,2 minutos. “É o primeiro estudo que aponta um resultado tão bem sucedido em uma grande metrópole”, diz o médico Timerman.
Para ele, esses dados mostram que há um grande ganho em expandir o treinamento e o uso do desfibrilador no transporte coletivo para outras grandes cidades do País.
Os cientistas viram também que o surgimento de sequelas após a parada cardíaca aumentou na proporção em que o tempo de início do uso do desfibrilador oscilou entre 2 a 4 minutos.
Nos casos de colapso cardíaco, cada minuto faz diferença na vida futura dos sobreviventes. Os pacientes que tiveram melhor evolução foram os mais jovens e que receberam o primeiro disparo elétrico mais rapidamente após o desmaio.
De modo geral, o tempo médio de colapso até a desfibrilação costuma ser de 4,8 e mais ou menos 1,2 minutos. Os programas que funcionam nos aeroportos de Chicago, nos Estados Unidos, e nas linhas de trem de Osaka, no Japão, alcançam essa média. Nesses países, a ressuscitação cardíaca com desfibriladores faz parte da rotina de cassinos, estações ferroviárias e instalações esportivas.
O que fazer se alguém desmaiar perto de você no metrô
Alerte o funcionário do metrô mais próximo.
Ele avisará a central de controle para acionar o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU). Enquanto isso, o agente treinado fará uma verificação para saber se a pessoa está inconsciente e se respira ou não para confirmar a parada cardíaca e dá início à massagem torácica (deve ser ritmada, intensa e constante).
A essa altura, outro funcionário do metrô já deve ter trazido o desfibrilador mais próximo ao local. O equipamento precisar estar ligado e suas duas pás devem ser colocadas sobre o peito do paciente. Automaticamente, o desfibrilador calcula a intensidade da descarga elétrica necessária para reabilitar os batimentos cardíacos e dispara um ou mais choques. O paciente será levado para o hospital assim que o Samu chegar.
Quanto mais rápido esse protocolo for cumprido, menor o risco de sofrimento do músculo cardíaco e de sequelas por causa do déficit de circulação e oxigenação.
Participação da comunidade
Na opinião dos especialistas em ressuscitação cardiopulmonar, os resultados obtidos no metrô podem melhorar ainda mais com a participação da comunidade.
O engajamento de desconhecidos no socorro a quem cai inconsciente nas ruas ou mesmo no metrô é um desafio. Estudos feitos em Seattle, nos Estados Unidos, onde funciona um bom programa de ressuscitação, mostram que as pessoas ainda se chocam com a ideia de socorrer alguém desmaiado e acionar um desfibrilador antes da chegada dos profissionais da emergência.
No entanto, os especialistas já treinam a população nas ruas de Seattle para ajudar nesse momento. Em São Paulo, o mesmo treinamento tem sido dado em escolas da rede pública e algumas empresas.
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