Popularmente conhecida como “barriga d’ água”, a esquistossomose atinge cerca de 230 milhões de pessoas em todo o mundo e é endêmica em 76 países da África, Sudeste da Ásia, América Central e América do Sul.
Segundo a Fundação Oswaldo Cruz, é a segunda condição parasitária que mais faz vítimas em regiões mais pobres, ficando atrás apenas da malária. No Brasil, a condição afeta principalmente o nordeste brasileiro e o Estado de Minas Gerais.
Apesar de fazer tantas vítimas, no entanto, encontrar uma cura para a doença não está entre as prioridades dos grandes laboratórios da indústria farmacêutica.
Cientistas do Instituto de Química (IQ) da USP identificaram uma nova combinação de drogas que se mostrou eficaz na morte de vermes adultos de Schistosoma mansoni. O parasita é o causador da esquistossomose.
Os experimentos foram realizados in vitro com os medicamentos Praziquantel (PZQ) e Omeprazol (OMP). O artigo sobre a pesquisa acaba de ser publicado na revista PLOS Neglected Tropical Diseases.
O professor Sergio Verjovski-Almeida, do Departamento de Bioquímica do Instituto de Química (IQ) da USP, explica que o trabalho foi identificar quais novas drogas poderiam apresentar o que ele chamou de ‘sinergia’ com o Praziquantel, a droga atualmente usada contra o parasita. A ideia era encontrar uma nova substância e comprovar a eficácia da combinação desta nova droga com o medicamento para matar o parasita.
Verjovski-Almeida explica que o PZQ já é utilizado como medicação contra a doença. Apesar de matar o parasita, não há a garantia de proteção contínua da droga contra oSchistosoma mansoni, visto que mesmo após a medicação os pacientes voltam a ficar em contato com a larva em locais de alta contaminação.
“Além disso, trata-se de um custo de saúde pública caro. Mesmo no Egito, onde foi largamente utilizada, a droga não foi capaz de erradicar a doença”, lembra Verjovski-Almeida, ressaltando que já existem parasitas resistentes à droga.
Inicialmente, os cientistas analisaram cerca de 13 mil genes do parasita, extraindo o RNA de parasitas S. mansoni controle, mantidos em cultura.
De acordo com o cientista, em todo organismo vivo alguns genes funcionam mais e outros menos, em algum momento da vida das células daquele organismo.
Em seguida, foram aplicadas em alguns parasitas doses subletais de PZQ, extraído o RNA destes parasitas, e comparado o funcionamento dos mesmos 13 mil genes nestes parasitas tratados com PZQ com o funcionamento dos genes nos parasitas controle, não tratados.
A comparação mostrou que havia um conjunto de genes afetados pelo PZQ. Posteriormente, os cientistas buscaram, entre estes genes afetados do parasita, se havia algum gene semelhante a um gene humano para o qual já se conhecesse a ação de outra droga.
Assim, identificaram o gene ATP1A2, sobre o qual age o Omeprazol (OMP). “O Omeprazol é um antiácido que entra na circulação sanguínea via parede do intestino, e sabe-se que ele age sobre o gene ATP1A2 humano.
Vale lembrar que ao testar o OMP vimos que ele sozinho não tem a capacidade de matar o parasita, mas combinado com o PZQ conseguiu aumentar muito a morte do S. mansoni”, descreve Verjovski-Almeida, ressaltando que nos parasitas fêmeas o OMP aumentou em três vezes a morte do parasita e, nos machos, em oito vezes.
Diferenças
Uma das diferenças entre os parasitas machos e fêmeas de S. mansoni é o seu tamanho. “Além de maiores, sabia-se que os machos morrem antes das fêmeas sob o efeito do PZQ”, explica Verjovski-Almeida. Outra característica desse organismo é que a fêmea vive dentro do macho.
As fêmeas maduras que vivem dentro do macho, antes de sua morte, são denominadas pareadas. Após a morte do macho, a mesma passa a ser “não pareada”.
De acordo com o cientista, o OMP agiu nas duas espécies de fêmeas (pareada e não pareada). “As fêmeas têm características diferentes mas no caso das pareadas, houve mudança na reação à droga”, descreve o professor.
Com base nestes resultados, conclui-se que doses subletais de PZQ combinadas com OMP são eficazes na mortalidade do verme in vitro, evidenciando um efeito sinérgico.
Segundo o pesquisador, os experimentos abrem caminho para que se apontem novos fármacos sinérgicos a serem utilizados no combate ao parasita. Ele conta que os estudos com a rede de genes alterados por PZQ em S. mansoni acontecem há cerca de três anos. “Contudo, nossa percepção sobre a utilização de drogas sinérgicas se deu há pouco mais de um ano. Esta sinergia pode ser o caminho para a obtenção de novos e eficientes medicamentos para combater a doença”, ressalta o cientista.
Deixe um comentário