De janeiro até agora, quatro pessoas morreram se exercitando em academias. As mortes ocorreram em São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Santa Catarina. Um desses indivíduos tinha 29 anos e era, aparentemente, forte e saudável. A causa da sua morte ainda não foi elucidada. Outro tinha 57 anos e infartou durante o exercício. Há muitos outros casos.
Essas perdas reacendem o debate sobre a necessidade de se submeter a uma avaliação física antes de iniciar o treino. Hoje, a maioria das 30 mil academias do País apenas pede aos novos frequentadores que respondam um questionário sobre a sua saúde.
Evidentemente, espera-se do indivíduo que seja sincero. Mas será que esse procedimento é suficiente para identificar e proteger os indivíduos que têm maior risco cardiovascular e cujo coração pode entrar me sofrimento sob esforço?
A resposta é não, esse questionário não é suficiente. E nem sempre os indivíduos respondem com sinceridade.
O desafio tem sido encontrar um instrumento de avaliação que seja aceito por nós, os médicos e também assumido pelos empresários do setor, professores e pelas pessoas que praticam atividade física. Caso contrário, nada vai mudar.
Uma das propostas existentes para isso é o Projeto de Lei do Senado (PLS) 242/2015. De autoria do senador Romário, o projeto estabelece, basicamente, que a pessoa que deseja praticar esportes ou outra atividade física em academias ou clubes preencha um questionário de prontidão para a atividade física e assine um termo de responsabilidade. Só nos casos em que o professor de educação física observar algum risco será pedido que o cliente vá ao médico, faça exames e traga um atestado.
A proposta peca pela unilateralidade, mal que afeta a maioria dos projetos discutidos pelo Legislativo em âmbito municipal e agora, federal. Depois, pelo uso de referência defasadas. O questionário mencionado foi elaborado há mais de quinze anos com a finalidade de avaliar corredores de rua. Insisto ainda que sociedades médicas como a Brasileira de Cardiologia e Brasileira de Medicina deveriam ter participado do debate acerca do projeto porque têm muito a contribuir na formulação de propostas cujo foco central é a segurança das pessoas que praticam atividade física.
Felizmente, nos últimos dois meses, formou-se um grupo de trabalho que tem se reunido na Sociedade Brasileira de Cardiologia. Dele participam lideranças do setor das academias, profissionais da educação física e nós, médicos. Estamos estudando ajustes a serem feitos nos questionários propostos pelo PLS 242/2015 para serem encaminhados aos relatores do projeto no Senado. Estão em discussão também os termos de compromisso usados por algumas academias brasileiras, nos Estados Unidos e Canadá. Ao assiná-los, a pessoa assume que tem plenas condições de saúde de praticar exercícios. Na prática, funciona como uma isenção de responsabilidade para as empresas caso ocorra algum problema nas suas dependências. Além disso, o termo não resolve o problema da prevenção.
O grupo de trabalho constituído voluntariamente pela sociedade civil é sinal de que estamos evoluindo no debate. Mas além do engajamento dos empresários e professores do setor, é necessário haver também um envolvimento maior dos frequentadores das academias. É fundamental que os indivíduos aprendam a ter consciência dos limites do próprio corpo. Como se faz isso? Com informação e mobilização. Será que assumiremos todos essa pauta para evitar a próxima morte?
(*) Nabil Ghorayeb é Chefe da Cardiologia do Exercício e do Esporte do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia, presidente do Departamento de Exercício e Esporte da Sociedade Brasileira de Cardiologia e editor do jornal da entidade.
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