“Nesse editorial, vou sugerir o que a primeira vista pode ser uma intervenção drástica ou até antiética: o uso de drogas psicoativas para facilitar a atividade física”, escreve o professor Samuele Marcora, diretor de pesquisa da Escola de Esporte e Ciências do Exercício na Universidade de Kent, no Reino Unido.
O texto de Marcora foi publicado na última edição da prestigiosa Sports Medicine e sugere abertamente que a intervenção farmacológica ou de drogas seguras e conhecidas, como o café, podem ser usados para aumentar a adesão ao exercício.
Para sustentar seu argumento, o pesquisador recorre ao que já está descrito na literatura científica. No artigo, ele argumenta que fomos projetados para poupar esforço. Os seres humanos, diz ele, passaram por privações na vida da Terra -como a escassez de recurso, a fome e a necessidade de poupar energia -e isso selecionou genes preguiçosos.
Mas independente dessa hipótese evolutiva, sustenta o pesquisador, o fato é que estudos clínicos atuais têm demonstrado que, quanto menor a percepção do esforço, maior a probabilidade de engajamento no exercício.
Do ponto de vista da aderência ao exercício, Marcora afirma ainda que é com base nessa percepção que muitos especialistas indicam somente a atividade moderada para adultos saudáveis, quando visivelmente atividades mais rigorosas poderiam proporcionar maiores benefícios em menos tempo.
“É até uma atitude sábia porque a única maneira de reduzir a percepção do esforço, é reduzindo a intensidade do exercício”, escreve.
Assim, diretrizes internacionais sugerem pelo menos 150 minutos de atividade moderada por semana, enquanto o tempo para a atividade vigorosa, com os mesmos benefícios, seria de 75 minutos.
“Além disso, há cada vez mais evidência epidemiológica de que o exercício vigoroso maximiza os benefícios de qualquer atividade física.”
Marcora finaliza dizendo que seria benéfico fazer com que a população em geral tenha acesso ao exercício vigoroso. Só que, para ter aderência, o exercício vigoroso precisa vir acompanhado de uma percepção menor do esforço.
Outro ponto de Marcora é que algumas drogas psicoativas poderiam facilitar com que pessoas obesas (em que o esforço seria maior até para a atividade moderada) e pessoas que sofrem com fadiga crônica poderiam mais facilmente aderir a um programa de exercícios.
Como o benefício proporcionado pela atividade física supera e muito os efeitos de drogas estimulantes seguras, como o café, por exemplo, a indicação para quem não consegue fazer exercício por preguiça, superaria os possíveis malefícios de beber café antes do esporte.
Uma droga psicoativa segura? Café
No artigo, entretanto, o especialista acaba afunilando o seu argumento sobre drogas psicoativas, para uma especificamente: o café. Segura, barata e efetiva, a cafeína já foi objeto de inúmeros estudos que a relacionam com o exercício.
Ainda, a cafeína ainda está associada a sensações de prazer durante a atividade. O pesquisador pontua, no entanto, que a maioria dos estudos clínicos que associaram o café à atividade física foram feitos em pessoas ativas fisicamente e uma nova gama de pesquisas seria necessária se o café poderia ter um efeito de aderência ao exercício em pessoas sedentárias, obesas ou com fadiga.
Em casos mais graves, o especialista citou a necessidade de pesquisas com o modafinil, que, segundo ele, tem um perfil de ação seguro e tem sido usado para o tratamento da sonolência.
Sem barreiras negativas
Na conclusão, o especialista diz que, dados os benefícios do exercício, que já foi citado como “cura milagrosa”, pela Academy of Medical Royal Colleges, uma estratégia de saúde pública pode ser considerada.
Ele diz temer que conotações éticas negativas em torno do doping possam ser uma barreira para futuras investigações e até, talvez, para uma intervenção psicofarmacológica em alguns casos.
Deixe um comentário