Vê uma pizza com embalagem sabor manjericão, por favor?

Atualmente, o destino das embalagens dos alimentos após o consumo do produto é o lixo. Em um futuro não muito distante, porém, o supermercado poderá oferecer um fim bem mais nobre para essas mesmas embalagens Mais do que simples invólucros, elas poderão ser parte do prato comprado.

Isso mesmo: Em vez de plástico em cima da pizza (que precisa ser retirado e descartado), ela poderá, por exemplo, vir coberta por um filme de tomate que vira molho ao ser levado ao forno.

A solução, desenvolvida no Brasil pela cientista Márcia Moura Aouada no Departamento de Física e Química da UNESP de Ilha Solteira em parceria com a Embrapa Instrumentação, pretende resolver o dilema atual do mundo das embalagens de alimentos. Por um lado elas são super práticas, mas de outro geram uma infinidade de lixo que não é reciclado, além da questão da possível toxicidade de alguns de seus componentes, como o bisfenol e os ftalatos.

Embalagens com sabor estão em pesquisa. Foto: Ingimage
Embalagens com sabor estão em pesquisa. Foto: Ingimage

Um relatório de 2010 sobre reciclagem, feito pela empresa de pesquisa de mercado especializada em embalagens Datamark, apontava que a cada cinco embalagens plásticas consumidas no Brasil, apenas uma ia para a reciclagem – e não pense que o problema é só brasileiro, percentual semelhante foi encontrado nos Estados Unidos e a Europa saiu-se apenas um pouco melhor, com 30% dos plásticos reciclados.

Por isso, alternativas são sempre bem-vindas. No caso da proposta brasileira, a sugestão é a criação de um filme para embalar alimentos feito de polpa desidratada de vegetais adicionada a um pó de cascas de crustáceos (a quitosana). Até agora, já foram feitos testes com banana, goiaba e mamão. Todos passaram com louvor nos primeiros exames, apresentando resistência igual ou superior ao dos filmes convencionais. Agora o grupo está testando o uso de cacau e cupuaçu.

“Não é impossível criar um plástico seguro para a saúde e é isso o que estamos tentando fazer no nosso estudo: Preparar materiais para embalagens que sejam biodegradáveis e feitos a partir de poupa de fruta, usando compostos seguros e naturais para o preparo do filme”, diz a pesquisadora.

Polímeros pra que te quero

Mas por que tomates e casca de crustáceos viram filme de embalagem? A resposta está na mesma estrutura que permite fazer plástico a partir de derivados do petróleo: os polímeros, longas cadeias formadas por várias moléculas e que, por isso mesmo, oferecem uma resistência maior que a de outras estruturas químicas.

No caso da tecnologia made in Brazil, conta Márcia, a ideia de fazer filme com polímeros comestíveis começou a ser desenvolvida quando ela voltou ao país após um período de estudos na Universidade da California, em Davis, durante o doutorado.

Na instituição americana, referência mundial na produção de filmes comestíveis, Márcia recebeu orientação do renomado professor John Krochta, que nos primórdios dos estudos sobre o assunto, na década de 90, conseguiu encontrar uma maneira de transformar soro de leite em filme para embalagem. A ideia inicial de Krochta, nos anos 90, era criar uma maneira para aproveitar o soro, produto geralmente jogado fora durante a produção de laticínios – lembremos que a Califórnia é o principal produtor de leite nos Estados Unidos.

De lá pra cá, porém, percebeu-se que o potencial dos filmes comestíveis vai bem mais além. A expectativa é de que eles sejam muito mais seguros para a saúde que os plásticos atuais, derivados do petróleo. O efeito bactericida nos filtros comestíveis, por exemplo, pode vir também das plantas. Márcia e sua equipe já testaram o uso de canela para cumprir tal função. Em outros laboratórios pelo mundo, há testes com o orégano.

Embalagens comestíveis reduzirão volumes descartados. Foto: Ingimage
Embalagens comestíveis reduzirão volumes descartados. Foto: Ingimage

Além disso, como são consumidos junto do produto, os filmes comestíveis reduzem a produção de lixo e ainda podem ajudar a controlar o desperdício de alimentos, já que frutas e verduras consideradas “feias” para as prateleiras dos supermercados podem ser aproveitadas em sua produção.

Os usos imaginados para essa nova geração de embalagens também são tantas quanto a imaginação mandar. Além da hipotética pizza do início da matéria, podemos começar a sonhar com tampas de iogurte que lhe dão sabor ou mesmo aves embaladas em filmes que se transformarão em tempero – ajudando os cozinheiros menos experientes a impressionar os convidados na hora de preparar o assado para o almoço de domingo.

E para quem não está muito convencido da ideia de comer o filme junto da refeição, uma informação: você pode nem ter se dado conta, mas é bem provável que já tenha consumido filmes comestíveis em sua vida.

searchÉ o que pode ter acontecido se, alguma vez, você se rendeu à tentação de um pacotinho de M&M’s. As pastilhas de chocolate que “derretem na sua boca, não na sua mão” são uma espécie de avô da tecnologia que Márcia está desenvolvendo. No caso do doce, as casquinhas coloridas foram inventadas para proteger o chocolate e aumentar as vendas durante o verão, evitando que a guloseima tivesse o mesmo fim das outras barras: o amolecimento precoce. Só que pra não ser apenas mais uma casquinha, os fabricantes decidiram adicionar sabor à película crocante que revestia cada uma das pastilhas de chocolate e voilà… Estava inventado o M&M.


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