Sergio Borger, que se define como “inventor”

“Alex”, ouço alguém me chamar. Estou no saguão do prédio da IBM, em São Paulo. Quem será?, penso comigo. Esperava ver a secretária da pessoa importante com quem tenho um encontro. Mas a voz masculina insiste: “Vem cá”. “Sou Sergio Borger”, ele se apresenta. Levo um susto, nunca tinha visto um cara da importância dele receber jornalista no saguão – e antes da assessora. Borger é um dos três mil pesquisadores da IBM espalhados pelo mundo. No laboratório brasileiro, criado em 2010, ele ocupa o cargo de diretor de Estratégia de todas as áreas e coordenador da Área de Sistemas Humanos. “Sou um inventor”, resume ele.

O laboratório de pesquisas é uma área aberta, colaborativa, localizada no térreo. Mesas, cadeiras, painéis, tudo anda sobre rodinhas – e tudo vai se movendo. Os pesquisadores não estão sentados e apáticos. Alguns ficam em pé, outros sentados. Eles conversam sem levantar a voz, examinam resultados. Hoje, as mesas têm essa configuração. Nada impede que amanhã os times sejam montados de modo diferente. “Colaboração é o mais importante. Somos um time pequeno dentro da IBM, mas altamente produtivo. Grande parte das patentes da IBM sai daqui. No ano passado, a companhia submeteu seis mil patentes. Só eu submeti quatro patentes no ano passado”, afirma Borger.

Inovação – Pode falar das patentes da IBM?

Sergio Borger – Estamos fazendo um quadro colaborativo, feito em parceria com Catraca Livre, de Gilberto Dimenstein. (Borger abre no tablet um quadro de fundo preto com quatro colunas desenhadas em branco.) É um painel inteligente, dividido em tópicos que podem ser modificados para cada uso específico. Este tem notícias, com informações do Catraca Livre, mas também posso publicar uma notícia da minha comunidade. Não é para a cidade toda, serve para uma comunidade pequena, de umas 200 pessoas. Anúncio é outra coluna. Procuro uma baby sitter para tal horário. Como acho? Baby sitters se cadastram e oferecem seus serviços. Atrás do quadro, a gente está rodando um algorritmo que faz essa junção. Quando publico que estou procurando por determinado profissional, recebo respostas – na comunidade há pessoas disponíveis para o trabalho. Envio, então, um text message pelo celular para o número acima do quadro, que identifica a comunidade. Esse painel pode ser criado facilmente por qualquer pessoa. Vamos começar a testar isso. Se ficar estável, colocaremos para funcionar abertamente e as pessoas vão poder usar.

Inovação – Há outras?

Borger – (Novamente, no tablet, ele mostra um quadro com espaço para exibir uma foto e um painel com as características do objeto fotografado e descreve a situação. No caso, uma calçada com problemas.) O bacana é que posso ver não só as minhas calçadas, mas as de todo mundo na minha região. Vou registrando todo dia. É aberto, olha quem quiser. Estou ajudando a minha cidade a ver como a cidade é. Não é para cobrar ninguém, é para mostrar. E para saber onde estão os problemas das calçadas.

Inovação – Serve apenas para calçadas?

Borger – O quadro da calçada pode ser o quadro do estádio. As colunas podem ter informações sobre banheiros… Informações dinâmicas, na hora, sobre quantas pessoas entraram, por exemplo. Mas dá para ter informações sobre pessoas perdidas, comida, entradas e saídas, os mapas. Só muda o contexto. Criamos, pensando na inclusão das pessoas nos ambientes. Chamamos esse conceito de cidades conscientes, cognitivas. Vamos ter um estádio consciente de que ele está lá para prestar um serviço.

Inovação – O que é biometria facial?

Borger – Fiz um projeto de biometria facial há alguns anos nos Estados Unidos, quando morei lá. Agora, estamos trazendo para cá. É uma tecnologia altamente utilizável, capaz de identificar não apenas pessoas que entram em um estádio ou teatro, mas pode ser usado em uma situação de emergência, como saber se todo mundo que eu acho que entrou em um ambiente saiu. Conforme as pessoas andam na frente da câmera, capturamos o rosto delas. Não preciso saber quem é, só preciso saber se essa pessoa entrou e saiu. Isso é extremamente importante.

Inovação – Um mecanismo de controle?

Borger – Uma das coisas que fiz no passado e estamos trazendo ao Brasil é a tecnologia de utilizar câmeras para observar a movimentação de pessoas em ambientes fechados. Por exemplo, consigo usar uma câmera para verificar quantas pessoas entraram em um lugar ou quantas pessoas estão na fila de um supermercado ou ainda quantas estão no ponto de ônibus. Esse tipo de quantificação de seres humanos à espera de serviços é importante porque é possível fazer o dimensionamento correto das redes de serviços. O sensor baseado em imagem, quando transformado em informação digital, pode ser interpretado e informar coisas como: normalmente, na segunda-feira, na Avenida Rebouças, é preciso ter 54 ônibus em certo trajeto, pois esse é o volume de pessoas que você vai pegar o transporte em cada ponto. Podemos fazer, então, simulações: se forem colocados 55 ônibus a situação melhora? Vai ter mais ou menos tráfego? E se colocarmos mais táxis? As pessoas, de segunda a sexta, são criaturas de hábitos, seguem rotinas. O dispositivo é capaz de reconhecer até a linha de ônibus que passa em certa rua. Então, o cidadão saberá a que horas o ônibus vai chegar, quantas pessoas estarão dentro dele.

Inovação – Como é possível?

Borger – O ônibus pode ter câmeras. Estamos inventando isso. Essas tecnologias nascem das necessidades de comunicação humana. Nessa plataforma que estamos criando conseguimos colocar todos esses contextos de comunicação.

Inovação – E a parceria com o Laboratório da IBM de Tóquio?

Borger – Estamos desenvolvendo com o laboratório japonês um protótipo chamado City Companion (Companheiro Urbano), a princípio para deficientes visuais, mas poderá ser usado por todo mundo. É uma tecnologia que permite ao pedestre interagir com o dispositivo inteligente ao longo do caminho. O deficiente visual fala para o aparelho o que ele deseja, por exemplo, ir da rua Augusta até o Shopping Paulista. O cego precisa de medidas precisas e a rota desenhada até o shopping precisa ser na calçada. Assim, o pedido do cego vai para um ser na nuvem. Esse olha a rota que o computador sugeriu e ajusta a rota para que a pessoa ande em cima da calçada. Esse dispositivo tem precisão de 1 m e identifica cruzamentos – uma voz vai avisando que faltam tantos metros para o cruzamento. O dispositivo fala na língua do usuário e indica por onde ele está passando, em frente a um restaurante, museu, loja… E ainda pergunta coisas do tipo: “Quer saber o que tem no almoço?”. Se a resposta for sim, o usuário será informado: “Hoje tem bife a cavalo e o preço é R$ 15”.

Inovação – Agora, tudo o que eu queria era um aplicativo para transcrever esta entrevista gravada em áudio para a linguagem escrita.

Borger – Já existe um sistema de transcrição em inglês. Meu time está criando um de reconhecimento de fala em português. É complicado à beça. A primeira etapa é criar um modelo acústico em português. Quando você fala e eu falo, o modelo acústico da gente é muito parecido. Agora, se eu pegar uma pessoa do Nordeste, o modelo acústico dela é diferente. Estamos trabalhando nisso há oito meses e o sistema reconhece dez mil palavras. É pouco.


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