O ambiente é capaz de forjar o comportamento das pessoas ou são as pessoas que definem a cultura de um lugar? A questão é complexa e ainda mais desafiadora quando se trata do Vale do Silício, nos Estados Unidos. Seja por sua história inovadora ou por sua atmosfera tecnológica, a cidade região ao sul de São Francisco, na Califórnia, é a Meca da inovação. Foi lá que nasceram Apple, Google, Intel, HP, Microsoft e Yahoo. E é lá que vive Isabel Pesce Mattos, uma paulistana de apenas 23 anos que já carrega um currículo quase inacreditável: graduada em Ciência da Computação, Matemática, Economia e Administração pelo Massachusetts Institute of Techonology (MIT). “Quando o normal era fazer quatro matérias por semestre, eu cheguei a fazer 13”, diz.
Essa ampla formação já gera frutos. Isabel é sócia de uma startup, denominação para um grupo de pessoas que busca um modelo de negócios, quase sempre cheio de incertezas. Não no caso dela. A Lemon acaba de criar um aplicativo gratuito para celular de controle de gastos pessoais. A grande sacada é que o usuário só precisa tirar uma foto dos recibos em papel e fazer o upload das imagens. Elas, então, são digitalizadas e armazenadas na web para serem acessadas de qualquer lugar. As planilhas de Excell estariam com os dias contados? “Nosso produto ainda é muito novo e estamos descobrindo suas principais aplicações. Em breve, teremos novas funcionalidades”, diz Isabel.
Lançado em outubro, o aplicativo gratuito já registrou meio milhão de downloads na Apple Store. Para expandir seus negócios, a startup conseguiu levantar US$ 10 milhões em investimento de fundos de capital de risco. Com 18 funcionários e filial na Argentina, a empresa tem outras ambições, entre elas lançar o produto na América Latina e se tornar o principal gerenciador de gastos para usuários de smartphones.
Simples equação
Filha de uma família de classe média, Isabel deixou o Ensino Médio de uma escola particular no bairro da Aclimação, na zona sul de São Paulo, com alta habilidade em matemática. Por isso conseguiu bolsa para se preparar para os melhores vestibulares do País. Ela tinha o sonho de estudar no Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), em São José dos Campos, interior do Estado, mas acabou encontrando no MIT o caminho mais adequado para as suas aspirações.
Com 17 anos foi para os Estados Unidos estudar no MIT, um dos maiores centros universitários do mundo. Antes da partida, Isabel precisou dar muita aula particular de matemática para custear a anuidade de US$ 55 mil do MIT. Chegou lá e não parou de aprender.
Durante o curso, trabalhou no Deutsche Bank e na Microsoft – chegou até ser convidada para participar de um evento de jovens estagiários na casa de Bill Gates. “Aqui nos Estados Unidos tem tecnologia, talento, capital e pessoas para ajudar”, diz ela.
Também realizou um mestrado profissional no Google, em Mountain View, em uma parceria entre a gigante de tecnologia e o MIT. Antes de terminar sua pesquisa no Google, Isabel se aventurou em outra empresa: a Ooyala, especializada em desenvolvimento de tecnologias para vídeos na internet. A empresa, que começou com apenas 20 pessoas, cresceu rápido – em pouco tempo, reunia 200 funcionários e clientes do porte do canal de esportes ESPN. Como gerente de projetos, Isabel chefiava uma equipe de 22 engenheiros. Mas ainda buscava no empreendedorismo uma trilha para a carreira.
Foi aí que aconteceu a Lemon. Em novembro, Isabel esteve na Coreia do Sul para apresentar o negócio a parceiros estratégicos de telecomunicações. “Meu papel na Lemon é business. Cuido de parcerias, capitalização do produto, novos negócios”, explica ela, com a desenvoltura de quem já passou meses debruçada em relatórios anuais de empresas norte-americanas apenas para compreender quais estratégias dão os melhores resultados.
Ao mesmo tempo que desafia sonhos sobre família, filhos e cachorros, Isabel mostra segurança nos negócios. Na fala apressada, demonstra senso de urgência para fazer as coisas acontecerem. “Sou vidrada em prazos e metas.” Mas ela também tem capacidade de se posicionar em diferentes contextos e reconhecer que ainda falta muito para atingir o esperado sucesso. “Esses são apenas os primeiros passos de um longo caminho de aprendizado e realizações.”
Para ela, o Vale do Silício proporciona o que há de mais inovador no mundo em termos de tecnologia – e também de pessoas. “Tive sorte de encontrar mentores que me ajudaram a seguir adiante. Os americanos valorizam quem sabe extrair lições do fracasso e segue adiante”, afirma. “Não conseguir não é problema algum. O pecado é não tentar”, diz ela.
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