A terça-feira (8) na Câmara dos Deputados foi tensa. Após uma grande confusão, onde urnas foram quebradas, deputados tiveram de ser separados e o presidente da Câmara, em um ato de censura, cortou o sinal da TV Câmara, os parlamentares aprovaram a Comissão Especial que iria avaliar o processo de impeachment da presidenta Dilma Rousseff. Contestado por muitos, Eduardo Cunha fez mais uma de suas manobras e conseguiu implementar uma chapa formada integralmente por candidatos da oposição, que são a favor do impedimento.
Contudo, a Justiça, literalmente, prevaleceu. O ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal, suspendeu a tramitação do processo e proibiu a avaliação do impeachment pela Câmara até que o órgão máximo do judiciário se pronuncie sobre a questão.
Para a deputada Jandira Feghali (RJ), líder do PC do B, as manobras feitas por Cunha foram uma afronta à Constituição Federal. “O que vimos na sessão, com a adoção de voto secreto e inscrição de chapa avulsa para eleição dos membros da Comissão, violou o princípio da publicidade [ou seja, de tornar público os votos dos gestores que atuam na Casa] e ceifou uma prerrogativa que é dos líderes dos partidos”, disse a deputada em entrevista à Brasileiros. A parlamentar ainda disse que já existe uma resolução do Supremo Tribunal Federal e uma Emenda Constitucional que coíbem o voto secreto.
De fato, o argumento de Jandira tem embasamento. Em decisão recente proferida também pelo ministro Edson Fachin, o Supremo deixou claro que o voto fechado só tem respaldo se indicado expressamente na Constituição, o que não é o caso do processo de impeachment. “Não havendo menção na Constituição à natureza secreta da deliberação, há de prevalecer o princípio democrático que impõe a indicação nominal do voto dos representantes do povo”, diz Fachin em sua decisão.
Oura norma, a chamada PEC do Voto Aberto (43/2013), que determina o voto aberto em diversas situações do Legislativo, como na cassação de mandatos, também abre espaço para uma contestação do voto secreto. “O voto secreto é uma exceção a ser utilizada nos casos devidamente expressos na Constituição, o que não se aplica na votação que se deu. É um golpe dentro do golpe”, disse Feghali. A deputada ainda criticou a cobertura que os grandes meios de comunicação vêm fazendo sobre o impeachment, e afirmou que isso só aumenta a crise política: “A cobertura tendenciosa aumento o clima de instabilidade, que não é bom para ninguém.” Leia a entrevista na íntegra:
Brasileiros – O que muda no atual cenário com a decisão do ministro Fachin?
A decisão coloca um freio nas manobras em curso que desrespeitam a Constituição Federal. Suspende o processo de criação da Comissão Especial, eivado de vícios e ilegalidades, principalmente a partir de um rito golpista forçado goela abaixo do povo brasileiro e do Parlamento por Eduardo Cunha e seus aliados. O que vimos na sessão, com a adoção de voto secreto e inscrição de chapa avulsa para eleição dos membros da Comissão, violou o princípio da publicidade e ceifou uma prerrogativa que é dos líderes dos partidos. O plenário do STF precisará decidir no próximo dia 16 para se ter uma decisão final quanto às ilegalidades patrocinadas pelo presidente da Câmara.
Como a senhora enxerga as manobras de Cunha ontem no Plenário? Quais foram as irregularidades que o presidente da Câmara cometeu durante a formação da comissão? Quais foram os argumentos para o voto secreto?
Houve uma tentativa do presidente da Casa em manobrar votos junto da oposição e de dissidentes da base do governo que, talvez, tivessem outra posição se o voto fosse aberto. O voto secreto não tem amparo constitucional. É um golpe dentro do golpe. Uma manipulação para impor um resultado que melhor se encaixa na estratégia da chantagem. Já há resolução do STF determinando que a deliberação ostensiva, aberta, é a regra, e que o voto secreto é uma exceção a ser utilizada nos casos devidamente expressos na Constituição, o que não se aplica na votação que se deu.
A votação do impeachment do Collor foi secreta?
Desde o impeachment de Collor, muita coisa mudou. Agora temos uma súmula vinculante, que não foi respeitada, que determina que o rito é o da lei. Não há outra interpretação possível para esta determinação. Não há como usar o Regimento Interno em detrimento da lei.
A carta do Michel Temer uniu mais a oposição contra a presidenta?
A princípio não considero apropriado comentar o conteúdo de uma carta de caráter pessoal, mas considero que apequena a história do vice-presidente e o patamar que ele atingiu ao longo de sua vida pública.
A decisão de adiar a avaliação da comissão vai ser boa ou ruim para o governo Dilma?
A princípio, nosso objetivo era estimular o processo para ser superado rapidamente e para que as votações importantes ao país voltassem a ocorrer, que o clima de instabilidade política pudesse ser encerrado. Mas, não podemos admitir que, em prol da celeridade, se descumpra a Constituição e as Leis. Não queremos prolongar em demasia este debate que não tem qualquer sustentação jurídica, mas queremos que ele se dê em rito diferente do que prevê a Constituição e a lei.
Como a senhora avalia a atuação dos grandes meios de comunicação na cobertura do impeachment?
Desprovida de imparcialidade. Grandes interesses estão em curso e a mídia não está imune a eles, o que é lamentável. A cobertura tendenciosa aumento o clima de instabilidade, que não é bom para ninguém.
Qual a expectativa da votação na próxima semana no STF?
A melhor possível. O texto da Constituição é claro, no que se refere a publicidade e aos casos em que se permite a votação secreta. Não podemos admitir que uma sessão como a de ontem seja legitimada, seria uma mancha na História do Parlamento.
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