Sim, o título pode convidar ao engano…, mas é do Líbano que se trata.
Desde julho do ano passado o lixo se acumula nas ruas de Beirute e desde maio de 2014 o país está sem presidente.
O episódio do lixo, que não deixa de ser poderoso como símbolo de um país que não sabe ou não consegue lidar com seus dejetos, contém detalhes, de concessões vencidas e de licitações viciadas, de uma história que se resume na captura dos negócios públicos por oligarquias econômicas que frequentemente são também as políticas.
Numa democracia falha – vá lá que todas o sejam, mas tudo tem limites – tocada por uma herança colonial que tudo organizou em torno das diferentes comunidades religiosas que compõem a sociedade, os interesses particulares e comunitários por vezes funcionam como forças centrífugas em relação ao Estado, sugando-lhe qualquer energia de que se pudesse vir a dotar.
A mesma divisão comunitária, religiosa se quiserem, faz sentir os seus efeitos na questão da presidência vaga.
O presidente deve necessariamente ser um cristão maronita – assim como o primeiro ministro deve ser muçulmano sunita e o presidente do Parlamento um muçulmano xiita. Em parte, portanto, os cristãos libaneses são os primeiros interessados em que haja um presidente para que se vejam “representados” no ordem política interna.
Ocorre, no entanto, que os cristãos libaneses, assim como o país inteiro e todas as suas comunidades, estão divididos em dois grandes campos que têm visões diferentes sobre o destino do Líbano e seu lugar na região e no mundo. Como exercício de síntese, digamos o campo da resistência e o campo da moderação.
O irônico é que um país tão pequeno, em território e em população, acaba adquirindo uma importância desproporcional por funcionar um pouco como termômetro e um pouco como fiel da balança no jogo político regional.
Assim, no cabo de guerra do Líbano, e naquele da presidência, pode-se ver os libaneses puxando a corda de um e de outro lado, mas também a Arábia Saudita, o Irã, a França, os Estados Unidos e uma multidão de outros.
Nada disso afeta, é claro, a beleza e o charme do lugar. Para os seus, tudo isso apenas reforça a crença de estarem de fato no coração do mundo.
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