Juristas ouvidos nesta terça-feira (3) pela Comissão Especial do Impeachment no Senado mostraram a falta de embasamento jurídico do processo. Apesar disso, as explicações não provocaram mudanças nos votos dos senadores favoráveis ao afastamento da presidenta Dilma Rousseff.
O ex-presidente da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) Marcello Lavenère disse que a diferença fundamental entre os processos de impeachment contra Fernando Collor e Dilma Rousseff é que, no caso de Collor, havia crime. “[Agora] não há crime nenhum”, afirmou. Lavenère disse que os senadores sabem que não há crime. Para ele, é inimaginável que pessoas inteligentes acreditem que pedaladas fiscais constituam crime suficiente para desencadear o processo de impeachment de um presidente.
Ele disse que uma parte do País deseja “flexibilizar’ o Estado Democrático de Direito, mas isso poderá provocar “danos terríveis”: “É por isso que tentar resolver uma crise econômica, política, administrativa, uma crise grave, pelo caminho que põe de lado, que flexibiliza, que não respeita as garantias constitucionais, não leva nunca a bom termo. Pelo contrário, a crise que nós passamos não vai ser resolvida com o processo de impeachment”.
Lavenère alertou para os riscos de subverter as regras da democracia: “Na primeira dificuldade, na primeira crise, não se pode flexibilizar essa regra. O Estado Democrático de Direito, se violado, se flexibilizado, acaba o processo civilizatório. Não temos solução fora da Constituição, não temos condição fora da estrita obediência das garantias e dos procedimentos constitucionais”, argumentou.
O diretor da Faculdade de Direito da Uerj (Universidade do Estado do Rio de Janeiro), Ricardo Lodi Ribeiro, demonstrou que a jurisprudência do TCU (Tribunal de Contas da União) permitia as chamadas “pedaladas fiscais” quando Dilma as cometeu e afirmou que qualquer mudança em relação a isso deveria ter sido proposta para o futuro, não de forma retroativa para punir a presidenta.
Ele ressaltou que a mera cobrança de juros não é suficiente para configurar uma operação de crédito e disse que os bancos públicos não foram prejudicados pelo inadimplemento do governo no repasse de recursos referentes a programas sociais: “Não há que se falar em prejuízo aos bancos públicos, em recursos que precisam ser ressarcidos, porque esses recursos nunca pertenceram ao Banco do Brasil”.
Também convidado da Comissão Especial, o professor de Direito Processual Penal Geraldo Luiz Mascarenhas Prado, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, lembrou um caso em que o Conselho Nacional de Justiça submeteu a seus órgãos técnicos uma resolução sobre a edição de créditos suplementares por solicitação da Justiça Militar. Segundo Prado, o presidente do CNJ, ministro Ricardo Lewandowski – que também preside o Supremo Tribunal Federal – aprovou a liberação dos créditos suplementares mesmo após a presidenta Dilma Rousseff já ter, naquele momento, enviado ao Congresso Nacional o projeto de lei com a revisão da meta de superávit fiscal de 2015.
“Se quiséssemos cogitar, o que não é cogitável e nem razoável, a existência um crime de responsabilidade a partir daqui, esse crime de responsabilidade envolveria não somente a presidenta da República, mas também o presidente do Supremo Tribunal Federal. Mas não envolve porque não há crime de responsabilidade. O presidente do STF agiu corretamente, embasado em pareceres técnicos”.
Os argumentos dos convidados, contudo, não conseguiram mudar a disposição dos senadores que já anunciaram votos a favor do impeachment de Dilma, como Waldemir Moka (PMDB-MT). O parlamentar disse que está convencido da existência de crime de responsabilidade por parte de Dilma: “Quero dizer-lhes que, apesar do grande conhecimento jurídico de vossas senhorias, estou convicto de que houve crime de responsabilidade cometido pela presidenta. Esse é o meu juízo pessoal”, disse.
Os senadores governistas, por seu lado, também reafirmaram suas convicções de que o pedido de impeachment não tem fundamento. Ao defender a presidenta, o senador Lindbergh Farias (PT-RJ) disse que os opositores de Dilma tratam o superávit primário “como um deus”: “Primeiro, eles querem pagar os juros para os rentistas e o que sobra fica para o Orçamento, para ser dividido em políticas sociais, em investimento em educação e saúde. O que está por trás disso é uma visão equivocada de uma peça contábil fria. Para nós, o Orçamento tem que ser um instrumento de justiça social, de distribuição de renda, de combate ao desemprego”.
* Com Agência Brasil
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