Verbo, um projeto para além das performances

MARIANA SUCUPIRA E MARISTELA ESTRELA, VERBO, 2012, DESCABIDO (1)
MARIANA SUCUPIRA E MARISTELA ESTRELA, VERBO, 2012, DESCABIDO (1)


Delírio e performance
são fenômenos estreitamente ligados. A sociedade projeta no corpo o seu próprio espírito. O público de uma performance não precisa decifrar nada. A magia tem o poder de evocar algo que sempre está além da percepção e tal metabolização pode se dar no caldeirão onde “ferve” a ação. A Galeria Vermelho, fundada em 2002 por Eduardo Brandão e Eliana Finkelstein, tem provocado a progressiva imersão de um público cativo das performances, dando a chance a esses jovens frequentadores alargarem a lógica poética e se abrirem para uma imaginação analítica. Tudo orquestrado pela mostra de performance VERBO, uma das ações mais duradouras do sistema de arte e dirigida por Marcos Gallon. A VERBO, que comemora 10 anos, até sua 7aedição, ocorria em uma semana em julho, mas, ao se consolidar foi integrada à agenda de exposições. Para marcar o feito, a Vermelho, uma espécie de oráculo que detém a chave do código secreto dos “rituais” visíveis e invisíveis, organiza uma grande exposição. O evento, que ocorre de 15 de julho a 9 de agosto, movimenta, sob o olhar retrospectivo e reconstrutivo da evolução da performance, vários artistas brasileiros e estrangeiros. Nãohádistância entre programa e ação, muito menos entre concepção e realização. As performances não tentam fazer arte. São arte.

ONNO, MAURÍCIO IANÊS, 2012, OBRA APRESENTADA NA VERBO 2012
ONNO, MAURÍCIO IANÊS, 2012, OBRA APRESENTADA NA VERBO 2012

Com a mostra comemorativa, Gallon quer discutir questões relacionadas às práticas de documentação, registro de ações e de performances, por meio de fotos, vídeos, partituras e proposições. As sucessivas apresentações da VERBO parecem ter incorporado o “selo” do tempo, e ir à Vermelho converteu-se em um rito para uma legião de admiradores. Para eles, a galeria também preparou uma exposição de fotos e vídeos, além da 3a edição do seminário Verbo Conjugado, com quatro mesas movimentadas por especialistas de várias áreas e mediadas por Gallon.

A ponte que une, de maneira transcendente, o artista e o espectador é a magia prática e não teórica, como também entende o curador dessa “viagem”. Gallon tem formação em dança, mas está atento a todas as áreas e fala da performance como potência de um ato criativo e não o simples ato em si.

As dezenas de performances programadas têm um raio de ação amplo e a introdução de ferramentas tecnológicas, como programas de computador e aparatos que ampliam os limites do corpo estão na performance/instalação Voice Over (2014), da dupla Detanico Lain. Entre vários outros, há novos campos contemplados, como a pesquisa sobre as possibilidades e limites da linguagem que surge em The Writer (2014), de Maurício Ianês, e em Modelo Vivo (2014), de Fabio Morais.

PERFORMANCE OS AMANTES, ANA MONTENEGRO  E MAURIZIO MANCIOLI, 2012
PERFORMANCE OS AMANTES, ANA MONTENEGRO
E MAURIZIO MANCIOLI, 2012

A performance pode ser paixão, mas também é mercado, afinal a galeria é uma instituição privada. Gallon fala da dificuldade de vender uma performance no Brasil. “Até hoje só conseguimos comercializar uma delas. Esse tipo de obra, para um colecionador, é complexa, tanto na manutenção como na realização.” Vender uma performance era uma hipótese que nem passava pela cabeça de um artista na década de 1980, em pleno boom desse segmento de arte. Parece que na época todos estavam sob a pressão de um imperativo superior. Não se podia sobreviver sem os “jogos” proporcionados pelas performances, nem nos privarmos dos encontros com os ânimos “selvagens” de artistas como Roberto Piva, Hélio Oiticica, Granato, Roberto Aguilar, Nelson Leirner.

 IMERSÃO, TRANSBORDAMENTO E RESISTÊNCIA, MARCO PAULO ROLLA, VERBO 2010

IMERSÃO, TRANSBORDAMENTO E RESISTÊNCIA, MARCO PAULO ROLLA, VERBO 2010

Na história das conquistas das performances, o artista convive com as circunstâncias que o rodeia. Em época de ditadura, os espectadores deveriam ser comedidamente “inocentes” e duplamente “perversos”. Olhando pelo retrovisor, a performance alargou suas bordas, partindo de suportes que tinham o corpo como entorno e significação, passou para explorações do matérico e hoje desemboca em experimentações que fazem uso de outros entornos, a desmaterialização do objeto, a criação da cena virtual e dos mais diversos suportes e mídias.

Em 2016, a performance faz 100 anos e o brilho que iluminou o Café Voltaire, em Zurique, em 1916, ainda nos chama ao delírio. 

Serviço
VERBO
De 15 de julho a 9 de agosto
Galeria Vermelho
Rua Minas Gerais, 372 – São Paulo – SP
11 3138-1520 – www.galeriavermelho.com.br


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