Eduardo Coutinho era considerado um dos grandes cineastas do cinema nacional e o maior documentarista brasileiro. Nesta semana, ficamos tristes e chocados com sua morte, assim como todo o Brasil. Para recordar deste grande brasileiro e da sua preciosa contribuição – voz, ouvidos e coração abertos – listamos suas obras, das mais desconhecidas até os seus principais filmes, como “Edifício Master”, “Babilônia 2000” e “Jogo de Cena”.
1- O Homem que Comprou o Mundo (1968)
Neste primeiro trabalho Coutinho ainda não havia abandonado a ficção, o longa é uma sátira cômica do regime militar e conta a história de José Guerra, um funcionário público no fictício país Reserva 17 que, depois de deixar a noiva em casa, presencia um assassinato de um estrangeiro na rua. Ele tenta ajudar a vítima e recebe um cheque de 100 mil “strikmas” de recompensa, mas quando vai tentar sacar o dinheiro no dia seguinte é preso como falsificador. Mais tarde as autoridades descobrem que o documento é verdadeiro e vale 10 trilhões de dólares. José é obrigado a depositar o cheque e é levado a uma fortaleza-prisão. A riqueza repentina do país Reserva 17 causa uma tensão internacional e a custódia de José é disputada pelas grandes potências.
2- Faustão (1971)
Ainda da época em que o cineasta produzia ficção, esta história é uma adaptação para o cangaço do personagem Falstaff, de Shakespeare, famoso por sua boemia.
3- Seis dias de Ouriciri (1976)
Transitando entre o modelo de documentário socialmente engajado e a liberdade que o uso do som direto e das entrevistas começava a naturalizar, este é um filme essencial na trajetória do documentário brasileiro. Mas não achamos registros na rede.
4- Teodorico, Imperador do Sertão (1978)
O segundo documentário de Coutinho, produzido dois anos depois de Seis Dias em Ouricuri¸ trata de Teodorico Bezerra, um velho representante da aristocracia rural do Rio Grande do Norte. O “Major”, como gostava de ser tratado, possuía cabeças de gado e fazenda de cana e era líder político em sua região. Um bom conversador, contava histórias sem cerimônia, ficou tão encantado com a possibilidade de ser assunto de um documentário no horário nobre da Rede Globo que hospedou a equipe em sua fazenda.
5- Cabra Marcado pra Morrer (1984)
Considerado um dos melhores filmes brasileiros de todos os tempos e, com certeza, o melhor documentário. A narrativa sobre as Ligas Camponesas começou a ser produzida em 1962, a partir do assassinato de João Pedro Teixeira, líder do movimento na Paraíba. O Golpe Militar de 1964 interrompeu as filmagens que só foram retomadas dezessete anos depois. De volta, Coutinho conversou com os camponeses que haviam participado das primeiras filmagens. Sempre com a familiaridade e a desenvoltura que lhe são características, documentou a história das Ligas Camponesas de Galileia e de Sapé. A viúva Elizabeth Teixeira narra a vida de João Pedro, além das dificuldades enfrentadas pela família nas últimas duas décadas de regime militar. A interrupção das filmagens por quase 20 anos fez com que muitas imagens originais se perdessem a parte do material que sobreviveu por conta de muitas artimanhas, uma lata de negativos passou um tempo escondida embaixo da cama de um general, pai do cineasta David Neves, depois de passarem pela Cinemateca do Rio de Janeiro para revelar sob o título falso “A rosa do campo”. Em 2012, as imagens foram restauradas e agora o documentário pode ser visto em belas cores e som mais audível do que nunca.
6- Santa Marta: duas semanas no morro (1987)
A equipe de Coutinho passou duas semanas no Morro Santa Marta, uma favela no Rio de Janeiro, para traçar um retrato sobre a realidade do lugar: religiosidade, música, violência e descriminação. Os moradores falam sobre o tratamento agressivo que recebiam da polícia, das condições de vida, das desigualdades, mas enchem suas falas de esperança por dias melhores. Um dos personagens, um jovem que elogiava as meninas do morro e sonhava em ser desenhista profissional “se as universidades dessem uma chance aos pobres”, se tornou Marcinho VP, chefe do tráfico no morro.
7- O Fio da Memória (1991)
Neste documentário Coutinho trata da identidade cultural negra no Brasil a partir de Gabriel Joaquim dos Santos, um artista popular, trabalhador de uma mina de sal, semianalfabeto. Ele construiu a Casa da Flor, um espaço em São Pedro da Aldeia, no interior do Rio de Janeiro, feito de materiais retirados do lixo. O documentário fala tanto de elementos do imaginário popular como religião e música quanto das consequências do racismo que tenta eliminar esses traços de identidade africana no Brasil.
8- Boca do Lixo (1993)
O cenário desta vez é Itaoca, na região de São Gonçalo no Rio de Janeiro, onde a população pobre ganha a vida vendendo lixo. Os catadores selecionam objetos e comidas que podem ser reaproveitados em meio a um mar de seringas usadas, materiais em decomposição e alimentos estragados – o que chega lá já passou por uma seleção, é o que foi descartado dentro do lixo. A câmera de Coutinho retrata pessoas que, apesar de tudo, não perderam a esperança.
9- Santo Forte (1999)
Filmado nos meses entre a visita do Papa João Paulo II ao Rio de Janeiro em outubro de 1997 e o Natal do mesmo ano, este trabalho trata das diversas experiências religiosas dos moradores da Vila Parque da Cidade, uma favela na Zona Sul do Rio. Entre os 11 entrevistados encontram-se católicos, espíritas, candomblecistas e evangélicos, todos com a crença comum de que se comunicam com o divino através de santos, orixás, guias ou o espírito santo.
10- Babilônia 2000 (2000)
A equipe de Coutinho passou a noite de ano novo de 1999 para 2000 no Morro da Babilônia, no Rio de Janeiro. Durante 12 horas, foram filmados os preparativos para festa do milênio, este morro abriga as únicas favelas da orla de Copacabana com a maior festa de réveillon do mundo. Eles também recolheram depoimentos dos moradores sobre suas expectativas em relação ao novo ano.
11- Porrada (2000)
Internos do Instituto Philippe Pinel encenam o quadro do exame de DNA do Programa do Ratinho. Este curta-metragem foi realizado para uma exposição com curadoria de Marcelo Dantas sobre os 50 anos da televisão brasileira, filmado pela equipe da TV Pinel, no Rio de Janeiro. Mais aqui.
12- Edifício Master (2002)
Muitos dizem que antes de Coutinho o Edifício Master era apenas outro prédio antigo de Copana, foi o documentário que o transformou em lenda. O prédio abriga cerca de 500 moradores, 12 andares, 23 apartamentos por andar, 276 conjugados. A equipe morou no edifício durante três semanas e entrevistou 37 moradores. O resultado foi um retrato da diversidade que caracteriza o local, são pessoas que vivem diferentes realidades, de todas as partes do País e com várias faixas etárias.
13- Peões (2004)
Os personagens de Coutinho desta vez são os metalúrgicos que participaram das grandes greves no ABC paulista no final da década de 1970. O cineasta dá voz aos trabalhadores que permaneceram no anonimato nas manifestações, eles falam sobre suas origens, seus papéis no movimento grevista e sua vida desde então. O pano de fundo de tudo isso é o trabalho nas fábricas, a família, a figura de Lula e suas expectativas para os rumos do País. O longa foi rodado durante a campanha eleitoral de 2002 .
14- O Fim e o Princípio (2005)
Neste projeto, o cineasta fez as coisas de forma não muito convencional: partiu com sua equipe ao sertão da Paraíba sem locações, personagens ou temas definidos. Ele estava atrás de pessoas que tivessem histórias para contar e encontra, em São João do Rio do Peixe, o Sítio Araçás. O local abriga 86 famílias e, por conta da intermediação de uma jovem moradora, lá Coutinho grava histórias de vida marcadas pela fé católica, pela relação de forças e pelo respeito à família.
15- Jogo de Cena (2007)
Para este documentário Coutinho publicou um anúncio em jornal convidando mulheres para contarem suas histórias. Das 83 que responderam ao chamado, foram selecionadas 23, seus depoimentos foram filmados em junho de 2006 no Teatro Glauce Rocha. Em setembro do mesmo ano, as histórias foram interpretadas por grandes atrizes brasileiras, entre elas Marília Pêra e Fernanda Torres.
16- Moscou (2009)
Aqui, o cineasta acompanha o dia a dia dos atores de um grupo de teatro que preparam a peça Três Irmãs de Anton Tchekhov. Em nenhum momento o diretor interfere na atuação dos atores, ao invés disso ele faz um registro da situação. Assim como em Jogo de Cena, a ficção e o documentário se misturam.
17- Um Dia na Vida (2010)
Um filme relativamente desconhecido até agora por conter imagens comprometidas por direitos autorais e de imagem, antes de cair na internet só podia ser exibido publicamente, de maneira grutuita e na presença do diretor. Coutinho selecionou trechos de programas de TV e comerciais gravados durante 24 horas na TV aberta brasileira. Neste apanhado estão propagandas de brinquedos, cenas de Ana Maria Braga jogando Guitar Hero, programas de auditórios, violência urbana, programas de beleza e telejornais.
18- As Canções (2011)
Em 2012, a Revista Brasileiros conversou com o documentarista sobre o seu último. Leia aqui.
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