Pérez-Oramas?foi responsável por várias exposições desde 2003, entre elas, O Alfabeto Enfurecido, em 2009, onde apresentou uma grande retrospectiva de trabalhos de Mira Schendel e León Ferrari que; posteriormente, foi para o museu Reina Sofía em Madri e para a Fundação Iberê Camargo, em Porto Alegre, Brasil.
Convidado recentemente para ser o curador da Bienal de São Paulo 2012, Pérez-Oramas conversou por um longo tempo com a ARTE!Brasileiros e comentou que, apesar de estar ciente do desafio, está entusiasmado com a ideia de trabalhar intensamente para criar o que ele chama de “uma Bienal bem articulada”. Uma Bienal em que a qualidade da articulação de todos os elementos que estão em jogo, que estão envolvidos – artistas, obras, público, espaços públicos e privados -, interajam entre si, criando algo que funcione como uma constelação e não apenas como um conjunto de planetas que brilham.
“Estou mais interessado na ligação entre as obras, os artistas, os espaços e outras instituições, o público e a teoria. Eu insisto nisso. A curadoria é um modo de discurso. O discurso torna-se eficaz na sua articulação. Não bastam palavras bonitas. Devem fazer sentido. Esta é uma Bienal contra o que eu chamo de sociedade do consumo artístico. Todos nos aproximamos, de uma maneira ou de outra, com um espírito de consumo.
Todos nós queremos a última Coca-Cola do deserto, mas eu não sou um curador de hipermercado, que enche o carrinho com os produtos oferecidos nas prateleiras – para explicar de um modo um pouco vulgar.
Acredito que se deve ter uma responsabilidade social, política, cultural e poética.
Queremos obter significado, produzir significado e beleza. Obter um lugar de articulações que possamos dividir com as pessoas.”
Oramas entende que, neste sentido, esse é o propósito da Bienal de 2012, quando ele diz que seu tema ou seu foco será o Retorno à Poética. Mas não se refere literalmente à poesia ou arte da poesia e, sim, às articulações discursivas que tornam a arte algo diferente no mundo.
“Eu quero ler muito bem a história institucional da Bienal, e gostaria de poder responder com algumas soluções que, talvez, foram sendo esquecidas pelo espaço da arte contemporânea. Em geral, a arte moderna foi uma arte em que os discursos dos comentários foram suspensos para produzir outro tipo de discurso, que Merleau Ponty chamou de “vozes do silêncio”, a linguagem indireta. Mas eu acho que a arte contemporânea voltou à qualidade discursiva da arte, voltou à dimensão de uma arte que quer morder a realidade, que quer fazer história, mas ainda o faz com instrumentos modernos e não se pergunta quais são os seus; não se pergunta o que há de específico em seu discurso. Por isso quero falar sobre o retorno da poesia. Que é o que a arte representa e o motivo de ser tão múltipla.”
Outra questão abordada por Oramas foi até que ponto esta curadoria não seria extremamente clássica ou tradicional, colocando o foco sobre os artistas do Brasil e outros países latino-americanos.
“Na metade do século XX a Bienal funcionou como legitimação eurocêntrica da arte brasileira e latino-americana.”
“Hoje, a Bienal começa a funcionar quase como um legitimador da arte internacional no Brasil; quase que se inverte o papel… quero ler esse processo de inversão, como se articula a presença da arte com a sua origem local, e as fontes geopolíticas e internacionais. Vamos identificar, nas manifestações dos artistas e no mundo, momentos de diálogo que tenham efeito de releitura e confrontos.”
Para Oramas, o espaço das Bienais ainda tem um papel fundamental: produzir uma experiência diferente à que tem, por exemplo, a da informação.
Para ele, ao contrário das feiras, as bienais precisam promover uma experiência estética; e para ter valor, essa experiência tem de ser mais articulada e mais discursiva do que a informação.
Nesse sentido, por exemplo, é compreensível que o mercado não tenha lógica. “O mercado tem instinto. A curadoria tem de ser lógica.”, disse Oramas.
“O mercado sempre cria fetiches, o mercado diz: tem valor, tem preço, então faz sentido. Então tem significado. A curadoria tem de dizer: tem sentido, então, tem preço.
Temos o desafio de garantir que a Bienal e suas articulações sejam capazes de produzir novos significados, voltando a fazer sentido. É aqui que se diferencia de feiras, museus, coleções históricas. Uma Bienal tem seu próprio lugar. Vamos falar do que a arte diz e porque diz.”
Quanto às questões sobre pretender desenvolver uma abordagem mais museológica, Oramas diz: “A Bienal quer resistir a uma bienal típica de consumo, de objetos, de modismos.”
Oramas cita o filósofo e escritor italiano Giorgio Agamben e usa como referência seu livro O que é o contemporâneo? e outros ensaios. “Queremos fazer uma Bienal contemporânea, queremos fazer uma Bienal articulada com o passado recente. Mas o contemporâneo supõe não apenas um lugar no presente, mas também exige certa dimensão anacrônica; saber construir uma distância para ser capaz de interpretar o presente.”
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