Coleção particular

Quarenta anos depois e com quase 500 obras, ele acaba de abrir um espaço em São Paulo, Coleção Particular, onde pretende apresentar sua coleção. Filho de diplomatas, acostumou-se, até como profissional da área financeira, a viajar pelo mundo todo. Há quatro anos de volta ao Brasil, resolveu montar o espaço inaugurado em março de 2010. As duas primeiras mostras foram dedicadas à fotografia: Monocromos e Photoimpressões. E foi ali, em Pinheiros, que ele conversou com a ARTE!Brasileiros sobre a presença da fotografia na arte contemporânea e o papel de um colecionador.

ARTE!Brasileiros: O que faz um adolescente se interessar por colecionar arte?
Oswaldo Correa da Costa:
Meu interesse por arte começou após a leitura de uma biografia romanceada de Michelângelo, Agonia e Êxtase. Fiquei fascinado e comecei, então, a ir a museus em busca dos trabalhos daqueles pintores, que até então só existiam na minha imaginação. Virei colecionador na década de 1960, durante um passeio na Itália com meus pais. Paramos em um leilão de arte e meus pais estavam comprando coisas quando apareceu uma gravura do Man Ray. Pedi para meu pai comprar a gravura. Ele comprou o Man Ray por US$ 10. Ao final do leilão, ele me deu a gravura de presente. Foi aí que iniciei.

AB.: Que tipo de colecionador você é? Você compra porque gosta, por investimento ou por generosidade de mostrar, já que montou um espaço para isso?
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O.C.C.: A questão de investimento nunca me passou pela cabeça. Compro o que eu gosto. O que devemos definir é o que é o colecionismo. Acredito que, em um primeiro momento, todos sejam ansiosos por achar que aquele objeto é imprescindível. E, de repente, percebemos ter um acúmulo de objetos, e não coleção. Então, parei com a ansiedade e passei a pensar o que fazer com minha coleção. Daí veio a ideia de montar esse espaço. Você fala em generosidade, eu acho que é o fim de uma neurose (risos). Minhas compras agora são bem dirigidas. Se percebo que falta um item na minha coleção para completar uma ideia, eu vou atrás.

AB.: Quase que profeticamente, a primeira obra da sua coleção foi a de um artista que se tornaria famoso também como fotógrafo, Man Ray. Hoje, a fotografia impera em galerias, museus e discussões sobre a arte contemporânea. Basta ver os vários festivais de fotografias ou eventos como o SP-Arte/Foto. Como você vê esse panorama?
O.C.C.:
À medida que os fotógrafos começaram a ser vistos como artistas (começo do século XX) foi natural o anseio por ocupar lugares de prestígio equivalentes aos da pintura e da escultura. Isso aconteceu. Os fotógrafos começaram a produzir pensando em arte, especialmente os alunos do casal Becher (escola alemã de fotografia nascida no final dos anos 1950). A fotografia começou a competir com a pintura e, hoje, se apresenta como meio contemporâneo por excelência, aproveitando o fato de que a pintura de certa forma esgotou muitas de suas questões formais.
AB.: Como saber em que momento a fotografia muda de status e se ressignifica. Uma foto jornalística de Henri Cartier-Bresson está nos museus, nas galerias, e é considerada arte. Como entender esse processo da fotografia?
O.C.C.:
Você está tocando em um ponto fundamental para mim: quando a fotografia é feita por um fotógrafo, quando ela é feita por um artista que usa a fotografia como uma entre muitas linguagens. Sinto, muitas vezes, que alguns fotógrafos ainda estão ligados à questão tecnológica do meio, e isso se faz ainda muito presente em suas obras, enquanto artistas que usam a fotografia como meio não têm essa preocupação. Outras vezes, isso nem se coloca. Mas acho interessante pensar nessa dualidade quando falamos em fotografia, até para perceber o salto da fotografia de uma expressão técnica – como, por exemplo, fotojornalismo – para uma fotografia como expressão de arte e com toda essa aura do objeto de arte. É isso que, acho eu, a fotografia procura cada vez mais.

AB.: Por outro lado, o que vemos hoje são artistas se apropriando da fotografia, justamente por seu lado técnico e “realista”, enquanto os fotógrafos se afastam cada vez mais do que é a técnica da imagem fotográfica…
O.C.C.:
Sim, isso acontece. Incomoda, porém, quando o fotógrafo procura descaracterizar a fotografia para que ela seja considerada arte. Isso é falso, pois não vem de dentro, é instrumental simplesmente.

AB.: Vamos falar de uma das obras da sua coleção, a imagem criada por escâner feita pelo fotógrafo Guilherme Maranhão …
O.C.C.:
A obra é feita com câmera de escâner, que normalmente se mexe enquanto o papel fica parado, e leva tempo para gerar uma imagem com aparência de instantâneo. Nesse caso, a câmera ficou parada, e as pessoas passaram debaixo dela, e foram gradualmente capturadas com aparência de instantâneo. Gosto do fato da câmera, por ter sido desenhada para fotografar papel, não ter percepção de profundidade, portanto as pessoas parecem de cartolina, têm apenas duas dimensões. Quando se mexem, ficam borradas, com um efeito pictórico meio expressionista, meio Francis Bacon. Mas acho que o que me encanta mais é a estranheza de ver o familiar alterado, é a lembrança de que não existe realidade objetiva, apenas versões, segundo os diferentes aparatos de apreensão.

AB.: Como colecionador, você tem se interessado mais por fotografia nos últimos tempos?
O.C.C.:
Acho que sim. Até um passado bastante recente, no Brasil a fotografia ainda era vista como algo técnico. O fenômeno do fotógrafo-artista é mais recente aqui. Então, sim, é claro que nos últimos tempos passei a me interessar mais por fotografia como expressão artística, tanto a feita por fotógrafos como aquela de apropriação de artistas. Espero ter mais trabalhos de fotógrafos em minha coleção.

AB.: Ou seja, a fotografia hoje é definitivamente reconhecida no mercado da arte?
O.C.C.:
Sim. Ela está cada vez mais se apresentando, por excelência, como o veículo para representar a vida contemporânea.


Comments

Uma resposta para “Coleção particular”

  1. Avatar de Lu Paternostro
    Lu Paternostro

    Olá, boa tarde! Como podemos fazer para visitar a coleção particular do Oswaldo Correa da Costa para marcarmos uma visita? Abraços e parabéns pela matéria!

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