O novo diretor do Malba – Museu de Arte Latino-Americana, em Buenos Aires, o espanhol Agustín Pérez Rubio, 41, é um dos curadores europeus mais próximos da América Latina. Ao contrário de muitos que passaram a olhar para o Brasil, especialmente quando este país se tornou a bola da vez, Rubio frequenta o continente desde os anos 1990, como conta na entrevista a seguir, feita por e-mail, em junho passado, logo após ter inaugurado Tudo Aquilo que Não Está em Imagens, individual de Rosângela Rennó que ele organizou no Centro Atlântico de Arte Contemporânea, nas Ilhas Canárias.
Recentemente, Rubio foi considerado para assumir tanto a curadoria da Bienal de São Paulo como a da Bienal do Mercosul, mas foi Eduardo Costantini, o colecionador e criador do Malba, que já tomou do País o Abaporu, de Tarsila do Amaral, que conquistou Rubio e o leva a Buenos Aires.
Por dez anos, entre 2003 e 2013, o espanhol de Valência foi curador e diretor do Museu de Arte Contemporânea de Castilla y León, na Espanha, um pequeno museu com programação arrojada e que expôs de forma privilegiada a arte latino-americana.
A partir de 1o de agosto, Rubio estará definitivamente na Argentina, após um breve período como curador independente, quando organizou diversas mostras, entre elas a que abriu as comemorações dos 40 anos da Galeria Luisa Strina no ano passado, e Memórias Inapagáveis, sobre o acervo da Videobrasil, que será aberta em agosto, no SESC Pompeia, em São Paulo.
O curador participará como palestrante do III Seminário Internacional ARTE!Brasileiros, que será realizado em setembro, na ocasião da abertura da 31a Bienal de São Paulo, e incluirá uma profunda reflexão sobre a arte contemporânea latino-americana.
Entre seus planos à frente do museu está trabalhar de forma transversal em todas suas áreas (cinema, literatura, educação e artes plásticas), rever a arte dos anos 1960 e 1970 e cuidar da extensão de sua sede.
ARTE!Brasileiros — Ao longo de dez anos à frente do MUSAC, você criou muitos vínculos com a América Latina e parece natural sua indicação ao Malba. O que o levou a olhar para a América Latina com tanto empenho nos últimos anos?
Agustín Pérez Rubio – Provavelmente, meu vínculo por conta do MUSAC foi muito mais visível entre 2003 e 2013, mas desde os anos 1990 realizo projetos, exposições, conferências e seminários na Argentina, Peru, Colômbia, México e Honduras. Naquela época, com cerca de 25 anos, eu viajava muito vendo ateliês de artistas, conhecendo o meio, apresentando ciclos de vídeos ou pequenas mostras, realizando muitos workshops e conferências sobre arte contemporânea. Nesse sentido, meu vínculo sempre existiu e, talvez, um reflexo maior disso se constate na coleção do MUSAC e em sua programação, especialmente no aniversário de 5 anos, quando organizamos o projeto Modelos para Armar…, centrando tanto a exposição como toda a programação do museu por seis meses, na América Latina, e seus distintos contextos.
Como se deu o contato com Eduardo Costantini?
Recebi um e-mail da Fundação Malba, contando que buscavam alguém para o lugar de Marcelo Pacheco, até então curador-chefe do museu, e que eu tinha sido indicado. Queriam me entrevistar, como estavam fazendo com outros. Apesar de conhecer bem de perto o Malba, pelas várias vezes em que lá estive, e ter conversado tanto com Agustín Arteaga, seu primeiro diretor, quanto com Marcelo Pacheco, eu não conhecia pessoalmente o Costantini.
Certamente, você apresentou algumas condições para o cargo. Poderia contar as essenciais?
Para mim, era importante que o Malba saísse reforçado nesse momento de mudança. Assim, minhas condições e as do comitê de seleção foram que o eleito desse uma visão mais transversal do museu, já que não será responsável só pelas exposições e a coleção, mas que olhasse com cuidado para todos os departamentos artísticos do museu. Também é importante a profissionalização do museu, com apoio ao diretor de um Comitê Científico Artístico, que será criado para ajudar os conteúdos e critérios do museu em todos seus âmbitos, além da criação do cargo de um diretor executivo, encarregado do financeiro e do patrocínio para que, juntos, levemos o museu a um novo patamar.
Quais serão suas prioridades no Malba?
Trabalhar com todos os departamentos transversalmente, reorganizar os discursos na coleção e trabalhar mais próximo da reformulação de onde se narra e o que é hoje a América Latina. Finalmente, dar ao museu uma relação entre esse contexto e o contexto internacional, onde essas leituras e relações sejam de ida e volta.
Na coletiva de seu anúncio, Costantini abordou a ideia da ampliação do museu. Uma de suas funções será organizar a criação de um outro edifício para a coleção?
Esse é um projeto de longo prazo, sobre o qual também quero focar, já que os arquitetos que vão projetá-lo necessitam de um programa para isso e precisamos ter muito claras as necessidades do museu, não só agora, mas em 20 ou 30 anos. Quando da criação do MUSAC, estive muito perto de Mansilla y Tuñón, e a arquitetura é uma área que me apaixona e com a qual gosto de trabalhar de perto.
Em agosto próximo, você abre a exposição sobre o acervo da Videobrasil, em São Paulo, agendada muito antes do seu anúncio no Malba. Poderá organizar outras exposições ou ficará exclusivamente na Argentina?
A partir de agosto, vou sair de Toronto, onde residi nos últimos meses, e viver em Buenos Aires, pois não creio que um diretor possa organizar, dirigir e cuidar de um projeto à distância. Mas tenho vários projetos já acertados desde antes de minha escolha e que vou honrar, como a mostra da Videobrasil; a individual de Carlos Garaicoa, em Madri; de Christopher Knowles para a Fonoteca Nacional de México; Sophie Calle para o Centre La Virreina, em Barcelona; e Noites Brancas, em Toronto, essas duas últimas em 2015. Eu estarei concentrado em meu trabalho no Malba, pois essa é minha tarefa como diretor, mas isso não me impede de realizar projetos internacionais, quando isso não interromper o trabalho no museu, já que essa será minha prioridade nesses primeiros anos.
Quais artistas brasileiros gostaria de levar ao museu no início de sua gestão?
Minha relação com o Brasil e seu contexto artístico vem de longe, já que, desde as vanguardas, essa é uma das culturas com grande conteúdo e contribuição para as artes plásticas. É preciso ainda levar em conta que o museu possui um trabalho icônico em sua coleção, o Abaporu, de Tarsila do Amaral, além de outros grandes artistas. De todo o modo, penso que, de início, falta uma revisão dos anos 1960 e 1970, já que não é um período que o museu tenha tocado em especial, não só no Brasil, mas em todos os contextos, incluindo o local. Assim, importantes figuras que têm o início de sua produção nesse período merecem estar na programação, só não posso ainda adiantar nomes.
Museus são instituições um tanto lentas e, por vezes, arcaicas frente a toda tecnologia disponível. É preciso dinamizar os museus? Como?
Certamente! Em primeiro lugar de dentro, na maneira de fazer e comunicar. É muito importante que o público se sinta participante, que as pessoas acreditem que se está falando com elas e que elas se sintam ouvidas. Por isso, é importante que o museu seja com um órgão que cresce, mude de forma, se regenere e consiga viver mais tempo. Creio que um museu que observa a contemporaneidade de seu público é o museu do futuro.
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