Os tempos realmente mudaram e o rumo das artes aponta mais e mais para casamentos nunca imaginados. Alguém poderia pensar, nos anos 1960, Michelangelo Pistoletto caminhando pelos corredores de uma feira de arte, parando para falar com admiradores e ainda adensar os seminários do mesmo evento, cujo objetivo é vender? Pois é, um dos fundadores da Arte Povera e integrante de uma geração arquipolitizada fez tudo isso em Miami, para o bem de seus seguidores.
Intelectualizado, Pistoletto é o crítico preferido de si mesmo, com mais de dez títulos publicados, nos quais mostra erudição em filosofia e história – artes para fundamentar seu trabalho. Por mais de uma hora ele debateu no Art Basel Conversation com o crítico alemão Hans Ulbrich Obrist, co-diretor da Serpentine Gallery, de Londres, cujo projeto é do brasileiro Oscar Niemeyer. Entre vários temas, ele falou sobre a função do espelho em sua obra.
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Pode-se dizer que o espelho é um objeto mágico na obra de Pistoletto e o reflexo tem poderes múltiplos. Logo que se iniciou nas artes, o elegeu como sua problemática e é a base do seu pensamento teórico. Quando seus trabalhos começaram a chamar a atenção nas grandes exposições, se destacavam aqueles executados sobre chapa de aço inoxidável espelhada, sobre a qual Pistoletto sobrepunha serigrafias figurativas, o que proporcionava uma nova visão da perspectiva, da representação de si e dos outros. Enfim, projetava, em tempo real, o passado e o presente.
O uso do espelho é posterior e um dos exemplos mais bem acabados desta série, a obra Mirror II, esteve na Miami Art Basel. A ideia é que o público se incorpore não só ao trabalho, mas também ao entorno. Se hoje o reflexo é rodeado de glamour, o mesmo não ocorria na década de 1960, quando Pistoletto era um artista politizado. Reflexo, naquela época, era metáfora da conscientização do indivíduo, diante de uma realidade político-social que toda uma geração repudiava. Era o tempo das utopias, lutas políticas, algo distante do Pistoletto de hoje. Em 2009 ele brilhou na Bienal de Veneza, que já foi a exposição mais politizada do planeta. Saindo do auditório, a revista ARTE!Brasileiros lhe faz a última pergunta: “Qual a diferença entre participar de uma bienal e de uma feira de arte?” “Para mim, nenhuma. As duas são boas, as duas são válidas”. Ah! Os tempos mudaram mesmo.
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