Um livro como performance

Rose Akras e Rob Visser, "Movement with a rest product: Space", 2011
Rose Akras e Rob Visser, “Movement with a rest product: Space”, 2011

No texto de abertura do livro, o diretor artístico da VERBO,  Marcos Gallon, reconta a trajetória da mostra que surgiu em 2005 como resposta à necessidade de alguns artistas da galeria Vermelho que, na época, careciam de oportunidades para exibir suas performances. Ao longo de suas 11 edições o projeto se tornaria, entretanto, um espaço experimental de encontro entre artistas brasileiros e estrangeiros cujas práticas heterogêneas têm no corpo seu ponto de cruzamento.

Dentre os textos selecionados para VERBO: Mostra de Performance Arte está o curto relato pessoal da artista Carla Zaccagnini, que assume o lugar do público para falar do sentimento de perturbação, incômodo e estranhamento causado pela ausência de distância entre obra e espectador característica do gênero.

Na seleção de obras, apresentadas de forma cronológica, chama a atenção a enorme multiplicidade de práticas, sugerindo que tanto o livro quanto a mostra não representam uma tentativa de enquadramento teórico da performance que transcenda sua experiência em si. Segundo Gallon, a VERBO não se constrói a partir de um tema pré-definido, já que a seleção de artistas e obras se dá através de chamadas públicas que garantem a diversidade de linguagens. Parte importante da história do desenvolvimento recente da performance no País, o projeto desempenha ainda um papel essencial no complexo processo de sua institucionalização. Nesse sentido, o desafio enfrentado por uma galeria comercial como a Vermelho é o mesmo enfrentado por museus: como documentar, preservar e exibir um gênero artístico cuja natureza é a fugacidade? Partituras, figurinos e objetos reminiscentes possuem valor artístico em si – ou apenas atestam uma ausência? Quando começa uma performance? E, mais importante, quando, e se, ela termina? Seriam registros audiovisuais e editoriais capazes de prolongar a performance e seus efeitos no tempo e no espaço?

 projeto gráfico: O excelente projeto gráfico é do Estúdio Campo, especializado em design e comunicação, e que atende principalmente artistas, galerias, museus, arquitetos e editoras. Interessante notar como a questão da tradução é tratada: com textos em português, espanhol e inglês, foram traduzidos para o inglês apenas originais escritos em português, gerando aqui também uma espécie de performance na maneira de lidar com o livro, como destaca Gabriel Zimbardi, responsável pela comunicação da galeria

O excelente projeto gráfico é do Estúdio Campo, especializado em design e comunicação, e que atende artistas, galerias, museus, arquitetos e editoras. Interessante notar como a questão da tradução é tratada: com textos em português, espanhol e inglês, foram traduzidos para o inglês apenas originais escritos em português, gerando aqui também uma espécie de performance na maneira de lidar com o livro, como destaca Gabriel Zimbardi, responsável pela comunicação da galeria

Além de trazer debates acerca dessas questões, o livro é também objeto das reflexões que contém, à medida que ele mesmo é um registro e instrumento de documentação. Muito pertinente nesse sentido é a questão lançada por Liliana Coutinho no artigo “Dar direito de cidade à performance”: como arquivar a experiência? No texto, a curadora discute o papel da atividade editorial no processo de institucionalização da disciplina, afirmando que escrita e edição, à medida que permitem a continuação de um diálogo, apenas iniciado pela performance original, podem prolongar sua vivência, atribuindo a ela novos sentidos no contato com outros sujeitos e campos do conhecimento. “A atividade editorial não deixa que a efemeridade da performance seja análoga ao seu esquecimento” e serve de ponto de partida para experiências da arte expandidas. 

Talvez seja como um ponto de partida para novas experiências que a publicação deva ser entendida. Num campo ampliado, poderia um livro ser uma performance? Se considerarmos que a escrita remete ao corpo do sujeito da palavra, ao seu gesto e intencionalidade, talvez o ato de escrever e de publicar possa ser também entendido como uma prática performática que expressa, nesse caso, o desejo de produzir uma linguagem que se construa no limite entre corpo, palavra e imagem. Como todo bom livro, esse também traz mais questionamentos do que respostas.


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