Ato 2 – Para ter o que contar: um astro

Ir a Roma e não ver o papa? Ir à Paris e não subir na Torre? Vir à Broadway e não ver de pertinho alguém famoso? E como chegar e encantar as pessoas com aquele “eu vi de pertinho como tô vendo você”. Nessa temporada, o blockbuster é o impagável Jim Parsons de Big Bang Theory em An act of God.

Vestido de jeans, camisa e tênis vermelho com uma túnica vagamente divina, cercados pelos anjos Christopher Fitzgerald (“Young Frankenstein”) e Tim Kazurinsky ( “Saturday Night Live”), sentadinho em um sofá, como todo deus que se preza não deixa pedra sobre pedra.

Deus resolve recontar os 10 Mandamentos e se reposicionar, de forma totalmente politicamente incorreta, mas com um ar cool. O sofá branco, como de um apresentador de talk show celestial, fica à frente do palco, abaixo de uma escada que leva a um enorme painel de led. Gabriel/ Tim Kazurinsky é aparentemente inexpressivo, que o ajuda com citações de uma falsa Bíblia de Gutenberg; Michael /Christopher Fitzgerald, que faz um anjo malcriado que anda pela platéia, microfone na mão, recolhendo perguntas malcriadas.

E Deus age como Deus: só responde ao que quer, desqualifica outras, esclarece algumas. O tempo todo enfatiza que suas palavras e ações foram mal interpretadas ao longo dos milênios e, lembra, que o que devemos receber é a sua sabedoria. O sotaque texano de Jim Parsons torna Deus um colega, alguém totalmente acessível e agradável.

Ao colocar a incoerência de vários episódios bíblicos – a virgindade de Nossa Senhora , uma arca micro como carregaria um par de todos os animais – assim como os considerar que Deus é capaz de ajudar” ou “prejudicar” resultados desportivos, a peça na verdade trata da capacidade de o homem acreditar em qualquer coisa que lhe digam para ser dominado, perder a capacidade de escolha ou de decisão.

Com o texto afiado, demolidor em muitos momentos, todo questionamento é : como você acredita; como você atribui a um outro tanto poder? Como você apela a um outro? Como você não sai dessa camisa de força? O texto da peça é uma adaptação do twitter @TheTweetofGod, enorme sucesso de Javerbaum, que o transformou em livro e transforma aquilo que seria um stand-up em algo com muito mais consistência, com Jim Parsons se comportando livremente como um teólogo amador.

A direção de Joe Mantello um clássico broadwayano premiado( como ator e diretor) traz um ritmo excelente para comédia, pois existe tempo entre as piadas e as gargalhadas. Há inteligência e um tempo para pensar e rir. O que é ótimo, porque aí a piada vai além. Ao final, Deus e os anjos caem numa balada rock, dançam , cantam e colocam o 10o mandamento que traz o verdadeiro sentido da peça. E saímos ainda às gargalhadas com a certeza que melhor do que contar aos amigos e parentes que vi Jim Parsons de pertinho, é que assisti a uma das melhores comédias.


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