Eu imaginei que os jornais e os sites de hoje trariam vastas matéria acerca do misterioso assassinato do sócio de Olacyr de Moraes, ontem, no Morumbi, em São Paulo. Não encontrei nada.

Para mim, há muitas perguntas a serem respondidas. O que sabemos até agora é a versão do assassino – Miguel Garcia Ferreira, de 61 anos, que se apresentou como segurança e motorista de Olacyr. Ele contou que sua futura vítima – o ex-senador e ex-ministro boliviano Andrés Guzman – estava saindo da casa de Olacyr, na sexta (4), pela manhã, com uma maleta contendo 400 mil reais. Segundo Ferreira, fruto de extorsão. 

Então Ferreira pede uma carona ao ex-ministro. Alguns quarteirões adiante, o motorista aponta a arma para Guzman, eles entram em luta. O carro desgovernado choca-se com um poste. O motorista mata Guzman com três tiros na cabeça. Pega a maleta, pede carona a um veículo que passa e logo é interceptado pela polícia. 

Nas declarações iniciais informa ter agido por vontade própria, tomando as dores do patrão, fragilizado por doença, aos 83 anos.

Conheci Guzman em fins de 2012. Quem o apresentou foi o cônsul geral da Rússia em São Paulo, Mikhail Troyanski. Guzman estava se preparando para uma viagem à Rússia na comitiva da presidente Dilma. Queria negociar minérios raros. Ele então me convidou para almoçar num restaurante fino da rua Amauri. Já não me lembro o nome. O cara era extremamente sedutor. Falava com ligeiro sotaque espanhol. Era do tipo que sempre sorri, e está “de bem com a vida”, como se diz. A partir dali trocamos telefones e nos falamos várias vezes.

Ele propôs que eu o ajudasse a resgatar a imagem do Olacyr. Não era justo o quase ostracismo a que foi relegado depois da queda de seu império da soja – queixava-se ele. Falava de Olacyr como de um irmão mais velho. Sabia de toda a vida do “sócio”. Ele nunca contou qual era a sua parte na sociedade. O que ele contou é que como ministro das Minas e Energia da Bolívia ajudou o empresário a prospectar minas no país.

Em todas as conversas que mantive com ele não faltavam elogios a Olacyr, seja como empresário, seja como bon vivant. “Você e todos aqueles que têm uma mulher só, são malucos”. Essa era uma das máximas de Olacyr que Guzmán repetia entre risos. “Mas eu não troco a minha mulher por todas dele”, dizia.

Eu sempre o encontrava na Itaoeste ou OFM, ambas no mesmo endereço: meio andar num luxuoso condomínio empresarial da avenida Juscelino Kubitscheck, dividido com empresa de Amilcare Dallevo, o sócio majoritário da RedeTV!.

Guzman vestia-se com elegância. Fazia questão de vestir-se bem e bem vestir a mulher. Depois da viagem à Rússia queixou-se por ter sido “obrigado” a comprar um casaco de pele por 20 mil dólares para ela. Certa vez me convidou para um jantar com um grupo de amigos seus. O restaurante, francês. Não havia cardápio, o chef é que ia colocando um prato atrás de outro à frente dos clientes perfumados. Tomávamos vinho. Nem me lembro do que foi servido, a não ser o prato final. A sobremesa. Sorvete de cachaça. Não acreditei! Todos saboreando vinho e vem um sorvete de cachaça! Mas nem Guzman nem algum de seus convidados refinados estranharam.

Depois Guzman começou com a história do livro.

“Precisamos fazer um livro para contar a história do Olacyr, me ajude nisso. Vamos lançar no Congresso Nacional”. Tudo bem, eu posso escrever, eu dizia.

“Ah, mas ele quer um best-seller”. Ele já tinha falado com vários jornalistas. E eu disse: “bem, posso escrever em parceria com meu amigo Nirlando Beirão”.

“Ah, que ótimo, tudo bem, vamos almoçar com ele”. Nirlando aceitou almoçar, mas não apareceu no Café des Arts. Guzman não perdoou. “Este está fora!”. Eu então apresentei outra best-seller para ele: Regina Echeverria. A primeira coisa que ela disse foi que trabalhar no livro custaria 100 mil reais. Guzman refugou. Olacyr não queria pagar nada. Ele já ia fornecer a história (e de graça). Ficamos assim.

Alguns dias depois, Regina encontra num programa de TV um cara que se apresenta como advogado do Olacyr. Ela conta a respeito do encontro com Guzman e de sua insistência em que Olacyr não queria pagar nada ao autor. O advogado confirma que Olacyr quer escrever um livro, mas não é Guzman quem trata disso e sim duas assessoras do empresário. Ele marca encontro da Regina com elas. As assessoras são duas jovens muito bonitas e com toda a pinta de modelos. Elas escutam toda a história, inclusive quanto o livro custará e parecem concordar com tudo. Fim da reunião. Passam-se dias: elas não entram em contato. Guzman passa meses sem falar comigo. Me chama novamente em setembro do ano passado.

“Olha, precisamos conversar, agora o livro vai sair”. Vou de novo à sua sala, onde ele – de novo – está sorridente, sempre tecendo comentários irônicos. E então me pede um plano a respeito do livro.

“Ah, você quer que a editora mande um contrato?”
“Quero.”

A editora manda o contrato. As cláusulas são claras: Olacyr não paga nada ao autor, quem paga é a editora. Encaminho o contrato a Marcela, secretária de Guzman. Nunca mais tive retorno, apesar dos meus e-mails e telefonemas, que ele nunca mais atendeu. Eu nunca mais soube dele até ler a notícia de que foi assassinado pelo motorista do Olacyr quando estava de posse de uma maleta contendo 400 mil reais.

São muitas as questões para a polícia responder:  

1) Se o empresário estava sendo vitima de extorsão por que não comunicou à polícia?
2) Como o motorista dele sabia que seu patrão estava sendo extorquido?
3) Quando foi acertada entre o empresário e Guzman a entrega do dinheiro?
4) Por quê a operação foi feita em dinheiro vivo?
5) A operação tem alguma coisa a ver com a expedição de licenças de exploração de minérios raros que o empresário estava negociando com a Rússia?
6) A operação tem alguma coisa a ver com alguma dívida que o empresário teria com Guzman?
7) Por quê o motorista estava armado se era apenas motorista?
8) Ferreira foi o autor solitário do plano de matar Andrés Guzman?
9) Um homem da idade e da posição social de Olacyr de Moraes será chamado a depor?


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