Você, caro leitor, compraria um cavalo morto por US$ 266.000,00? Não? E se o referido equino fosse uma celebridade do passado, tido como o mais inteligente de sua espécie, em todos os tempos? Pois saiba que a Christie’s, famosa casa de leilões, vendeu exatamente isso, na semana passada em Nova York. O animal é um palomino dourado, falecido em 1963, mas ainda em perfeito estado de conservação, embalsamado em um empinar eterno. Está devidamente paramentado com sela e arreios finamente trabalhados. Em seus tempos de ação, deu muito trabalho a malfeitores e salvou a traseira do dono inúmeras vezes. Não falava, mas entendia perfeitamente o idioma inglês. O nome dele é Trigger, antiga montaria do cowboy Roy Rogers.
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Caso eu estivesse nadando em dinheiro, teria comprado o Trigger até pelo dobro do preço. Fui macaca de auditório do cavalo. Roy Rogers está firmemente postado como primeiro herói no altar de meus ícones da infância. No meu ranking, o chamado “cowboy cantante” só perdia – por muito pouco, digamos: um nariz – para meu pai. E o ginete recém-leiloado me empolga, ainda hoje, mais do que o “cavallino rampante” da Ferrari. Preferiria ter o palomino empinando em minha sala de estar, que uma Ferrari Enzo 2011 na garagem.

Infelizmente, quem terá o privilégio da companhia do bicho é a RFD-TV, emissora ruralista americana a cabo. Trigger ficará recepcionando os visitantes da empresa no salão de entrada. Um lugar de destaque merecido, já que o animal embalsamado foi o segundo item mais caro dos lotes de antigas posses do casal Roy Rogers e Dale Evans. Rendeu mais do que o magnífico Pontiac Bonneville, 1963, que transportava o cowboy quando ele dava folga ao cavalo. E olha que o carro é um conversível V8 com 280 cavalos. O fiel “Bullet” – um pastor alemão que se comunicava fluentemente com seus donos, quando ainda não estava empalhado – rendeu meros US$ 35 mil. Eu teria pagado muito mais por ele. Felizmente, os dois animais vão permanecer juntos, já que foram arrebatados pela mesma pessoa jurídica.

O que mais rendeu no leilão foi a sela preferida de Rogers, alavancando US$ 386.500,00. Infelizmente, não consegui informações sobre o valor obtido pelas duas pistolas prateadas, com cabos de madrepérola. Meu pai trouxe ao Brasil cópias fiéis desses berros, quando veio aos Estados Unidos, na década de 1950. Portei aqueles armamentos de brinquedo em combates privados contra bandidos.

No total, a Christie’s amealhou US$ 2.9 milhões pelas posses terrenas daquele que, para mim, foi o maior mocinho de todos os tempos. As peças faziam parte da coleção do Museu Roy Rogers e Dale Evans, que fechou suas veneradas portas em Branson, Missouri. Por mais inacreditável que possa parecer, o museu não estava atraindo visitantes e abriu falência.

Rogers morreu aos 86 anos, em 1998. Na época, ele era mais conhecido pela cadeia de lanchonetes que levava seu nome, mas não lhe pertencia. É uma vergonha o fato de quem fazia hambúrguer de bandidos, cantarolando baladas entrementes, acabasse confundido com casa de cachorro-quente. Mas Deus é justo: a RFD-TV, de Omaha, Nebraska, diz que usará Trigger e Bullet como coadjuvantes de Roy Jr. – filho do herói – na reapresentação de episódios do seriado do cowboy. Pretende-se cativar novas gerações de fãs com os filmes.

Na grande pradaria do céu, Trigger deve estar contente, ruminando umas graminhas e ouvindo Roy serenar Dale, com Bullet fazendo contracanto com uivos afinados. Só sentem falta de alguma ação, já que no paraíso, como se sabe, não tem bandidos.


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