A ideia de Donald Trump de levantar um muro “impenetrável, alto, poderoso e bonito” na fronteira com o México tem antecedentes na própria região. Dos cerca de 3,1 mil quilômetros da fronteira, um terço já está demarcado por diferentes tipos de cerca. Trump diz que vai murar mais 1,6 mil quilômetros e deixar que obstáculos naturais, como o Rio Grande, façam o resto do serviço.
No caso americano, a meta é impedir a entrada de imigrantes ilegais, mas as razões para separar países e pessoas por meio de muralhas variam muito. Dois séculos antes de Cristo, o império da China lançou mão da arquitetura militar para se prevenir de ataques e invasões estrangeiras. Com mais de nove mil quilômetros de extensão e repleta de torres, a Muralha da China é até hoje o mais grandioso exemplar da espécie.
Em algumas regiões, os muros servem para demarcar ideologias e impedir o livre trânsito das pessoas. Nessa linha, a mais famosa construção da história contemporânea é o Muro de Berlim, que começou a ser construído sem aviso prévio, na madrugada de 13 de agosto de 1961, por determinação do líder da Alemanha oriental (comunista), Walter Ulbricht. Naquele ano, cerca de duas mil pessoas tinham fugido do país através de Berlim, cidade então dividida.
É que, depois da Segunda Guerra Mundial, a Alemanha derrotada fora ocupada pelos aliados e dividida em duas: a ocidental, dominada pelos Estados Unidos e aliados; e a oriental, ocupada pela União Soviética. Berlim, por sua vez, que ficava na parte oriental (comunista) da Alemanha, foi ela própria dividida em zonas de ocupação: a ocidental (americana-britânica-francesa) e a oriental (soviética).
Dessa forma, descontentes do lado comunista podiam passar para o lado ocidental apenas atravessando a rua. Daí a construção do muro. Mas, assim como começou a ser erguido, o Muro de Berlim foi derrubado sem aviso prévio, em 9 de novembro de 1989, no processo de implosão do bloco soviético no Leste Europeu.
Só que, em vez de diminuir, o número de muros em fronteiras aumentou depois da queda do Muro de Berlim. Eram 16 quando o mundo comemorou a derrubada que permitiu a reunificação da Alemanha. Hoje são 65, de acordo com a pesquisadora Élisabeth Vallet, da Universidade de Quebec, no Canadá, que incluiu na relação a cerca de arame farpado entre as duas Coreias, a última fronteira da Guerra Fria.
Até em Ceuta e Melilla, enclaves espanhóis no continente africano, a paisagem é cortada por cercas de arame, similares às que proliferam na Hungria e na Turquia, para impedir a entrada de refugiados sírios na Europa. Lembram pouco os muros equipados com tecnologia de ponta que Israel vem construindo desde em 2002, ao redor e por dentro de Territórios Palestinos Ocupados (Cisjordânia e Jerusalém Oriental).
Em 2004, esses muros foram declarados ilegais pelo Tribunal Internacional de Justiça de Haia, por atravessar terras palestinas e isolar cerca de 450 mil pessoas, mas Israel não acatou a decisão. Duas outras barreiras construídas pelo governo israelense também são motivo de controvérsia: a que separa Israel e a Faixa de Gaza e a que separa a Faixa de Gaza e o Egito.
O certo é que, sejam de concreto, sejam de tijolo, arame ou com raios infravermelhos, muros não costumam resolver nenhum problema. Basta olhar para trás. Foi difícil, mas a Grande Muralha não impediu que Gengis Khan e seu exército mongol conquistasse a China em 1206. As fortificações em torno de Constantinopla, hoje Istambul, também não barraram a invasão otomana em 1453. O Muro de Berlim caiu junto com o comunismo. O muro de Trump pode até ser erguido, mas não tem futuro.
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