O embaixador que tinha nome de guerra

Edelstam no Chile, antes do golpe de Pinochet – Foto: Reprodução
Edelstam no Chile, antes do golpe de Pinochet – Foto: Reprodução

Anataílde pensou que iria para a tortura – ou fuzilamento – quando chamaram seu nome. Era assim no Estádio Nacional, em Santiago do Chile, repleto de prisioneiros políticos depois do golpe militar de setembro de 1973. Para a surpresa de Anataílde, filha de Francisco Julião, líder das Ligas Camponesas no Brasil, em vez de torturada e morta, ela foi libertada.

Quando saiu do estádio, a brasileira de 29 anos teve outra surpresa: “Na chuva fina, um senhor muito alto olhou para mim e abriu os braços. Ele estava do lado de um carro preto”. Era Harald Edelstam, embaixador da Suécia no Chile, que salvou mais de mil pessoas perseguidas pela ditadura implantada pelo general Augusto Pinochet.  

Anataílde já tinha ouvido falar no diplomata. Dias antes de ser solta, o oficial chileno Iván Lavanderos a procurou no estádio, para contar que o embaixador da Suécia estava com os filhos dela, Alexina, de 7 anos, e Anaximandro, um ano mais novo. “Soube mais tarde que esse oficial foi assassinado pelos próprios colegas.”

Com o presidente Salvador Allende, que morreu no dia do golpe – Foto: Reprodução
Com o presidente Salvador Allende, que morreu no dia do golpe – Foto: Reprodução

Edelstam, por sua vez, foi obrigado a deixar o Chile três meses depois do golpe, considerado persona non grata. Antes, fez história. Sob tiroteio, ele entrou na embaixada de Cuba, que estava cercada por tanques. Trocou a bandeira de Cuba pela da Suécia, transformando a embaixada em território sueco e resgatando todos os funcionários da representação cubana.

Com a ajuda do capitão Lavanderos, aquele que foi morto pelos próprios colegas, Edelstam também parou um ônibus em frente ao Estádio Nacional e nele embarcou 58 tupamaros que estavam prestes a ser fuzilados. Não por acaso, o embaixador, que morreu em 1989, é considerado herói no Uruguai, assim como no Chile.

Selo do Uruguai, em homenagem ao diplomata – Foto: Reprodução
Selo do Uruguai, em homenagem ao diplomata – Foto: Reprodução

“Ele era um homem de uma coragem incrível”, afirma o advogado Jair Krischke, presidente do Movimento de Justiça e Direitos Humanos, aqui no Brasil. “Edelstam foi além da solidariedade. Ele arriscava a própria vida para salvar as pessoas.” Por iniciativa de Krischke, uma praça de Porto Alegre receberá esta semana o nome do embaixador sueco.

A atuação de Edelstam no Chile é tema do filme The Black Pimpernel, lançado em 2007, com o ator sueco Michael Nyqvist no papel do embaixador. The Black Pimpernel (O Cravo Negro) era o nome de guerra de Edelstam nos anos 1940, quando começou a salvar vidas. Trata-se de uma referência ao romance Pimpinela Escarlate, publicado em 1903 pela inglesa Baronesa Orczy.

O livro é sobre um grupo de ingleses que, durante a fase do Terror da Revolução Francesa, salvava nobres franceses da morte na guilhotina. Em Oslo, na Noruega ocupada pelos nazistas, Edelstam dava recepções na embaixada ao mesmo tempo que abrigava judeus e integrantes da resistência no porão da representação diplomática.

O embaixador na Guatemala, antes de servir no Chile – Foto: Reprodução
O embaixador na Guatemala, antes de servir no Chile – Foto: Reprodução


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