O professor de tortura e o chefe de polícia

Dan Mitrione
Dan Mitrione (de sobretudo branco), em frente ao Palácio da Polícia, em Porto Alegre, em junho de 1964. Foto: Movimento de Justiça e Direitos Humanos

“A dor exata, no lugar exato, na quantidade exata, para obter o resultado desejado”. Dan Mitrione, o autor da frase, jamais imaginaria, mas a “técnica de interrogatório” e sua assinatura estão inscritas em uma placa instalada há um ano na calçada do Palácio da Polícia, em Porto Alegre. Iniciativa do Projeto Memória, a placa denuncia que brasileiros foram torturados e mortos nas “masmorras” do palácio.

Agente do governo americano na América Latina nos anos de chumbo, Dan Mitrione atuou no Brasil antes, durante e depois do golpe de 1964. No final de junho daquele ano, o instrutor de tortura – especializado na aplicação de choques elétricos – esteve em Porto Alegre. No Palácio da Polícia, ele deu um curso para policiais gaúchos. E posou com seus pares na entrada do prédio, em fase final de construção.

Na fotografia, Dan Mitrione é aquele que usa óculos e sobretudo branco. Na época, o chefe de polícia do Rio Grande do Sul era o major Leo Guedes Etchegoyen, mais tarde general. Integrante de uma família de militares linhas-duras, Leo Etchegoyen é pai do general Sergio Westphalen Etchegoyen, que o presidente interino Michel Temer acaba de nomear como ministro-chefe da Secretaria de Segurança Institucional.

Não por acaso, o recém-nomeado ministro é crítico ferrenho dos trabalhos da Comissão Nacional da Verdade (CNV), que incluiu o general Leo Etchegoyen, já morto, na relação de 377 “autores de graves violações de direitos humanos” durante a ditadura. Junto com a família, ele protestou formalmente. Como resposta, a comissão detalhou a trajetória do militar.

Essa não foi a única citação envolvendo familiares do general em termos de violação aos direitos humanos. Um tio dele, Cyro Guedes Etchegoyen, que também já morreu, foi apontado pelo coronel Paulo Malhães como responsável pelo centro clandestino de tortura conhecido como Casa da Morte, em Petrópolis, Rio de Janeiro.

Dan Mitrione, que chegou a ser nome de rua em Belo Horizonte, teve destino trágico. Depois da temporada no Brasil, ele foi destacado para “assessorar” a polícia do Uruguai, onde foi sequestrado e morto pelos tupamaros, em agosto de 1970.

Três anos depois, o cineasta Costa-Gravas lançou o filme Estado de Sítio, inspirado no professor de tortura, interpretado por Yves Montand. Em uma das cenas do filme, a aula de tortura acontece em um espaço “decorado” com a bandeira do Brasil. No link do filme, abaixo, a cena da aula começa nos 35 minutos e 30 segundos:


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