O último romântico

O ator Alexandré Constantino, autor da ação "Escrevo Cartas de Amor" (Foto: Marcelo Pinheiro)
O ator AlexandrëA Constantino, criador da ação Escrevo Cartas de Amor (Foto: Marcelo Pinheiro)

Em meio ao Quadrado, coração secular de Trancoso, no litoral sul da Bahia, a imagem de um jovem diante de uma mesa e duas cadeiras dobráveis de madeira desperta minha atenção. Sob a mesa, dois cadernos, repletos de manuscritos em esferográfica azul, e um cartaz que anuncia “Escrevo Cartas de Amor”.

O personagem por trás desta ação é o ator e performer AlexandrëA Constantino. Incumbido de cobrir a quinta edição do Festival Música em Trancoso*, claro, não perco a oportunidade de entender o que há por trás de seu gesto poético. A seguir, um breve bate-papo com o ator.    

Brasileiros – Como surgiu Escrevo Cartas de Amor?
AlexandrëA Constantino – Trabalho com ações e intervenções urbanas em várias cidades do País. Aqui em Trancoso surgiu a ação Escrevo Cartas de Amor, em que, durante sete dias, por sete horas, faço um trabalho meditativo – costumo ficar à base de água durante esse tempo – para poder receber inspiração não só das influências textuais que tenho, como também do universo, que conspira e traz leituras da vida poética de cada um para que eu possa escrever as cartas.

Como tem sido a resposta do público?
O relacionamento com as pessoas tem sido bem interessante. Muitos têm o desejo de escrever uma carta, mas tem vergonha de se abrir. É estranho, para mim, enquanto artista, perceber que uma obra, às vezes, precisa de um preço, porque, se eu não cobro um valor, muitas pessoas nem sequer sentam na cadeira.

As pessoas sugerem a narrativa ou você cria livremente?
A ideia é deixar o relato o mais livre possível. Mas é interessante perceber que a maioria das pessoas preferem que eu escreva as cartas, que crie poesias de próprio punho. Mesmo assim, sinto que esse processo tem um fluxo que corresponde mais com os desejos das pessoas do que com minhas inspirações. O momento da escrita é um momento de reflexão.
 
Como você define a ação?
É muito mais do que o desejo de escrever cartas. É um chamado para  reavaliar as relações humanas. Muita gente passa por mim, para e, na verdade, não quer escrever uma carta, mas conversar sobre o amor. Para aqueles que não pedem cartas, deixo sempre a sugestão de escrevê-las em casa, para seu marido, sua mulher, seus filhos, familiares e amigos que estão distantes. Escrever cartas de amor é uma ação artística e ao mesmo tempo micropolítica. Quando você pega uma caneta ou um lápis para escrever algo para alguém, diferentemente de escrever na internet, vive um momento mais reflexivo do que a digitação frenética do dia a dia no computador.

Ao final de cada dia, como você se sente?
Eu me sinto vivo. Não sou rico, não sou milionário, mas descobri na arte o potencial de estar vivo em vida. Essa ação, para mim, tem valor significativo, não financeiro, algo muito maior, porque tem valor de vida, para a vida.

MAIS: 

Leia a cobertura das três primeiras noites do festival 

* O repórter foi a Trancoso a convite do Festival Música em Trancoso


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