Filmes politizados dão o tom da Mostra de Cinema de Tiradentes

xibição do documentário " PITANGA " direção: Beto Brant e Camila Pitanga no Cine Praça - Foto Leo Lara/Universo Produção
Exibição do documentário “Pitanga”, de Beto Brant e Camila Pitanga, no Cine Praça – Foto: Leo Lara/Universo Produção

Em uma fila, à espera do filme que vai começar, dois garotos conversam sobre a Mostra de Tiradentes. Nascidos na cidade histórica, eles comentam o público atraído pelo evento com seus “filmes esquisitos”. Na mesma fila, um grupo de amigos debate calorosamente o longa-metragem Era O Hotel Cambridge, de Eliane Caffé. Ainda no mesmo espaço, cachorros circulam entre jovens, críticos e diretores, todos no aguardo da próxima sessão.

É esse clima festivo que impera na cidade histórica até o dia 28/1. Com 108 filmes ocupando três espaços de Tiradentes, a mostra comemora 20 anos desde que foi fundada Raquel Hallak, com filmes projetados numa lona de circo. De lá pra cá, a mostra conquistou relevância no cenário nacional, já tendo exibido obras de Gabriel Mascaro, Kleber Mendonça Filho e Ardiley Queirós.

Neste ano, o festival homenageia as produtoras e diretoras Helena Ignez e Leandra Leal, cujo filme Divinas Divas foi exibido na abertura da mostra. As duas pontuaram os desafios enfrentados pelas mulheres no cinema. 

Helena Ignez, Leandra Leal, homenageadas da 20ª Mostra Tiradentes  Foto Leo Lara/Universo Produção
Helena Ignez, Leandra Leal, homenageadas da 20ª Mostra Tiradentes Foto Leo Lara/Universo Produção


Nesta edição, a política é um dos focos centrais. “Diante de todos os acontecimentos de 2016, queria fazer uma mostra que dialogasse com o momento político que estamos vivendo. A partir disso, criei essa ideia do cinema como uma resposta à situação do País”, afirma o curador dos longas-metragens, Cleber Eduardo.

Porém, ele enfatiza que não escolheu filmes “que se legitimem apenas por serem politizados, mas que utilizam os instrumentos do próprio cinema para propor questões interessantes”.

Eduardo ainda afirma que a exibição de obras polêmicas é essencial. “Se quisermos apenas estabelecer consensos, é melhor fecharmos a mostra. Criar ruído é necessário.” Como exemplo, ele cita o longa Entre Homens de Bem, de Caio Cavechini e Carlos Juliano Barros, que acompanha o cotidiano do deputado federal Jean Wyllys (PSOL) em sua luta contra a homofobia.

Eduardo gostaria muito que o filme fosse apresentado na praça da cidade, onde é exibida parte da programação. Porém, por conta da classificação etária – de 14 anos –  o longa não pode ser projetado no local. “É contraditório porque os deputados de direita podem propagar seu discurso homofóbico na TV Câmara, em pleno horário nobre. Por que, então, nós não podemos exibir o nosso filme na praça?”, questiona.

Exibição na mostra regional. Foto Jackson Romanelli/Universo Produção
Exibição na mostra regional. Foto Jackson Romanelli/Universo Produção

Mostra Aurora

Nesta edição também se comemoram os 10 anos da Mostra Aurora, espaço dedicado à descoberta de jovens realizadores. Desde a sua primeira sessão em 2007, a mostra apresenta filmes independentes, que não contaram com nenhum financiamento público.

Em conversa com o público, Eduardo comentou a situação do cinema brasileiro: “Lamentavelmente, o que eu sinto é que essa semana da mostra é uma ficção científica e que, assim que ela acaba, começa a realidade. Porque fazer cinema neste País ainda é muito difícil, muitos filmes só têm a recepção que merecem aqui. E a verdade é que 2017, por todas as suas particularidades, talvez seja um ano ainda mais difícil”.

Porém, o curador ressalta que “para os cineastas que nunca tiveram dinheiro pra fazer filmes, a diminuição dos recursos não vai afetar tanto”. Ele elogia a produção de diretores jovens “mais guerrilheiros” que com poucos recursos conseguem “ecoar as questões políticas que estão emergindo no País”.

*A repórter viajou a convite da organização do festival. 


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