Tatá Aeroplano mal colocou no mundo seu segundo disco solo, Na Loucura & Na Lucidez, e já fala sobre as músicas que devem entrar no próximo trabalho. Parece loucura, mas quem acompanha a trajetória do músico, um dos mais produtivos da cena paulista, sabe que não há nada de estranho nesta conversa. Aos 38 anos, Tatá já compôs mais de 1500 canções, sendo que de 2008 para cá lançou nada menos que seis discos: três com o Cérebro Eletrônico, um com o Jumbo Elektro e dois solo.
O mesmo time que participou do álbum de estreia, em 2012, segue junto com Tatá no novo trabalho, que tem produção de Dustan Gallas e Junior Boca e participação especial da cantora Bárbara Eugênia. Além dos dois produtores, completam a banda Bruno Buarque e DJ Marco. Figura agregadora que é, Tatá assina também parcerias com Meno Del Picchia, arrudA e Alan Brasileiro. “Eu só consigo fazer música dessa maneira, agregando”, diz ele.
Não só pela sonoridade, mas também pelas temáticas das letras – com narrativas urbanas íntimas, amorosas e “delirantes” -, Na Loucura & Na Lucidez tem forte diálogo com o primeiro disco solo. “Isso para mim é um trabalho de continuidade”, explica. Pendendo mais para a loucura do que para a lucidez, como concorda o músico, o álbum propõe uma viagem que merece ser ouvida com atenção aos seus momentos de delicadeza e estouro. A Brasileiros conversou com Tatá sobre o trabalho. Ouça o disco e leia a entrevista abaixo.
Brasileiros – Depois de muitos anos tocando basicamente em bandas, você lançou em 2012 o primeiro disco solo, e agora já engata no segundo. São experiências muito diferentes, com banda e sozinho?
No primeiro e nesse segundo disco eu cheguei com canções autorais, confessionais, que sempre estiveram presentes também no Cérebro, principalmente nos discos Pareço Moderno e Deus e o Diabo no Liquidificador. Posso citar faixas como Cama, Pareço Moderno, Dê, Sérgio Sampaio, Volta e Deus e o Diabo no Liquidificador… Sempre compus dessa maneira, desde pequeno. No meu primeiro trabalho solo, junto com Dustan Gallas, Junior Boca e Bruno Buarque, reuni canções autorais que foram arranjadas e trabalhadas com eles coletivamente. Para esse novo disco rolou o mesmo processo, só que mais coletivo ainda, mais intenso. Muitas canções ganharam arranjos e partes novas, ou seja, acaba sendo um disco de parceria, onde pensamos os arranjos e seguimos em frente, sem tirar a força e o impacto da canção, que permanece forte e consegue comunicar totalmente com arranjos diversos criados por todos.
Quer dizer, solo mas não sozinho… Fazer música coletivamente é sempre algo que te atrai mais? Como tem sido a experiência com esse time?
Tem sido sensacional! Desde que eu participei do primeiro disco da Bárbara Eugênia, que foi produzido pelo Junior Boca e Dustan Gallas, onde gravei violão e cantei, eles me deixaram muito à vontade para criar ali. Trabalhamos o primeiro disco com o Bruno Buarque no estúdio Minduca e agora no segundo o DJ Marco, que fez os shows do primeiro disco, também participou de duas faixas. Ou seja, é uma banda! Esse processo é riquíssimo. Foi muito intenso gravar o disco. Para mim não foi fácil chegar ao estúdio para cantar e interpretar determinadas canções. São temas fortes, loucos, mas com eles tudo ficou mais fácil, pela convivência, pela parceria. Ontem mesmo, ensaiando para o show de lançamento, paramos no meio para tomar uma cerveja e comemorar, e depois voltamos. O clima tem que ser esse, eu só consigo fazer música dessa maneira, agregando.
Mesmo com as diferenças e peculiaridades de cada disco, parece haver uma certa continuidade estética do primeiro trabalho para esse. Não só por reunir os mesmos músicos, mas por seguir com temáticas de uma “crônica urbana íntima”, algo assim (até a arte da capa é parecida). Você também vê assim? São álbuns com forte diálogo?
São discos totalmente interligados. Foi meio sem pensar, mas essas letras e melodias chegaram naturalmente logo depois do lançamento do primeiro, de maneira complementar! Todos que participaram do primeiro disco participaram do segundo. As fotos são da Maíra Acayaba, o encarte do Gunter Sarfert, o site do Binho Miranda, produção executiva da Sil Ramalhete, o Alejandro Marjanov que faz o PA, Ramiro Melo que faz o som do palco, João Sobral que é nosso diretor de palco, Paulinho Fluxus na luz. São pessoas que admiro muito e que estão com a gente nesse show de lançamento. Isso para mim é um trabalho de continuidade mesmo.
Compositor compulsivo que você é, tem centenas de músicas não gravadas. Como escolheu, entre tantas, as oito faixas que entraram no disco?
Por incrível que pareça, essa foi a parte mais tranquila, selecionar as músicas. Bom, nos últimos três anos eu devo ter composto quase 200 canções. Realmente sou um compositor compulsivo. Mas quando escrevi Mulher Abismo, A Amiga do Casal de Amigos, Na Lucidez, Na Loucura, Perdidos Na Estrada, já era certeza que faziam parte desse disco. Sobre o material que ficou de fora, vou voltar nele agora já para selecionar canções para o próximo disco. Na última semana fiz umas três novas, duas é certeza que já entram no próximo!
Aliás, o que você estava ouvindo durante o processo de concepção e gravação do disco?
Ouvi muito Neil Young, meus parceiros Juliano Gauche e Gustavo Galo – estava trabalhando com eles, é natural que a gente fique escutando os sons dos amigos –, escutei o disco da banda Submarinos, que o Junior Boca faz parte… Também estava escutando Velvet Underground, Jair Naves, Rodriguez, Nick Drake, Connan Mockassin, Stones, The Kinks, e por ai vai.
Na Loucura e Na Lucidez parece pender muito mais para a loucura do que para a lucidez, nas temáticas, na sonoridade… Concorda?
Concordo totalmente. Eu tenho momentos de lucidez, tipo quando entro num café no meio do caos da cidade, para ficar por ali uns vinte minutos para depois enfrentar a “jungle city”, que é uma loucura. Ando muito a pé, então esses pequenos refúgios que me trazem momentos de lucidez em meio ao tempo totalmente louco que vivemos hoje em dia… a lucidez no disco é um desses refúgios, porque na maior parte o álbum está totalmente do lado da loucura!
Vem daí uma pergunta mais ampla (que pode parecer filosofia de bar, mas não é). A vida é realmente mais delírio e loucura do que lucidez? Ou essas coisas andam juntas?
A vida com certeza é mais delírio e loucura. E eu acho isso muito bom, é onde nos reinventamos, onde renascemos! Quando chego num período muito louco da minha vida, sempre me recordo da cena do Walmor Chagas no filme São Paulo, Sociedade Anônima, no centro de São Paulo, onde ele fala e grita loucamente: “Recomeçar, Recomeçar de novo, RECOMEÇAR SEMPRE, RECOMEÇAR, RECOMEÇAR, RECOMEÇAR!”. Loucura e lucidez andam juntas, se tentar separar muito, aí acho que pode dar pane, isso é o que eu penso.
Muitas letras, com narrativas urbanas, histórias de amor etc. parecem muito autobiográficas. São de fato? Ou você parte do que vê e vive para contar outras histórias possíveis?
Finalmente consegui compreender o que acontece quando componho. Tudo o que eu vivo e vejo as pessoas próximas viverem vai para o meu inconsciente. Essas músicas que estão no disco, onde escrevi letra e melodia, vieram de uma vez só, letra, melodia, história… Só depois vou sacar de onde vieram as histórias da música, muita coisa eu vivi mesmo e outras vi acontecerem com pessoas próximas! São um tipo de sonho acordado essas canções! É um presente conseguir escrever essas histórias.
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