A Mostra Internacional de Cinema de São Paulo é uma maratona de muitas luzes, vários ângulos de câmera e ação restrita ao remexer-se na poltrona. O segredo de aproveitar ao máximo os cerca de 400 filmes e chegar até o fim sem se cansar é conhecer os atalhos e dosar as passadas.
Nesta 40ª edição, as opções são tantas e tão atraentes que a primeira medida é definir critérios para organizar um roteiro. Alguns filmes vêm dublados em outras línguas que não a original e com legendas que não o português, por exemplo. Se isso é um incômodo, pode descartar. Filmes ingleses, norte-americanos e franceses têm sempre uma boa chance de entrar em circuito comercial depois de terminada a Mostra, assim como os nacionais. Alguns poucos podem ser encontrados em serviços como Netflix e Now.
Na programação de Novos Diretores, é preciso analisar caso a caso e buscar resenhas estrangeiras; ou então escolher pela intuição, simpatia e interesse pelo tema. A coisa muda totalmente de figura quando se trata das retrospectivas. Mesmo essas, porém, têm filmes mais raros, que valem mais a pena ver.
No caso de Andrzej Wajda – morto no último dia 9, maior diretor da Polônia ao lado de Polanski (a quem dirigiu como ator) e Kieslowski -, todos são recomendáveis. Como o tempo é curto, destaco os mais antigos. No sábado serão exibidos Tudo à Venda e Os Possessos. O primeiro, de 1968, é um clássico filme dentro do filme, feito em homenagem ao ator Zbigniew Cybulski, tido como o “James Dean polonês”, em parte porque também morreu precocemente, atropelado por um trem. O segundo, de 1988, é uma das muitas adaptações que o diretor polonês fez de Dostoiévski, com Omar Sharif e Isabelle Huppert.
No domingo, é a vez do belíssimo Cinzas e Diamantes, sobre o pós-guerra na Polônia, e estrelado justamente por Cybulski. Lançado em 1958, venceu o prêmio da crítica no Festival de Berlim e é tido como um dos melhores filmes de todos os tempos; dentre seus inúmeros fãs estão diretores do peso de Martin Scorsese e Francis Ford Coppola. Geração, por sua vez, de 1954, trata da ocupação nazista no país durante a 2ª Guerra.
O italiano Marco Bellocchio é outro que tem vários de seus filmes escalados na Mostra. Um deles, exibido neste sábado e segunda (24), é A China Está Próxima, de 1967. Sátira sobre as disputas por ascensão social e política, mereceu os prêmios especial do Júri e da Crítica em Veneza, e arrancou elogios entusiasmados da lendária crítica Pauline Kael. Com exibição no domingo, De Punhos Cerrados, de 1965, mostra o drama de uma família em que a mãe e cega é três dos filhos epiléticos. Nos dois filmes, a música é do grande Ennio Morricone. No mesmo dia está programado o novo Belos Sonhos, longa que abriu a Mostra.
Killer Joe, atração do sábado, é o último longa de William Friedkin, cineasta convidado da Mostra, famoso por filmes como O Exorcista e Operação França, com o qual ganhou o Oscar de melhor diretor. Traz Matthew MacConaughey num dos melhores papéis de sua carreira como um assassino de aluguel. Entre o kitsch, o surrealista e o teatral, o filme pode ser encarado como uma comédia estilizada de humor negro. Para se ter uma ideia, um dos pontos altos (e mais violentos) é protagonizado por uma…coxinha.
Também no sábado, a pedida pode ser O Quarto Homem, filme que revelou Paul Verhoeven ao público brasileiro, exibido originalmente na 8ª edição da Mostra. No dia seguinte o cinéfilo pode conferir Elle, a mais recente produção do diretor holandês (uma produção, diga-se, bastante irregular, mas sempre interessante).
O cultuado diretor Jim Jarmush está com duas boas pedidas no domingo, nas pontas de sua carreira: o filme mais recente (e bastante elogiado), Paterson, e o primeiro, Férias Permanentes, de 1980, feito com baixo orçamento, em 16 mm.
Na seção “Perspectiva Internacional”, há excelentes alternativas também. Neste sábado, por exemplo, serão exibidos Pitanga, O Caminho para Istambul e O Apartamento. O primeiro, diz o nome, é um belo documentário sobre um de nossos maiores atores, Antonio Pitanga, co-dirigido por sua filha, a atriz Camila Pitanga, e Beto Brant. Pitanga é um dos homenageados da Mostra com o Prêmio Leon Cakoff (o outro é Friedkin). O Caminho para Istambul é o mais novo longa do diretor francês de origem argelina Rachid Bouchareb, mais conhecido por Dias de Glória. Conta a história de uma jovem que resolve entrar para o Estado Islâmico e do consequente desespero de sua mãe, que sai em sua busca. Já O Apartamento se destaca por ter vencido o Prêmio de Melhor Roteiro e Melhor Ator para Shahab Hosseini no Festival de Cannes, mas também porque seu diretor é Asghar Farhadi, uma das maiores promessas do bom cinema iraniano, ganhador de um Oscar, por A Separação, e de um Urso de Prata do Festival de Berlim de melhor diretor por À Procura de Elly.
Para o domingo estão escalados O Ídolo, do mesmo diretor do sensacional Paradise Now, o palestino Hany Abu-Assad; em Poesia sem Fim, o cultuado chileno Alejandro Jodorowski revive sua juventude nos anos 1940 e 50, quando conviveu com Nicanor Parra e Enrique Lihn, dois dos maiores poetas de seu país; e Canção de Lugar Nenhum, documentário iraniano mostra a trajetória de Sara Najafi, uma jovem compositora que decide organizar um concerto para cantoras, desafiando a censura dos idos da revolução de 1979. A direção é de Ayat Najafi.
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