Historiador teme radicalização na França caso os atentados continuem

Presidente francês Framçois Hollande concede entrevista após o atentado em Nice - Foto: Elysee
Presidente francês Framçois Hollande concede entrevista após o atentado em Nice – Foto: Elysee

Nesta última terça-feira (26), dois jovens de 19 anos invadiram a igreja católica da cidadezinha de Saint-Etienne-du-Rouvray (norte da França) na hora da missa e cometeram o segundo atentado terrorista no País em menos de um mês. Os agressores decapitaram o padre da paróquia no altar da igreja antes de serem mortos por policiais.

O atentado criou “uma indignação forte e mundial” principalmente porque “foi a primeira vez em que algo do tipo aconteceu na França”, explicou o historiador das religiões e escritor Odon Vallet, em entrevista à Brasileiros.  “Esquecemos que vários padres já foram assassinados ou estão sendo assassinados todos os dias na América Latina, na Síria, no Iraque, Líbano ou no norte da Nigéria”, continuou.

Vallet afirmou que esta indignação geral contribuiu para criar “uma união sagrada” entre católicos e laicos na França, porque ambos são alvos do terrorismo. “O presidente François Hollande disse que matar um padre era como profanar a República, ou seja, o religioso e o profano se juntaram na condenação do terrorismo”, destacou.

“Se os atentados continuarem na França, assistiremos a uma radicalização da opinião pública”, diz o historiador. A menos de um ano das eleições presidenciais de 2017, Vallet teme a radicalização tanto dos católicos como dos laicos, “que será acompanhada por uma ascensão da extrema direita e por um enfraquecimento do Estado de Direito”. Na opinião de Vallet, a segurança tem grandes chances de se tornar o tema “mais importante e discutido” nas eleições, já que o cidadão se sente cada vez mais inseguro.

Duas Franças atacadas

Na entrevista, Odon Vallet distinguiu as duas Franças atacadas: a laica e a católica. A laica é alvo do terrorismo porque a França tem “sua definição própria de laicidade no país”; e a católica, por ser a religião das históricas Cruzadas, as guerras santas iniciadas pelo Reino dos Francos em 1095, raiz das atuais nações da França e da Alemanha.

Segundo Vallet, o que ele chama de “laicidade francesa”, impede, do ponto de vista dos terroristas, a aplicação correta da lei muçulmana. Por exemplo, a laicidade francesa, “que não tem equivalente no mundo”, proibiu o uso do véu nas escolas a partir de 2004, mas também de todos os outros signos religiosos. Em 2010, outra lei proibiu o véu integral em todos os lugares públicos sob pena de multa de 150 euros (R$ 550).

Vallet explicou que a laicidade francesa pode ser interpretada de diferentes maneiras: “Uma primeira, rígida, como ela está sendo cada vez mais interpretada no momento atual. Outra maneira é mais flexível, autorizando o diálogo entre as religiões e o Estado, porém sempre proibindo a ação política da religião”.

“Nos Estados Unidos a Primeira Emenda da Constituição detalha que, se não há nenhuma religião dominante, o Estado se deve ficar a igual distância de todas as religiões, o que permite uma cooperação. Na França é muito mais complicado do que isso”, explicou Vallet.

A laicidade francesa tem sua origem na lei de separação da Igreja e do Estado, promulgada em 1905: ela estabelece o direito de crença ou de não crença e veda o financiamento dos cultos pelo Estado.

Dia 14 de julho passado, um atentado em Nice tinha deixado 84 mortos. No total, chega a 236 o número de cidadãos franceses mortos pelo terrorismo islâmico nos últimos 18 meses.


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