A pesquisa do Datafolha divulgada neste fim de semana revela que, depois que Dilma Rousseff (PT) deixou o Palácio do Planalto, a esquerda reconquistou o patamar de votos que possuía antes de 2002, quando Lula foi eleito presidente pela primeira vez. De acordo com a pesquisa, 32% dos eleitores defendem que Dilma volte ao poder. Esse é exatamente o percentual de votos válidos obtidos por Lula na eleição de 1998.
É um apoio muito maior do que Dilma tinha em agosto de 2015, quando apenas 8% dos brasileiros aprovavam sua gestão (a reprovação era de 71%). A partir daí, a avaliação de seu governo melhorou lentamente: em abril, a rejeição tinha caído para 63%, e 13% consideravam seu governo ótimo ou bom. Agora, segundo a pesquisa divulgada pela Folha de S.Paulo, 35% dos eleitores rejeitam o impeachment da petista.
Na avaliação da cientista política Maria Victoria Benevides, professora aposentada da Faculdade de Educação da USP, “a esquerda está de fato se recompondo, mas isso não está fortalecendo o PT”. A luta contra o impeachment está atraindo inclusive segmentos que nem se consideram de esquerda, mas que rejeitam os abusos do Ministério Público e do Judiciário, os pretextos legais utilizados para aprovar o impeachment na Câmara e as medidas polêmicas do governo Michel Temer: “Tem gente que nunca foi de esquerda que passou mal ao ver as declarações dos deputados que aprovaram o impeachment”.
Essa coalizão contrária ao impeachment é, segundo Benevides, bem mais ampla que o percentual de eleitores que apoiam Lula: “Aqueles que defendem a derrota do impeachment não necessariamente apoiam Lula”. De acordo com o Datafolha, o ex-presidente agora lidera de forma isolada as pesquisas para a eleição presidencial de 2018, com 22% das intenções de voto, contra 17% de Marina Silva (Rede) e 14% de Aécio Neves (PSDB). Essa diferença de dez pontos percentuais indica que a rearticulação da esquerda não está se processando sob a hegemonia do PT: “Hoje vejo que muitos se afastaram do PT. Há setores que se aproximaram do PSOL, do PC do B, da Raiz”.
Benevides considera que o percentual de apoio a Lula ainda é muito baixo, quando se observam os percentuais que ele tinha em 1998 e, sobretudo, nos anos 2000. “Muitas pessoas de esquerda acham que o PT já era. A decepção de antigos militantes com o partido é muito grande”. A eleição do presidente da Câmara, por exemplo, mostrou que a esquerda poderia ter levado um nome para o segundo turno, mas ela não conseguiu se unir: “Luiza Erundina é uma pessoa que tinha legitimidade para congregar a esquerda”.
Para Benevides, os números da pesquisa ainda precisam ser analisados com cuidado, porque a eleição presidencial está muito longe, e existe um descrédito muito grande em relação a todos os políticos, o que explica a queda quase generalizada dos nomes na pesquisa: “Tenho medo desse sentimento, porque não podemos viver sem política”.
Na sua opinião, hoje não existem mais políticos com a credibilidade de Leonel Brizola, Teotonio Vilela, Miguel Arraes, ou de advogados como Sobral Pinto e Raymundo Faoro: “Quem são os presidentes da OAB hoje? A gente nem conhece. Ninguém chega aos pés do Marcello Lavenère. Leonel Brizola faz uma falta enorme”. Para ela, Lula foi o último líder de dimensão nacional. A oposição, por sua vez, não possui nenhum quadro como Afonso Arinos ou Aliomar Baleeiro: “Ninguém hoje na direita tem a estatura de Carlos Lacerda. O descrédito dos políticos de direita é ainda maior do que os de esquerda”.
O levantamento do Datafolha mostra que os setores progressistas estão se recompondo: nunca houve tantos debates e manifestos. Intelectuais do mundo inteiro (incluindo nomes como Naomi Klein, Noam Chomsky, Jürgen Habermas, Axel Honneth, Rainer Forst, Nancy Fraser, Charles Taylor) se mobilizaram para condenar o impeachment. Mas ninguém sabe qual caminho a esquerda brasileira vai tomar de agora em diante.
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