Jean Wyllys: “Pra que provas quando o MPF pode apresentar um Power Point?”

Foto: EBC
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Depois da denúncia contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, feita pelo Ministério Público Federal nessa quarta-feira (14), a internet foi tomada por críticas à apresentação em Power Point do procurador Deltan Dallagnol, coordenador da força-tarefa da Operação Lava Jato.

O deputado federal Jean Wylls (PSOL-RJ)  foi um dos que se manifestou pelo Facebook: “Os digníssimos procuradores iniciaram o comício com uma frase que fez corar qualquer pessoa com conhecimento mínimo em Filosofia do Direito e Teoria da Justiça: não teremos provas, mas temos convicções! Repito: Não teremos provas, mas temos convicções. Ou seja, bastam as convicções dos procuradores para de se incriminar uma pessoa! Surreal! E surreal é a imprensa lhe dar microfones sem crítica”, escreveu.

Pelas redes, o professor de filosofia da Universidade de São Paulo, Pablo Ortellado, também se posicionou publicamente contra a denúncia que foi apresentada: “Não é verossímil que um esquema de corrupção da magnitude daquele apontado pela Lava Jato tenha como mentor e líder alguém cujo benefício sejam reformas num sítio e num apartamento. Não faz sentido roubar o equivalente ao PIB do Uruguai e a cota do chefe ser uns pedalinhos para os netos. Isso, no entanto, não quer dizer que o roubo na Petrobrás durante o governo petista não tenha sido escandaloso e criminoso, que o governo de então não seja pelo menos indiretamente responsável, nem que seja aceitável que um ex-presidente ganhe reformas de imóveis como mimo de empreiteiras. Mas as coisas precisam ter o tamanho que tem e as diferentes responsabilidades precisam ser atribuídas de forma adequada”.

Ex-procurador-geral do Estado de São Paulo, Marcio Sotelo Felippe publicou no Facebook: “Nada a comentar. A indigência fala por si”. O juiz de Direito de São Paulo Marcelo Semer também criticou a apresentação: “Não tenho provas, mas tenho convicção é o “estupra, mas não mata” do processo penal. Já nasceu um clássico”. Mauricio Stegemann Dieter, professor doutor de Criminologia da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, publicou uma foto da projeção de Dallagnol: “A apresentação desse gráfico certamente figura como um dos momentos de maior idiotia da burocracia nacional de todos os tempos.”

Renan Quinalha, advogado e assessor da Comissão Estadual da Verdade de São Paulo, lamentou o episódio: “Assistindo ao vivo a coletiva de imprensa convocada pela Lava Jato agora, consegui entender finalmente que o grande objetivo da Lava Jato é prender Lula e depois ela vai terminar por ter cumprido seu principal objetivo. Sempre me neguei a reduzir essa operação assim, mas é impossível não reconhecer isso nessa altura do campeonato. Os procuradores mesmo frisam que “não existe provas cabais”, mas que “Lula estava no centro, o que demandou montar um quebra-cabeça” do conjunto probatório. Uma série de ilações e metáforas ridículas, ao invés de provas, são a tônica da acusação: “Lula nomeou altos cargos da administração que se envolveram com a corrupção”; “Lula era o maestro dessa grande orquestra”; “Lula era o general no comando desse grande esquema da propinocracia (governo pela propina)”. Curioso que o suposto “dono” do esquema de desvio de bilhões de reais tenha ficado só com um dúplex em Guarujá. Nenhuma novidade apareceu, seja na acusação, seja na comprovação. A base da investigação segue sendo três contratos da OAS com a Petrobras em virtude de cartelização e propinas, bem como a lavagem desse dinheiro por meio do triplex do Guarujá. Nada além do que a Globo e a Veja martelaram todos os dias até agora com a condenação pública e sem provas. Quero ver preso quem tiver cometido crime de corrupção, seja Lula ou qualquer outro. Mas sem provas e com esse nível de partidarismo eu não consigo comemorar absolutamente nada”.

O filósofo e ex-ministro de Educação de Dilma Rousseff, Renato Janine Ribeiro falou que a Lava Jato perde credibilidade pela falta de provas: “Há algo esquisito em alguns membros das carreiras jurídicas de Estado. Veem o direito de defesa e a presunção de inocência só como entraves. E é verdade que se abusa deles – haja vista o caso do tucano Pimenta da Veiga, que se esquiva há anos da citação judicial. Mas isso não justifica a hybris que aparece no excesso de retórica e na insuficiência de provas. Graças a isso, o PT consegue desmoralizar vários ataques a ele. Graças a isso, o mensalão não mudou a opiniao de ninguém, petista ou anti. Graças a isso, a Lava Jato está perdendo o papel pedagógico que devia ter. Uma grande pena”.

Leia o texto de Jean Wyllys na íntegra abaixo:

Dessa vez, o nível de arbitrariedade, irresponsabilidade e desprezo pelas garantias legais por parte dos membros do Ministério Público Federal que conduzem a operação Lava Jato bateu seu recorde. Ao apresentar suas “razões” para tentar incriminar Lula – proposta que ainda será avaliada em preliminares e no mérito por um juiz – o MPF do Paraná conseguiu transformar o que deveria ser uma denúncia séria e sustentada em provas num constrangedor comício político anti-Lula e antipetista, cuja estrela principal foi um tosco power point que, em minutos e acertadamente, virou alvo de chacota nas redes sociais. Apenas a Globo News e a home da Folha de São Paulo levaram aquele esquema de ensino fundamental a sério. Por que será?

Os digníssimos procuradores iniciaram o comício com uma frase que fez corar qualquer pessoa com conhecimento mínimo em Filosofia do Direito e Teoria da Justiça: não teremos provas, mas temos convicções! Repito: Não teremos provas, mas temos convicções. Ou seja, bastam as convicções dos procuradores para de se incriminar uma pessoa! Surreal! E surreal é a imprensa lhe dar microfones sem crítica.

Como se não houvesse no Brasil um rito legal para ser seguido em casos de corrupção, uma “denúncia” é apresentada num evento claramente político transmitido ao vivo por televisão, assim como um lançamento da nova programação da Globo para potenciais anunciantes. Sem provas, nem argumentos objetivos, foram apresentados sucessivos desenhos e gráficos no modelo power point que “mostram” a misteriosa relação entre as “reações de Lula”, a “expressividade” e “Lula”, grande, no centro. Parece uma piada? E é uma piada: não há outra maneira de encarar aquilo. A falta de consistência na peça processual foi substituída por estratégias mais próprias de um aluno que não estudou para a prova… Aliás, a apresentação tem a cara de quem faz curso de Direito à base de apostila e slides!

A “tese” apresentada como “notícia bomba” não traz nenhum fato novo e repete, em grande medida, a “teoria do domínio do fato”, antes utilizada no julgamento do “mensalão” (não, não estou me referindo à compra de parlamentares para garantir a reeleição de Fernando Henrique Cardoso; este “mensalão” nunca foi julgado nem chegou às manchetes dos jornais), ou seja, se Lula era o líder de um grupo político, conclui-se que sabia de todos os supostos crimes cometidos pelos membros do seu governo (dentro e fora dele); supõem um sequestro da consciência e da vontade dos subalternos por parte de Lula.

É a “paranoiacracia”!

Vejam que não há muita diferença entre os surtos de Janaína Paschoal e as “convicções” dos procuradores do Paraná! Eles parecem a reencarnação das fanáticas de Salem.

No país que viu um governador (atual senador) construir aeroporto na fazenda do tio com dinheiro público e outro dançar em Paris de guardanapo na cabeça junto de empresários ligados a esquemas de corrupção, Lula é apresentado como “o maior dos corruptos” que, ao final da história, restaria com um simples apartamento mediano no Guarujá (no Guarujá!) e que, até agora, não está provado que seja mesmo dele. É uma situação tão ridícula (mas igualmente revoltante!) que só poderia mesmo acabar em memes nas redes sociais.

A duas semanas da eleição, parece no mínimo “oportuno” apresentar fatos que já eram de conhecimento das pessoas num grande show. É o MPF do Paraná buscando intervir no resultado das eleições municipais sem apresentar candidaturas claras!

Ora, há nessa ação dos procuradores da Lava Jato um desrespeito profundo das garantias jurídicas; e a imprensa embarca no desrespeito por razões político-partidárias, afamando concurseiros com salários astronômicos e pouco senso de justiça. Isso é intolerável!

Se o procurador diz que não terá “provas cabais de que Lula é efetivo proprietário no papel do apartamento”, mas que tem “convicção”, eu posso afirmar que tenho a convicção de que os procuradores responsáveis pelo caso são uns burocratas classistas, com baixa compreensão da política e servidores indiretos dos corruptos e plutocratas do PSDB e do DEM. E aí?

Convicção por convicção, eu fico com a minha!


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