A França, em tempo do nosso cinema

No ano passado, mais de 7 mil pessoas assistiram aos filmes do Festival do Cinema Brasileiro de Paris. Dessas, 58% eram franceses. Os outros 42% do público eram de espectadores de diferentes países – entre os quais, 17% provenientes do Brasil.

“O festival abre uma janela importante para nossos filmes junto a público, imprensa e distribuidores”, anima-se o cineasta Sérgio Rezende, assíduo frequentador e que participará da mostra competitiva com Salve Geral. Organizadora do evento desde a primeira edição, a produtora Kátia Adler, carioca de 48 anos, formada em cinema pela Université Paris 8, reforça: “O festival é uma vitrine da nossa produção cinematográfica; e Paris é a vitrine para toda a Europa. A gente só pode pensar em coprodução e distribuição mostrando os filmes, criando meios para as pessoas se encontrarem”.
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Pouco divulgada no Brasil, a mostra terá sua 12ª edição entre os dias 5 e 18 de maio. Está confirmada a exibição de 27 produções, entre documentários e filmes de ficção. Somente estes últimos disputam entre si os prêmios de júri e de público para melhor filme, melhor ator e melhor atriz.

Entre os competidores estão novos diretores, como Marcelo Laffite e Paulo Halm, o que é salutar para a divulgação no exterior da recente produção cinematográfica brasileira. Halm participa com Histórias de Amor Duram Apenas 90 Minutos. O título faz alusão à duração, considerada ideal por distribuidores e exibidores, de um longa-metragem. “Permite cinco exibições diárias no cinema, tempo suficiente para trailers e comerciais e, ainda, limpar a área, entre uma sessão e outra”, brinca Halm. O filme trata do ritual de passagem de um jovem escritor. Marcelo Laffite, por sua vez, inscreveu Elvis e Madona – assim mesmo, com um “n” só -, que narra a história de amor entre uma garota homossexual e um travesti. O cineasta comemora uma agenda cheia, com participações em festivais mundo afora: “Depois de Paris, vamos para o concorridíssimo Tribeca, em Nova York, organizado por Robert De Niro”.

Fato inédito, o Festival do Cinema Brasileiro de Paris será inaugurado com um documentário, Dzi Croquettes, premiado como o melhor do gênero no mais recente Festival de Cinema do Rio de Janeiro. O filme marca a estreia de Tatiana Issa e Raphael Alvarez na direção de um longa-metragem. Baseia-se na trajetória dos Croquettes – corruptela de The Crocketts -, grupo de dançarinos/cantores que, nos anos 1970, atuavam travestidos, fazendo do escracho um de seus atrativos. Kátia Adler escolheu esse filme para o début do festival não apenas pela qualidade, mas também pelo fato de os Croquettes terem feito retumbantes temporadas nos palcos parisienses. “Moro há três anos no Rio, onde nasci, mas vivi 24 anos em Paris e acho que adquiri um olhar meio francês, né?”, comenta, confiante na escolha. “Além disso, os franceses estão cansados de filmes de violência.”

Para seduzir mais espectadores, o festival não se limita aos filmes. Também programa exposições de artistas plásticos brasileiros e shows musicais. E mais: anualmente, homenageia um grande artista do cinema brasileiro. Em outras edições, celebrou-se a arte das atrizes Fernanda Montenegro e Marieta Severo, do ator Paulo José e dos diretores Sérgio Rezende e Roberto Farias.

Neste ano, o homenageado será Chico Buarque de Hollanda. Embora tenha participado como ator de um único filme, Quando o Carnaval Chegar, dirigido por Cacá Diegues, em 1972, o cantor, compositor e escritor tem o seu nome ligado a diversas produções cinematográficas. Entre outras participações, foi o autor da música-tema ou da trilha sonora de Dona Flor e Seus Dois Maridos (de Bruno Barreto), A Ostra e o Vento (Walter Lima Jr.) e, sobretudo, de A Ópera do Malandro (Ruy Guerra). Além disso, alguns romances escritos por Chico foram adaptados para o cinema, casos de Benjamim (dirigido por Monique Gardenberg) e Budapeste (Walter Carvalho). “Claro que ele merece essa homenagem”, diz Kátia. “O cinema está cada vez mais presente na carreira do Chico.” De quebra, a organizadora do festival aproveita-se de o compositor ter muitos admiradores na França. “É, também, uma maneira de atrair um novo público para o cinema brasileiro.”

Os cinco filmes serão exibidos em uma mostra paralela do festival. Aproveitando mais uma vez a deixa, Kátia Adler está programando shows de cantoras da nova safra da MPB para desfilar o repertório de Chico Buarque. O próprio compositor, no entanto, embora tenha apartamento em Paris há muitos anos – por sinal, no bairro do cinema onde se dará a mostra -, não confirmou presença. Até agora, alega outros compromissos também na Europa.

O Festival de Cinema Brasileiro de Paris rendeu a Kátia Adler convites para atuar em outros centros. Não apenas na chamada Cidade Luz – metrópole em que foram exibidos, no dia 28 de dezembro de 1895, os primeiros filmes da história, dirigidos pelos irmãos Lumière. Por exemplo: as cidades canadenses de Toronto e Montreal já entraram, há alguns anos, no circuito. Toronto promoveu, em dezembro, a terceira edição do Brazil Film Fest, organizado pela Associação Jangada (misto de produtora, distribuidora e editora), fundada por Kátia em 1998. O Festival du Film Brésilien de Montréal, por sua vez, também caminha para a quarta edição. Evidentemente, os festivais internacionais de Cannes, Veneza e Berlim continuarão a ser o maior objetivo dos cineastas brasileiros. Mas eles sabem muito bem que o pontual trabalho de Kátia é uma das maneiras mais consistentes de continuar a ganhar as telas do mundo.


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