Este texto faz parte do especial 2017 x 24 – visões, previsões, medos e esperanças da edição número 113 da Revista Brasileiros, onde articulistas e colaboradores foram convidados a pensarem sobre o que e o quanto podemos esperar – se é que podemos – para nosso País no próximo ano.
Neste ano prestes a encerrar, como presidente do Clube de Engenharia, tive a oportunidade de inúmeras vezes Brasil afora debater o atual cenário de crise econômica e política que, na prática, se associam, em um contexto que beira a falência institucional. Em todos os lugares encontrei jovens e profissionais já vividos que, a despeito das diferenças culturais, de formação e de expectativas, compartilham da mesma perplexidade. Afinal, estamos diante de mais de 20 milhões de brasileiros desocupados, cerca de 12 milhões declaradamente sem emprego e os demais, de tão desalentados, até desistiram de procurar uma nova fonte de renda, enquanto, nas diferentes esferas de governo, não há iniciativas que busquem reverter a atual situação.
No cenário de crise fiscal generalizada, pois envolve a União, estados da Federação e a grande maioria dos municípios, o Projeto de Emenda Constitucional (PEC) 241/55, apelidado de PEC do Teto dos Gastos, é vendido pelo governo à opinião pública como indispensável para criar as bases para o desenvolvimento econômico sustentável. Não é.
O projeto em tela é apenas uma draconiana proposta de congelamento de gastos do setor público de toda natureza, menos dos juros estratosféricos da dívida pública, pelos próximos 20 anos. Não leva em conta sequer o aumento projetado da população no período. Propõe que se trate o orçamento público como as nossas contas domésticas, sob a justificativa de que não se pode gastar mais do que se arrecada. Na prática, contraria a própria noção de Estado, que, para cumprir com sua função precípua, a de devolver na forma de serviços de qualidade os recursos que arrecada da sociedade, tem prerrogativas constitucionais como a de gerir a política monetária, a política cambial e a política fiscal.
O Brasil é um país ainda em construção. Mercê de sua extensão territorial e de sua população, poucos mercados no mundo são tão significativos quanto o nosso. Apenas China, Rússia e Índia possuem características similares. Apesar disso, a proposta do governo federal para reverter a atual crise é a de destruir todos os instrumentos de que o País dispõe para gerar uma nova onda de desenvolvimento e emprego – porque é disso que se trata.
Nos Estados Unidos, Trump acena com um pacote de mais de US$ 3 trilhões em investimentos para reconstruir a infraestrutura norte-americana em dez anos. Aqui, o governo impõe amarras a novos investimentos. Desmonta o sistema de compras da Petrobras, que, desde quando foi criada, na década de 1950, fomenta a indústria aqui instalada, uma cadeia de mais de cinco mil fornecedores, que geram mais de 800 mil empregos qualificados. Descapitaliza o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), até aqui um dos mais importantes bancos de desenvolvimento do mundo, e lhe atribui um papel mais do que secundário, o de simples repassador de recursos para privatizações e concessões.
O governo federal renega as instituições que alavancaram o desenvolvimento do Brasil nas últimas cinco décadas e aposta em um “novo” modelo, que não é outro senão o da desconstrução do Estado, que não deu certo em lugar nenhum. Veja-se o caso recente da Grécia, destruída. Nessa lógica, a Petrobras abre mão de seu papel de indutora do desenvolvimento e passa a comprar onde é mais barato e busca dispensa da política de conteúdo local para comprar plataformas na China. Vai gerar empregos na China, gerar desenvolvimento na China e fragilizar não só a nossa indústria como também grandes multinacionais, de que são exemplo a GE e a Halliburton, que recentemente para cá vieram, investindo centenas de milhões de dólares em centros de pesquisa para participar do nosso desenvolvimento.
O déficit fiscal precisa ser corrigido pelo aumento de receitas, através da revisão de renúncias fiscais, da taxação de dividendos e de grandes fortunas, do combate à sonegação, da simplificação tributária que alivie a carga incidente sobre o capital produtivo, de política cambial que iniba a farra dos importados, além de investimentos do setor público que estimulem a economia, viabilizados pela redução dos gastos escandalosos com juros da dívida pública, hoje responsáveis por mais de 45% da despesa pública. Em suma, é preciso colocar a roda da economia para girar, sem o que não sairemos do atoleiro.
Por outro lado, o combate à corrupção é necessário e conta com o apoio da sociedade. Entretanto, o que está sendo feito em nome do combate à corrupção e de um pretenso ajuste fiscal é destruir a capacidade produtiva brasileira, nos mais diversos segmentos, particularmente nas áreas da engenharia e da indústria. A persistir esse rumo, regrediremos aos anos 30 do século passado, quando éramos apenas exportadores de café e de minérios. O Brasil, hoje uma das dez maiores economias do mundo, não pode se conformar com a desconstrução em curso. É hora de as forças vivas da nação se unirem em torno de um projeto que preserve as instituições democráticas e que assegure o desenvolvimento sustentável, soberano e socialmente inclusivo do nosso País ao longo das próximas décadas.
*Pedro Celestino é presidente do Clube de Engenharia
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