Engrenagem social enferrujada


[nggallery id=14520]

Emoldurados pela miséria e pela exploração
Sérgio Bianchi disse em uma entrevista: “Sou pré-marxista, que coloca as diferenças culturais em cima das diferenças de classe”. Essa frase sentencia como o diretor trabalha com sua temática principal: como a dívida social do País afeta as relações dentro e entre as classes. Os personagens dos seus filmes não são coitadinhos. Todos exploram todos, sejam eles pobres ou ricos e, nesse estado de coisas insanas, as relações vão sendo travadas e emolduradas. Em seus novo filme, Os Inquilinos, Os incomodados que se mudem, o diretor mostra o cotidiano de uma família de classe média baixa da periferia de São Paulo (Vila Brasilândia), que é afetada quando três jovens se tornam vizinhos deles. É diante dessa nova situação que o diretor constrói a história dos seus personagens: do pai de família (Marat Descartes) que se vê acuado diante do perigo iminente, que não se efetiva (o perigo mora ao lado de todos nós). O importante frisar que o diretor, mesmo trabalhando com a miséria instaurada pelos desmandos do poder brasileiro, dá um tratamento diferenciado na condução da história dos seus personagens. O tom dado em Os Inquilinos é levemente sutil, não há estardalhaço e nem panfletagem. O espectador vai observando como transcorrerá a “Nau dos Insensatos”.

Os Inquilinos, de Sérgio Bianchi
Espaço Unibanco 3. Dia 30, às 13h30
Consulte outros dias e horários no site oficial da Mostra, abaixo


Um semiclássico
Há uma tragédia anunciada quando vamos assistir a um novo filme de um diretor consagrado, que fez não só um clássico, mas vários. Espera-se que esse novo filme esteja à altura dos melhores que o diretor realizou na carreira. Essa constatação serve para falarmos de Ervas Daninhas, do grande diretor francês Alain Resnais, concorrente da Palma de Ouro de Cannes deste ano. Há exatos 50 anos, o diretor Resnais estreava com o longa-metragem (excetuando seus curtas), já com o sensacional Hiroshima Mon Amour. E ele não parou mais de fazer filmes excepcionais como O Ano Passado em Marienbad (1961), Providence (1977) e Meu Tio América (1980). Se formos comparar cada novo filme que ele realiza com os citados acima, fica difícil sairmos satisfeitos do cinema. Então, quem for assistir ao Ervas Daninhas, não tente comparar com os clássicos do diretor. Apenas viaje na história de Georges e Marquerite, que mostra como um simples ato pode gerar tantas coisas incontroláveis. Constate que Resnais continua sendo um grande diretor e fazendo grandes filmes.

Ervas Daninhas, de Alain Resnais
Cinemark – Shopping Eldorado. Dia 29, às 22h
Consulte outros dias e horários no site oficial da Mostra, abaixo


O vilão da Atlântida
O ator José Lewgoy ficou conhecido primeiramente como o grande vilão dos filmes realizados pelos estúdios Atlântida, das pornochanchadas, melhor dizendo. O documentário Eu Eu José Lewgoy, de Cláudio Kahns, resgata essa e outras histórias do ator. O filme é narrado em primeira pessoa, isso é, pelo próprio Lewgoy (o que não é muito comum em documentários sobre personalidades), que vai tecendo fatos da sua vidan entrelaçados com os trabalhos mais importantes da sua carreira. Além disso, há depoimentos de pessoas que o conheceram e trabalharam com ele, como Tônia Carrero, Luís Fernando Veríssimo, João Ubaldo Ribeiro, Jaguar e o diretor Werner Herzoq, que o dirigiu no premiado Firzcarrraldo. Mais um importante resgate da nossa cultura.

Eu Eu, José Lewgoy, de Cláudio Kahns
Cine Bombril. Dia 29, às 20h
Consulte outros dias e horários no site oficial da Mostra, abaixo


Tributo a arte
Em grande estilo, foi lançado na noite de quarta-feira (28), no Shopping Frei Caneca, trinta e oito novos títulos da Coleção Aplauso, iniciativa da Imprensa Oficial do Estado de São Paulo para resgatar personalidades da cultura brasileira. Um dos títulos lançados foi para a atriz Fernanda Montenegro, que não compareceu ao evento. Mas, outras personalidades retratadas na Coleção, menos badaladas, estiveram lá, como Mauro Mendonça, Stenio Garcia, Débora Duarte (surpresa com a presença do seu pai, o ator Lima Duarte, que foi dar um abraço nela). “Sinceramente não esperava que ele viesse, até porque eu estive com ele À tarde e ele não me disse que viria. Estou muito feliz”, revelou a atriz ao site da Brasileiros, entre muitos outros artistas. Com esses novos livros, a Coleção Aplauso completa 200 títulos. Esperamos que outros livros venham para preservar a memória da nossa cultura.


Paulo Machline (diretor)

Brasileiros – Você disse, em entrevista, que pretendia adaptar o livro de Lourenço Mutarelli, em que se baseou o seu filme Natimorto, diferente do outro livro dele, que foi adaptado para o cinema (O Cheiro do Ralo). Você disse que queria captar o universo do escritor como realmente é. Por que essa opção estética?
Paulo Machline –
A única pessoa que conhece esse universo como “realmente é” ou “surrealmente é” só pode ser o Lourenço. Meu desafio era chegar perto desse universo. A estética do filme foi pensada para que o espectador mergulhe nesse universo e tenha uma experiência diferente. Não poderia contar essa história de forma naturalista, porque o texto, a narrativa, as situações, não acontecem na casa do vizinho, não fazem parte de um cotidiano. A história do [livro] Natimorto é uma história de amor, uma clássica história de amor, mas ambientada numa situação improvável. O reconhecimento do Lourenço de que eu cheguei próximo ao que ele imaginava ao escrever o livro é minha maior recompensa.

Brasileiros – Seu filme foi o mais elogiado pela crítica no Festival do Rio, mas não ganhou o prêmio principal de melhor filme. Alguma crítica por conta da escolha do jurados do festival?
Paulo Machline –
Nenhuma crítica. O filme foi muito bem recebido no Rio, tanto pela crítica quanto pelo público. Se o júri não premiou o filme é porque achou que não deveria. Cada júri pensa de um jeito.

Brasileiros – Como foi dirigir o próprio escritor Lourenço Mutarelli como ator no filme. O que achou do seu desempenho?
Paulo Machline –
O Lourenço vive dizendo que não é ator. Eu posso afirmar que ele é um grande ator. Havia outro ator para o papel dele, mas por situações de agenda acabei tendo que abrir novamente o personagem. Foi quando o Lourenço pediu um teste. Não fiz teste nenhum, apenas algumas leituras com a Simone Spoladore, que contracena com ele. Daí pra frente foi uma entrega impressionante do Lourenço para o filme. O Lourenço virou o filme. Ele viveu o que havia escrito e ao mesmo tempo teve a generosidade de permitir que adaptasse sua história. Li em algum lugar que acharam que a interpretação dele foi “suicida”. Concordo plenamente com essa afirmação. Ele mergulhou no personagem, parou de comer, emagreceu 8 ou 9 kg e ainda queria dormir no cenário. Foi uma experiência inesquecível, uma troca riquíssima, e quando vejo o resultado na tela não tenho dúvidas de que foi a escolha certa.

Brasileiros – Além do seu filme ficcional Natimorto, você está com outro filme na Mostra, o documentário A Raça Síntese de Joãosinho Trinta. Por que você foi atraído para este projeto?
Paulo Machline –
O documentário nasceu em 2002, quando comecei a pesquisar sobre Joãosinho Trinta. Li um artigo do Carlos Heitor Cony sobre o João e imaginei que poderia fazer um filme biográfico sobre ele. Quando comecei a pesquisa vi que o universo do João era ainda mais fascinante. Quando concluí, analisando o material em vídeo juntamente com Giuliano Cedroni, que é co-diretor do documentário, percebemos que o material tinha força para virar uma peça independente do filme. Foi quando o documentário nasceu. Tínhamos um corte pronto em 2006, mas faltava uma conclusão. O João teve uma isquemia e eu precisava saber como ele estava. Foi muito difícil encontrá-lo, mas quando isso aconteceu vi que ele estava muito bem, se recuperando e cheio de histórias e teorias novas. Nesse ano decidi que iria fechar o material com um depoimento do João em Brasília, onde ele mora hoje. E assim foi.

SITE OFICIAL DA MOSTRA
www.mostra.org
TWITTER DA MOSTRA
www.twitter.com/MOSTRASP


Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.