Arcos, arabescos, Sol, ventos quentes, som de violões ao fundo em afáveis canções. Vida que pulsa e passa em um outro tempo, devagar, invejável. Visões da Espanha, sul da Espanha, herança moura, tão rica de cultura, aromas e sabores, quase palpáveis.
Essa é a terra do Jerez, dos vinhos de flor, vinhos de personalidade tão desconcertante que fica difícil colocar em palavras. A única coisa que posso fazer, caro leitor, é convidá-lo a sentar com toda calma que a mente possa alcançar e sorver essas palavras com atenção lúdica como a de um pintor. Nossa memória dos vinhos da região é escassa, quase nula, uma vez que esse vinho é maltratado ao viajar, seja por escolhas malfeitas ou por descaso ao servir.
Na região da Andaluzia, há duas grandes zonas para a produção de vinhos produzidos em flor. Eles são fermentados de maneira tão natural que todo material biológico que ali reside forma uma capa, um véu (a flor), que o protege da ação corriqueiramente nociva do oxigênio. E por estar em pura simbiose com o elemento químico, uma vez que é acostumado de maneira sutil a estar em contato com ele, acaba sendo um vetor quase único de todas as características que esse o oxigênio pode aportar: força, mineralidade e complexidade.
Jerez, a grande estrela, trabalha no limite da técnica, com vinhos puros e não menos intensos. Montilla-Moriles, a não tão falada, porém não menos impactante, apresenta exemplares de raça, que dançam na boca com balanço denso e untuoso permeado por arestas, que provocam um sentimento emocionado de perplexidade. São vinhos estonteantes, apaixonantes que nos transportam a outro tempo. Um tempo em que a vida era mais cheia de contemplação e completude.
No Brasil, poucos exemplares estão disponíveis, é verdade. Mas os produzidos aqui são bons e valem ser provados em largos goles. Os estilos são vários e apresento aqui uma pequena seleção de sabores que valem a pena:
Do falado Fino, bebido em largos goles, acompanhado por frutos do mar, em especial mariscos e vôngoles. Tio Pepe, do produtor Gonzalez Biass (importado pela Inovini).
Do falado Manzanilla, muito similar ao Fino, porém de uma região vizinha a Jerez, chamada Sanlucar de Barrameda. Manzanilla La Gitana, do produtor Hidalgo (impotado pela Mistral).
Do falado Amontillado, do produtor Maestro Sierra, perfeito com Jamon Serrano ou de Belota, ou qualquer embutido curado (importado pela importadora Viníssimo).
Do chamado Pedro Ximenez, denso, doce e perfeito para chocolates do produtor Fernando de Castilla (importado pela Casa Flora).
A legião dos apreciadores de vinhos adverte: beber preferencialmente ouvindo o violão de Paco de Lucia.
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