Uma escritora na linha de frente

A carioca Daniela Lima, colunista do site da Editora Boitempo, é autora dos livros Anatomia e Sem Importância Coletiva, este tema de discussão em encontro de literatura organizado pela Sorbonne em 2015. Há dois anos, milita formalmente, mas acredita que as mulheres desenvolvem diferentes formas de resistência mesmo fora do movimento.

A carioca Daniela Lima, colunista do site da Editora Boitempo - Foto: Divulgação
A carioca Daniela Lima, colunista do site da Editora Boitempo – Foto: Divulgação
Brasileiros – Como você vê o protagonismo atual das mulheres?
Daniela Lima – É necessário, resultado de uma luta contínua. Falar de protagonismo é falar da importância de se tornar sujeito político. E surgiram novos instrumentos nessa luta, como as redes sociais, que são importantes também pela própria democracia que esses espaços admitem. As mulheres não precisam mais de um título para falar.

As redes sociais derrubaram até campanha de cerveja…
Sim, tinha outdoor que dizia: “Esqueci o não em casa”. Isso representava um verdadeiro retrocesso, já que um dos eixos centrais do movimento é o direito de dizer “não”. As redes nos permitem questionar a violência de certos discursos e práticas naturalizados, como aconteceu também nas hashtags #meuamigosecreto e #meuprimeiroassedio. Depois dessas campanhas, o número de denúncias de violência contra a mulher cresceu 40% no disque-denúncia. O movimento encontrou nas redes sociais um instrumento de luta e intervenção da realidade. Isso tende a crescer porque existem pautas muito definidas.

Quais são essas pautas definidas?
Pautas históricas, como a legalização do aborto. Independentemente da criminalização, as mulheres fazem aborto. Então, não é nem questão de decidir se devem ou não fazer. É uma questão de as mulheres sem condições de pagar um aborto seguro não continuarem morrendo em clínicas clandestinas ou vítimas de agulhas de crochê. Outra questão é o movimento contra o PL 5069, que dificulta o aborto em casos de estupro. Neste momento, acredito que não se possa perder nenhum dos direitos já conquistados.

Como você pensa o feminismo?
Como a consubstancialidade das lutas antipatriarcal, antirracista e anticapitalista. Como disse Simone de Beauvoir: “Não existe salvação indivi­dual”. Enquanto uma mulher não tiver liberdade, nenhuma será livre. Mesmo sem chamar de feminismo, as mulheres estão e sempre estiveram em muitas frentes de luta. Inclusive, contra a secundarização das pautas das mulheres nos próprios movimentos sociais. Como disse Beauvoir: “Nem sempre existiram proletários, mas sempre existiram mulheres”.

Qual a diferença entre a mulher carioca e a paulistana?
Não posso responder pelo movimento. Mas é importante a perspectiva social, o lugar em que cada um está inserido. Para muitas mulheres, a pauta é o acesso à água ou à moradia. Deve-se pensar quais são os núcleos comuns de vivência entre nós, sem perder de vista as diferenças, para não silenciar vozes, sobretudo as mais vulneráveis e marginalizadas, muitas deslocadas do eixo Rio–São Paulo.

Como vê a atuação da presidenta Dilma Rousseff?
A representação da Dilma é importante simbolicamente porque está em lugar de poder. Mas, quando se discutem as críticas ao governo, que devem ser feitas, homens a agridem com xingamentos misóginos. Nossa pauta é que essas críticas não sejam feitas dentro do campo moral nem sejam misóginas, como aconteceu na Copa. Precisamos lutar contra isso porque, se acontece com a Dilma que é superprotegida, acontece com outras mulheres. Por outro lado, Dilma não representa um avanço para as pautas femininas. Luciana Genro diz uma frase que acho boa: “Não basta ser mulher. Tem de estar do lado certo”.


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