A eficácia da psicoterapia no combate à depressão é superestimada?

Um estudo polêmico publicado no final de setembro no periódico Plos One começou a questionar um dos tratamentos mais consolidados da atualidade para o combate à depressão: a psicoterapia.

O questionamento se baseia na ideia de um possível viés na publicação dos estudos que analisaram a eficácia do tratamento.

Existe a possibilidade, segundo a pesquisa, da eficácia da psicoterapia ser superestimada porque os estudos com resultados positivos sobre ela foram mais publicados do que os trabalhos com resultados não tão benéficos. 

“É como se você jogasse várias vezes uma moeda, mas só mantivesse os resultados das vezes que saiu cara”, disse Steven Hollon, professor de psicologia na Universidade de Vanderbilt, na Holanda, e co-autor do estudo com colegas da Oregon Health & Science University, Universidade Livre de Amsterdã e da Universidade de Groningen.

Não é a primeira vez que o grupo gera controvérsias nessa área. Essa pesquisa dá continuidade a uma outra que, igualmente provocadora, mostrava um viés em estudos sobre os efeitos dos antidepressivos. Foi uma verdadeira celeuma.

Em 2008, eles publicam artigo no New England Journal of Medicine, que demonstrava o mesmo viés: havia mais facilidade para a publicação de artigos sobre os efeitos positivos dos antidepressivos do que resultados negativos. Na ocasião, os cientistas também demonstraram que mesmo os estudos publicados eram escritos de uma forma que tornava os resultados benéficos mais evidentes. 

“Decisões médicas são tomadas com base em estudos clínicos, mas se essas pesquisas já estão enviesadas; então, as decisões baseadas nessas evidências podem não ser as ideais”, escreveram na época.

Eficácia da psicoterapia é superestimada, o que não quer dizer que ela seja ineficaz. Imagem: Ingimage
Eficácia da psicoterapia é superestimada, o que não quer dizer que ela seja ineficaz. Imagem: Ingimage

Agora, uma metodologia parecida com esse estudo de 2008 foi utilizada. Os pesquisadores pegaram todos os estudos que tiveram financiamento público do Instituto Nacional de Saúde dos Estados Unidos entre 1972 e 2008. O critério utilizado foi apenas de que essas pesquisas tivessem por objetivo o estudo da eficácia da psicoterapia no combate à depressão. O primeiro resultado encontrado é de que pelo menos ¼ desses estudos nem sequer foram publicados. 

Em uma segunda etapa, eles então entraram em contato com esses pesquisadores e pediram todos os dados dos estudos que haviam sido feitos. O trabalho foi comparar esses resultados não publicados com os já divulgados. Após essa comparação, eles concluíram que a eficácia da psicoterapia foi inflada por viés de publicação.

“Isso não quer dizer que a psicoterapia não funcione. Só demonstra que talvez ela não funcione tão bem quanto o que está descrito pela literatura científica”, explica Hollon.


Mais questionamentos 

Uma outra questão foi levantada, mas não respondida pelo estudo. Será que esse viés afeta a recomendação da psicoterapia para o tratamento da depressão? Segundo os pesquisadores, um outro estudo teria que analisar isso.  

O que eles conseguem responder, por agora, é que esse viés existiu e contribuiu para inflar os resultados sobre a eficácia, o que não quer dizer que a psicoterapia seja ineficaz para o tratamento. No entanto, saber limitar exatamente qual é o alcance de eficácia da psicoterapia poderia fomentar a busca por outras alternativas de tratamentos complementares. 

Também um outro problema foi mencionado, da revisão por pares (pessoas da mesma área de conhecimento que revisam os resultados dos artigos). Esse é um procedimento adotado por periódicos científicos antes da publicação para validar os dados de um determinado artigo.

Nesse processo, no entanto, a maneira de escrever o texto é alterada, às vezes, com prejuízo para a interpretação dos resultados. 

“Há uma tendência dos pares de superestimar os benefícios e subestimar riscos em potenciais na hora da revisão”, explica Hollon. 

“No final, os consumidores dessas informações são especialistas e gestores de políticas públicas, que podem adotar essas terapias para o restante da população.”

O que os pesquisadores recomendam é que os periódicos armazenem os estudos originais (antes da revisão por pares) e guardem os resultados brutos. Dessa forma, haveria dados mais facilmente acessíveis para que um possível viés seja determinado e corrigido no futuro.

 

 


Comments

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.