Bienal de Berlim, sem estética e sensibilidade

Em 2006, o artista italiano Maurizio Cattelan, conhecido na época como o “Artista dos Escândalos“, assinou a curadoria da 4a Bienal de Berlim. Hoje, seis anos mais tarde, há um novo preceito sociopolítico-estético celebrado na 7a Bienal de Berlim, inaugurada em 27 de abril, tendo à sua frente o artista polonês Artur Zmijewski como curador.

Zmijewski criou com essa bienal uma obra de arte própria, digna de assinatura pessoal. Artista conhecido por seu trabalho político e polêmico, em ações e filmes com temática social e política, representou a Polônia na 51a Bienal de Veneza. Joanna Warsza, também polonesa, foi convidada como curadora associada, assim como o coletivo Voina, da Rússia. Juntos, tiveram uma verba de 2,5 milhões de euros, provenientes da Fundação Cultural Nacional Alemã. O resultado pode ser visto até 1o de julho e é apresentado em seis locais distintos, sendo a maior parte de caráter evolutivo, participativo diário, abrangendo ainda ações com hora e data marcadas.

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Essa bienal é um grande experimento que reúne poucas obras de arte e dá mais vazão aos fatos e inquietações políticas da atualidade. Os dois anos preparatórios do evento foram repletos de acontecimentos marcantes, que passam a ser revistos na bienal de forma autêntica: movimentos de libertação dos países árabes, polêmicas contra publicações duvidosas de caráter sociopolítico e movimentos de ocupação da Wall Street, entre outros. Esses últimos acontecimentos foram acolhidos na parte mais nobre do Kunst-Werke Institute, sede da bienal. Ativistas do Movimento de Ocupação transformaram esse espaço em uma praça pública, onde possuem liberdade de expressão, uma vez que foram banidos dos espaços públicos usuais. Estariam eles vivendo uma alucinação ao terem de se adaptar aos preceitos museológicos de conduta de locais? Nesse espaço estão rodeados por extintores de incêndio, saídas de emergência, equipe de limpeza e por tantos outros protagonistas do universo da arte contemporânea. Há, sem dúvida, uma inversão de papéis e valores.

Artur Zmijewski e sua equipe baniram as obras de arte dessa bienal. O objetivo é abrir caminho para a política efetiva e performativa, que oferece aos cidadãos comuns uma ferramenta de ação e transformação. A arte é uma dessas ferramentas. Os protagonistas não são necessariamente artistas usuais, mas, sim, ativistas. Em uma única sala, são apresentados simultaneamente diversos relatos televisivos de conflitos mundiais, como em uma seção de breaking news do noticiário cotidiano. Mesmo assim, os organizadores da bienal enfatizam que todas as obras foram comissionadas para o evento. O que nos faz pensar que, talvez, o arranjo espacial das diversas projeções defenda o caráter do ineditismo da obra.

A 7a Bienal de Berlim tenta se eternizar pelas diversas polêmicas criadas em seu processo preparatório e pelo ato de ter banido a arte contemporânea convencional de sua agenda. Para eles, a arte contemporânea existe para suprir o mercado de arte e o ego de seus protagonistas. Como, por exemplo, a recente história da arte alemã, que existe soberana em estética, conteúdo e inserção político-social, a exemplo de Joseph Beuys que dizia: “No lugar certo, na hora certa, fazer o certo”. Pensando assim é que o artista coletou, em 1972, durante e após uma demonstração do dia 1o de maio vestígios dessa manifestação e os eternizou, resguardados em uma vitrine, um relato histórico preservado para as próximas gerações, sem perder a atualidade. Ou ainda o artista Sigmar Polke, que executava em suas colagens manifestações políticas, como a série Day by Day, concebida por ocasião de sua participação, em 1975, da Bienal de São Paulo, apresentada recentemente no Museu de Arte de São Paulo. Em uma das obras dessa série lê-se: “Como toda a banana que eu como, eu apoio o saqueamento da América Latina“.

Uma visita à 7a Bienal de Berlim nos deixa um gosto de déjà vu por seu apego ao realismo, do qual somos alimentados diariamente pelos meios de comunicação. Seu título Esqueça o Medo soa como uma ironia, pois aqui os “medos“ do cotidiano são enfatizados em sua autenticidade, sem nenhuma pitada de estética e sensibilidade.


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