Explosão de hipóteses

Superada a crise administrativo-financeira, a Bienal de São Paulo coloca em marcha a 30a edição com o tema A Iminência das Poéticas. O conceito escolhido pelo curador venezuelano Luis Pérez-Oramas, responsável pela sala do modernista, também venezuelano, Armando Reverón (1880-1954), na Bienal de 1998, está contido na lógica coletiva para potencializar as ideias aplicadas dentro de um projeto constelar. Ele toma por base a hipótese de que as poéticas interligam-se, sobrepõem-se, atraem-se e formam novos grupos de constelações menores, que provocam uma explosão de hipóteses. “A Bienal pretende ser uma mostra capaz de produzir constelações de obras que conversem entre si”, explica Oramas. A lógica constelar contempla cinco zonas curatoriais: Sobrevivências, Alterformas, Derivas, Vozes e uma zona transversal, a Reverso. De acordo com Oramas, essa será uma bienal contra a ideologia da imagem. Uma edição que trata da questão da memória e não da nostalgia.

O conceito constelação, apoiado na analogia de linguagem, funciona como território onde haverá desdobramentos de analogias. Um dos pontos positivos da mostra é que 60% das obras são inéditas e cada artista estará representado por mais de um trabalho.

Ele afirma que há muita novidade, com obras desconhecidas do público. “Até mesmo Bispo do Rosário terá trabalhos inéditos. O mesmo acontece com Gego (Gertrud Goldschmidt) expoente do Construtivismo e da Arte Cinética da América do Sul, ao longo das décadas de 1950 e 1970.”

Os artistas da América Latina, dessa vez, foram contemplados e somam 40, em um universo de 110. “O mundo está pedindo arte latino-americana e vivemos em um momento especial que a bienal tem de aproveitar.” Grande parte dos artistas dessa região é emergente, mas como acontece em todas as bienais internacionais, os consagrados têm lugar assegurado. Entre as estrelas que figuram neste ano, os destaques ficam com o norte-americano Robert Smithson, nome fundamental da Land Art; o alemão Hans-Peter Feldmann, integrante do conceitualismo da primeira fase; o brasileiro Arthur Bispo do Rosário que, apesar da esquizofrenia, desenvolvia trabalhos com resquícios das vanguardas pós 1960; o francês Bernard Frize, expressão da pintura abstrata; e do fotógrafo holandês Hans Eijkelboom.

Bienal sempre foi um campo fértil de investigação e pluralidade. Oramas diz que tanto os consagrados como os emergentes foram convidados pela natureza de seus trabalhos, pela experimentação e, sobretudo, pela capacidade de diálogo com o conceito da bienal, e não para serem uma mera ilustração do tema.

Com uma equipe formada pelos cocuradores André Severo, Tobi Maier e Isabela Villanueva (assistente), a Bienal experimenta um momento especial de possibilidades de amostragem, haja vista as bienais de Whitney, Havana, Berlim e a Documenta, de Kassel, entre outras. “Nosso interesse é conceber uma bienal com um processo articulado entre o conceito que a rege e os instrumentos práticos que vão materializá-la.” Para ele, o foco será as práticas das plataformas discursivas. “A Iminência da Poética é o centro do que vai ser dito, do que vai acontecer. É um estado permanente de iminência.” Articular todas essas ideias propostas por um curador e traduzi-las em uma montagem coerente e de leitura é um desafio permanente para os arquitetos em todas as edições. Desta vez, a responsabilidade é de Martin Corullon, que tem experiência em montagem em outras edições da bienal.

Desde a mostra inaugural de 1951, quando o concretista Antonio Maluf criou o cartaz da Bienal de São Paulo, o autor do projeto gráfico teve relevância dentro das edições. Ele faz parte do elenco, e com destaque. A 30a edição inova e democratiza a oportunidade ao criar um workshop, desenvolvido por meio de uma convocatória da qual participaram designers de tendências diferentes. Oramas entende que o processo de abertura para escolher a peça gráfica parte do princípio que as disciplinas são próximas. “Todos os designers trabalharam levando em consideração a história visual da bienal, que eles conhecem muito bem. Afinal, a identidade visual é a plataforma discursiva, é a estrutura de gerenciamento, é por meio dela que a Bienal se comunica com o público.” Oramas ainda defende a identidade visual como uma metalinguagem da bienal, como um instrumento que vai regular a presença de outras linguagens artísticas e de comunicação. “O estudo resultou em 30 cartazes assinados por 30 designers, unidos pela plataforma poética”, define. O que os une é que todos têm presença assegurada na 30a edição. Como se sabe, na língua espanhola os pontos de interrogação são colocados no início e no fim das frases. Este ponto da gramática pode ser análogo às bienais. Elas sempre abrem com uma questão e nos deixam sempre com novas questões. Agora é aguardar.


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